Lei das finanças locais gera divisões internas no PS e PSD

O socialista Paulo Trigo Pereira criticou proposta do Governo. Leitão Amaro, do PSD, não participou na votação.

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Mesmo dentro do PS o deputado Paulo Trigo Pereira manifestou a sua discordância sobre a proposta de lei do Governo EVR ENRIC VIVES-RUBIO

A proposta de lei do Governo sobre as Finanças Locais, instrumento chave da descentralização, foi aprovada esta manhã no grupo de trabalho com os votos do PS e do PSD, do CDS e PCP em alguns artigos, mas foi a sua ratificação, horas depois, na comissão de Orçamento que deixou à vista as fissuras dentro do próprio bloco central que se formou para viabilizar a lei.

A aliança entre o PSD e o PS ficou evidente no restante pacote de descentralização, que foi aprovado, na especialidade, também durante a manhã, na comissão de Ambiente. CDS, PCP e BE votaram contra, na globalidade dos artigos, e criticaram o processo legislativo. Bloco de Esquerda e CDS-PP criticaram a "municipalização" de competências e, com o PCP, salientaram a falta de consenso dos autarcas face às propostas definidas, que levaram alguns presidentes de Câmara a ponderar sair da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) como é o caso de Rui Moreira.

O social-democrata António Leitão Amaro, vice-presidente da bancada e ex-secretário de Estado da Administração Local, pediu escusa nesta votação da proposta de lei do Governo sobre as Finanças Locais por razões de “substância”, que não especificou. O mesmo fez a deputada do PSD Sara Madruga da Costa, eleita pela Madeira, por discordar com a aplicação do diploma nas Regiões Autónomas. Em contraste, Duarte Pacheco assumiu, no plural, estar confortado com a proposta do Governo que “reforça muito a capacidade financeira das autarquias”. O deputado assegurou que foram ouvidas as entidades necessárias à conclusão do processo legislativo como associações dos municípios e freguesias, o ministro da Administração Interna (que tem a tutela da descentralização) e o secretário de Estado do Orçamento. Uma posição que ficou isolada no restante espectro parlamentar, com excepção do PS. 

Mas mesmo dentro do PS o deputado Paulo Trigo Pereira manifestou a sua discordância sobre a proposta de lei do Governo. “O senhor deputado acha basta o Governo negociar com o PSD e com a Anafre que a coisa está fechada. Eu não acho”, disse, depois de ter expresso o seu voto contra vários artigos e de uma longa exposição em que criticou a proposta.

Pelo CDS, Cecília Meireles, vice-presidente da bancada, já tinha deixado expresso o protesto do partido contra a pressa do processo legislativo e o teor da proposta do Governo. “Depois de muita propaganda do Governo o que apareceu no Parlamento foi uma Lei das Finanças Locais, que a troco da descentralização de competências para as autarquias o que se pede é que se passe um cheque em branco ao Governo, já que não estão expressos os meios associados”, disse, sem nunca se referir ao PSD, que mostrou concordar em geral com o texto do Governo. O CDS absteve-se em quase todos os artigos, à excepção do fundo de descentralização e a desresponsabilização financeira (votou contra ambos).

À esquerda, o deputado bloquista João Vasconcelos deu conta do seu “desconforto e protesto” sobre o andamento do processo legislativo que foi “atabalhoado e feito à pressa”. “Eu como membro do grupo de trabalho nem as propostas de alteração recebi [previamente à votação]”, disse o deputado que votou contra os artigos da proposta de lei do Governo e só votou a favor das suas propostas e das apresentadas pelo PCP.

O comunista Paulo Sá também defendeu que “uma lei com esta complexidade [o processo] deveria ser mais longo na especialidade, com mais audições, com maior ponderação”.

A ratificação das votações no grupo de trabalho – a proposta ainda será esta quarta-feira votada na especialidade e em votação final global em plenário – só aconteceu depois de uma discussão entre as bancadas e de um intervalo de 10 minutos.

O PSD queria forçar as duas votações esta manhã, a da proposta das Finanças Locais e a do projecto do CDS sobre os combustíveis, acusando o PS de querer adiar esta última iniciativa. As duas acabaram por se realizar.

Durante essa discussão, o deputado Paulo Trigo Pereira, independente eleito pelo PS, teceu duras críticas à proposta de lei do Governo das Finanças Locais não só sobre a forma como o conteúdo. “Processos legislativos à pressa dão origem a más leis”, afirmou, assumindo que “fez quase uma directa” para elaborar um documento de 20 páginas com propostas. Já com o coordenador do PS na comissão, João Paulo Correia, ausente da sala, o deputado criticou a falta de “responsabilidade política” prevista na proposta mas sobretudo de responsabilidade financeira. “Não sei se o presidente do Tribunal de Contas já leu mas é inacreditável”, disse, condenado a norma que prevê que a responsabilidade financeira recaia sobre os trabalhadores. “Um trabalhador que emita um parecer para o seu director financeiro vai ser sujeito a responsabilidade nas informações dadas ao executivo. Os coitados dos trabalhadores fazem o seu trabalho e iliba-se o dirigente. Se isto for aprovado acho inacreditável”, afirmou, criticando ainda a criação da comissão técnica para monitorizar o processo de descentralização proposta pelo PS e pelo PSD.

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