Preços das casas em Portugal já mostram sinais de sobrevalorização

Banco de Portugal destaca riscos geopolíticos e económicos associados à adopção de medidas proteccionistas.

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Portugueses continuam a valorizar a casa própria. RIC Ricardo Campos

O grau de preocupação do Banco de Portugal (BdP) em relação à subida dos preços das casas aumentou significativamente nos últimos meses. O relatório de Estabilidade Financeira de Junho refere que “o crescimento dos preços no segmento imobiliário residencial tem sido particularmente forte” e que “na segunda metade de 2017 começaram a surgir alguns sinais, embora muito limitados, de sobrevalorização dos preços neste segmento”.

O relatório de Dezembro já mostrava alguma preocupação, mas em menor escala: “A evolução dos preços no mercado imobiliário residencial poderá também ter consequências sobre os riscos para a estabilidade financeira, caso acentue essa menor restritividade [dos bancos em conceder crédito] no caso particular do crédito à habitação”.  Mas logo acrescentava que “existe, contudo, evidência de que os preços da habitação a nível nacional se encontram próximos dos níveis justificados pelos fundamentos económicos, apesar de não ser possível afastar a possibilidade de existirem apreciações excessivas em determinadas áreas geográficas, nomeadamente nos grandes centros urbanos”.

A informação revelada esta quarta-feira sobre os riscos nos mercados e sistema financeiro portugueses, que inclui um alerta novo para os perigos da “guerra” comercial desencadeada pelos EUA, dá especial destaque à evolução do mercado imobiliários, onde se “observa que as medidas de desvio de preços no mercado residencial face aos fundamentos económicos registam valores ligeiramente positivos desde o terceiro trimestre de 2011”.

O supervisor revela que em termos acumulados, entre o segundo trimestre de 2013 e o quarto trimestre de 2017, os preços da habitação em Portugal aumentaram 32% (em termos nominais) e 27% (em termos reais). A dinâmica de crescimento é superior à queda registada entre 2010 e 2013, que foi de 15% e 18%, em termos nominais e reais, respectivamente. “Os preços do imobiliário residencial recuperaram para níveis próximos dos registados em 2008”, refere o relatório, acrescentando que “a recuperação da oferta de habitação não tem sido suficiente para impedir o aumento dos preços”, suportados por factores como “o aumento do rendimento disponível das famílias e a redução do desemprego, assim como pela dinâmica do turismo, que tem motivado a procura específica relacionada com o alojamento local”.

O BdP reforça a preocupação pelo endividamento dos particulares, no crédito à habitação e também ao consumo. “Apesar de as famílias portuguesas “terem reduzido de forma muito significativa os seus níveis de endividamento, continuam a apresentar um dos valores mais elevados de entre os países da União Europeia”, lê-se no documento.

O stock de crédito à habitação das família tem vindo a descer desde o final de 2011, mas está a abrandar e “paralelamente, tem-se observado um aumento acentuado dos fluxos de novos empréstimos à habitação, embora registando níveis muito inferiores aos atingidos antes da crise económica e financeira (…)”.

Os bancos estão desde 2015 a facilitar a concessão de crédito às famílias, designadamente através do alargamento de maturidades e a continua descida dos spreads (margem comercial dos bancos), o que levou o BdP a anunciar no passado mês de Fevereiro uma medida macroprodencial para o crédito, impondo critérios bem mais conservadores a ter em conta antes da decisão de novos empréstimos. A medida só entra em vigor no próximo dia 1 de Julho.

No mercado imobiliário comercial - escritórios, retalho, industrial, residencial (arrendamento habitacional) - depois de “uma queda bastante acentuada, observa-se, desde 2014, uma recuperação dos preços do mercado imobiliário comercial, embora a um ritmo claramente inferior ao dos preços do mercado imobiliário residencial”. Refere o relatório, acrescentando que, “em 2017, cerca de 80% do investimento no mercado imobiliário comercial português foi efectuado por não residentes”. E “muito embora os bancos portugueses não estejam a ser os principais dinamizadores do mercado imobiliário, um eventual decréscimo acentuado de preços neste mercado teria efeitos negativos sobre o sector bancário, condicionando a venda dos imóveis detidos pelas instituições de crédito e, por outro, dificultando a diminuição dos NPL [empréstimos non-performing ou crédito de cobrança duvidosa] associados a crédito garantido por imóveis”. 

O relatório começa com uma nota positiva: ”A resiliência da economia portuguesa à eventual materialização de riscos para a estabilidade financeira tem vindo a aumentar e teve sequência em 2017”. Para esse processo foi fundamental a significativa redução dos rácios de endividamento das empresas e dos particulares, e a maior robustez do sector bancário.

“Em 2017 o sistema bancário português apresentou um conjunto de desenvolvimentos positivos, que incluíram o aumento da rendibilidade acompanhado de um aumento da eficiência operacional, a redução muito significativa do elevado stock de empréstimos non-performing (NPL), e o aumento dos rácios de capita, destaca o relatório.

Ao nível dos riscos gerais, e para além da preocupação com o impacto de uma previsível subida de juros de curto prazo, embora de forma gradual, mas com impacto nos particulares, empresas e bancos, o BdP destaca que “o risco de uma reavaliação em alta dos prémios de risco a nível global permanece elevado, em particular num quadro de riscos geopolíticos e económicos, como por exemplo a adopção de medidas proteccionistas”. A este nível refere que “a concretização deste cenário tenderá a ter consequências negativas sobre a economia e o comércio mundiais”.

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