Gozo, o balneário de Malta com raízes neolíticas

Até há poucos anos, a segunda ilha do arquipélago era mais calma, com visitantes de um dia, sobretudo. Entretanto, construíram-se hotéis e os vizinhos de Malta começaram a comprar segundas residências

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Faz vento, muito vento no convés do ferry que une a ilha de Malta à sua irmã mais pequena, Gozo. A partida faz-se de Cirkewwa, a chegada é ao porto de Mgarr — durante o curto percurso, seis quilómetros de canal (20 minutos), vislumbra-se a célebre lagoa Azul de Comino, a ilha que vista deste lado parece um monte rochoso e árido que se precipita no Mediterrâneo em altas arribas douradas que lembram colmeias. Em Gozo, espera-nos um autocarro hop and off. É a nossa opção para um percurso linear — o bilhete compramo-lo no ferry, mas o assédio aos turistas começa mesmo antes da entrada no terminal.

Quando nos instalamos, já temos as paragens definidas. A primeira é na capital da ilha, Vitória. Até lá, deixamos para trás Ghajnsielem, cidade fortificada a olhar o porto, e subimos para uma espécie de meseta que ocupa o centro de Gozo, a ilha de veraneio dos malteses — até há poucos anos era mais calma, com visitantes de um dia, sobretudo; entretanto, construíram-se hotéis e os vizinhos de Malta começaram a comprar segundas residências. Atravessamos pequenas cidades adormecidas, avistamos campos e campos, e impõe-se na paisagem a igreja de São João Baptista, mais conhecida como Rotunda de Xewkija. É a cúpula que se sobrepõe (o nosso áudioguia diz-nos que é a terceira maior do mundo sem suporte) e vê-la-emos também da cidadela de Vitória — mas daqui vê-se toda a ilha. A coroar a capital, esta foi o principal baluarte de protecção de Gozo — a catedral (com estátua do Papa João Paulo II) no topo de uma escadaria é o ponto nevrálgico, por onde se descobrem ruelas polvilhadas de lojas, restaurantes e ruínas junto às muralhas. Fora da cidadela, Vitória apresenta-se como uma cidade de carácter marcadamente inglês, na fachadas das suas duas (!) salas de ópera anunciam-se produções de Tosca e La Traviata para Outubro — hoje a música hoje é outra, o palco na praça principal inunda tudo de electrónica.

Marsalform, pequena cidade piscatória popular entre veraneantes, é o nosso próximo destino. Percorremos-lhe a promenade junto da baía rochosa — no minúsculo areal de areias sujas umas poucas pessoas tomam sol —, entramos no pequeno porto, descansamos a vista nas águas transparentes que a luz pinta de azuis e verdes e no casario colorido que se empoleira numa das falésias. Sabe a pouco. Em Ramla Bay, o areal cresce e a multidão também, o azul intenso do mar a refulgir. Daqui avista-se a gruta de Calipso, encaixada no monte rochoso num dos extremos da praia — a lenda conta que Ulisses aqui ficou durante sete anos, na sua longa viagem para Ítaca, prisioneiro de amor pela ninfa Calipso.

O Neolítico é a nossa última paragem — e este foi pródigo em legados no arquipélago. Em Gozo, o destaque vai para os templos de Ggantija, literalmente “pertença de gigantes”. Não foram realmente gigantes que os construíram, mas é difícil imaginar aqueles edifícios erguidos há 5500 anos, o que os torna dos mais antigos do mundo. A fachada imponente esconde na verdade dois templos, com várias absides com nichos ritualísticos à fertilidade.

Até há pouco mais de um ano, a Azure Window, janela azul, era a maior atracção turística de Gozo. A formação rochosa — um arco com uma enorme plataforma plana em cima sobre o azul do Mediterrâneo — caiu numa tempestade. E é quase em clima de tempestade que deixamos Gozo: o vento não dá tréguas.

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