Para surpresa de todos, Trump diz que vai acabar com manobras militares

Os exercícios militares sempre foram contestados pela Coreia do Norte, mas considerados necessários pelas forças militares dos EUA e da Coreia do Sul.

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A decisão de acabar com as manobras militares foi tomada depois de o acordo estar assinado, diz Trump Reuters/HANDOUT

“Vamos parar com os jogos de guerra”: o anúncio foi feito pelo Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, na conferência de imprensa que aconteceu na ilha de Sentosa, Singapura, horas depois do histórico encontro de Trump com o líder da Coreia do Norte, Kim Jong-un. A decisão de Trump, que classifica as manobras militares como “provocatórias e inapropriadas”, não está contemplada no documento assinado pelos dois e foi a grande surpresa da cimeira.

Não se sabe ainda se a decisão dos Estados Unidos de deixar de participar nos exercícios conjuntos com a Coreia do Sul será imediata. O Comando Militar dos Estados Unidos na Coreia do Sul disse que “não recebeu nenhuma nova orientação na execução ou cessação dos exercícios militares”, disse a porta-voz do comando norte-americano, Jennifer Lovett. “Em coordenação com os nossos parceiros [sul-coreanos], continuaremos com a nossa postura militar até que recebamos novas orientações por parte do Departamento da Defesa”, acrescentou.

As manobras militares mais recentes decorreram no início de Abril e foram mais suaves do que as anteriores, tendo também durado menos tempo. Os próximos agendados são os exercícios anuais – chamados "Ulchi Freedom Guardian", que testam a capacidade de defesa dos EUA e da Coreia do Sul em caso de uma possível ofensiva da Coreia do Norte –, esperados para Agosto ou Setembro.

“Neste momento, o significado e a intenção das declarações do Presidente Trump requerem um entendimento mais claro”, afirmou o gabinete presidencial da Coreia do Sul. No Sul, esta questão é alvo de debate interno: enquanto os conservadores sul-coreanos defendem que qualquer alteração nos exercícios anuais pode pôr em causa a segurança nacional, os liberais acreditam que a solução pode ser boa se conduzir a uma saída diplomática da crise. Uma decisão de abolir estes exercícios militares sempre foi até hoje negada pelas forças militares dos EUA e da Coreia do Sul.

Na conferência de imprensa, Trump referiu ainda que quer trazer as forças militares norte-americanas que estão na Coreia do Sul (são mais de 28 mil) “de volta para casa”, mas que isso “não faz parte da equação para já”.

O fim das manobras conjuntas é uma exigência de longa data da Coreia do Norte, que os vê como uma provocação. Geralmente, o regime norte-coreano responde com testes de armamento ou declarações de guerra sempre que estes exercícios ocorrem. Curiosamente, Trump usou a mesma expressão — "provocatórios" — para os qualificar durante a conferência de imprensa, para além de ter insistido em várias ocasiões que são "muito caros".

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Soldados sul-coreanos durante o Ulchi Freedom Guardian, um exercício militar anual que testa a capacidade de defesa contra uma possível ofensiva da Coreia do Norte KIM HONG-JI/REUTERS

Em Maio, a Coreia do Norte voltou a mostrar-se contra os exercícios militares dos EUA e da Coreia do Sul, manifestando particular desagrado pela possível utilização de bombardeiros B-52 nos exercícios, que reaviva a memória do devastador bombardeamento norte-americano durante a Guerra da Coreia, entre 1950 e 1953.

Também a China tem vindo a defender a suspensão simultânea tanto destas manobras militares por parte dos Estados Unidos como do programa nuclear da Coreia do Norte. Para o ministro dos Negócios Estrangeiros chinês, Wang Yi, esta suspensão recíproca permitiria reduzir a tensão e “devolver as partes à mesa de negociações”.

Kim na Casa Branca?

No acordo assinado por Kim e por Trump, é referido que os EUA darão garantias de segurança à Coreia do Norte durante o processo de desnuclearização da península. Questionado sobre como vai garantir o cumprimento do acordo por parte da Coreia do Norte – tendo em conta que esta não é a primeira vez que a Coreia do Norte se compromete a abandonar o desenvolvimento de armas nucleares –, Trump foi vago e disse que isso seria conseguido “tendo muita gente lá”, mencionando observadores americanos e internacionais; acrescentou ainda que não haveria qualquer redução do número de militares no local e que estaria em causa “uma grande quantidade de dinheiro”.

E se Kim não honrar a sua palavra? “Acho sinceramente que o fará. Posso estar errado. Daqui a seis meses posso dizer ‘hey, estava errado’”, disse Trump na conferência. “Não sei se o admitirei verdadeiramente, mas arranjarei alguma desculpa”, brincou.

Por agora, o que Trump sabe é que os norte-coreanos “querem fazer acordos”: “Sei quando alguém quer fazer um acordo e sei quando não o querem. O meu instinto diz-me que eles querem fazer um acordo e isso é óptimo para o mundo.” Para o Presidente dos EUA, a Coreia do Norte já provou o seu empenho no processo de desnuclearização ao destruir uma instalação nuclear – uma referência ao complexo de Punggye-ri, desmantelado há três semanas.

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Os dois líderes durante a cimeira em Singapura REUTERS

Trump disse que o processo de desnuclearização poderia ser concluído rapidamente, mas não especificou um intervalo de tempo. Assim que a ameaça nuclear deixe de ser um problema, diz, as sanções à Coreia do Norte poderão ser suspensas; Trump espera também que haja uma melhoria da “complicada” situação dos direitos humanos antes que tal aconteça. Para já, as sanções aplicadas ao regime de Pyongyang continuam a ter efeito.

Ainda que o líder dos EUA tenha começado por dizer no final da cimeira que iria, “sem dúvidas”, convidar Kim para visitar a Casa Branca, acabou por dizer que o faria no momento adequado. O Presidente dos EUA também não pôs de parte a possibilidade de ir até Pyongyang, referindo, de igual forma, que só o faria quando o momento fosse mais adequado. “Provavelmente precisaremos de uma nova cimeira”, admitiu ainda, referindo que gostaria que a China e a Coreia do Sul fizessem parte das negociações. com João Ruela Ribeiro

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