Fábrica de bagaço de azeitona intimada a suspender a produção

Cerca de uma centena de pessoas é obrigada a “conviver” há quase uma década com uma neblina branca e castanha que transporta maus cheiros e substâncias gordurosas.

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Imagem de arquivo de um olival Adriano Miranda

A Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Alentejo (CCDR-A) solicitou junto do Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas e Inovação (IAPMEI) a suspensão da actividade da AZPO – Azeites de Portugal. Lda, localizada junto à povoação de Fortes, concelho de Ferreira do Alentejo, a cessar a sua actividade. A empresa que faz a extracção de bagaço de azeitona está a violar normas estabelecidas na licença de exploração, prática que redundou na aplicação de três contra-ordenações graves por atraso na entrega de relatório de auto controlo e por emissões fora dos limites da lei.

Marcela Candeias, advogada que defende os interesses dos moradores afectados pela actividade da fábrica de extracção de bagaço de azeitona, adiantou ao PÚBLICO ter recebido a indicação de que a empresa “não cumpriu com os valores que deveria respeitar na emissão de partículas, fumos e poeiras” para a atmosfera. Acresce ainda, o facto de a AZPO – Azeites de Portugal. Lda, ter procedido à entrega na CCDR-A, “fora de prazo”, das análises resultantes da monitorização que é obrigada a fazer à qualidade do ar, dos solos e da água, conforme determina o título de exploração, que estabelece as condições a que o explorador deve dar cumprimento, através da auto-regulação.  

A decisão da CCDR-A vem contrariar a posição que assumiu num documento que o IAPMEI enviou a Marcela Candeias há cerca de 15 dias, onde esta entidade refere que, “da análise efetuada aos relatórios relativos à caraterização das emissões gasosas emitidas por este estabelecimento industrial são cumpridos todos os VLE [valores limite de emissões] fixados na legislação aplicável”.

O mesmo acontece com a altura das chaminés que libertam fumos, cheiros e partículas para a povoação de Fortes. O IAPMEI garantiu que em Abril de 2017 estavam a ser “cumpridos os normativos legais para a altura das chaminés”, deixando ao critério da empresa a decisão de aumentar ou não a sua altura, para “garantir que a dispersão dos gases provenientes das chaminés dos secadores” do bagaço de azeitona.

O proprietário da fábrica já se comprometeu a subi-las para os 40 metros, promessa que lançou o alerta noutras povoações mais afastadas, receosas de que os fumos da unidade industrial possam vir a afectar outras pessoas.

A decisão da CCDR-A surge depois de um grupo de 65 moradores ter apresentado no dia 17 de Maio uma queixa junto do Ministério Público, no tribunal da comarca de Ferreira do Alentejo, por considerarem estar “em causa os direitos e interesses gerais, interesses difusos, colectivos e individuais de toda a população residente naquele aglomerado urbano”.  

Há quase uma década que a população, maioritariamente idosa, da pequena comunidade de Fortes, no concelho de Ferreira do Alentejo, cerca de uma centena de pessoas, está sozinha no diferendo que mantém com os proprietários desta fábrica de extracção de bagaço de azeitona.

Desde que a empresa iniciou a laboração, em 2009, os moradores da aldeia situada a cerca de 200 metros da fábrica são obrigados a “conviver com uma neblina branca e castanha que se espalha na atmosfera”, lê-se na queixa apresentada ao Ministério Público (MP) pelo movimento de moradores de Fortes.   

É o derradeiro recurso contra o silêncio das autoridades apesar das “inúmeras queixas” apresentadas ao longo de quase uma década “junto das mais variadas entidades”. Apenas o Núcleo de Protecção do Ambiente da GNR dava acolhimento aos protestos da população, revelou ao PÚBLICO Marcela Candeias, enquanto a produção de bagaço de azeitona “cobria casas e as viaturas de um resíduo oleoso e cinzas, lançadas chaminés da fábrica”, descreve o documento.

“Em 2017 conseguimos que fosse feita uma fiscalização, pelo IAPMEI, às chaminés, mas os resultados disseram que estava tudo de acordo com a lei”, explicou Fátima Mourão, que reside na povoação de Fortes há 10 anos.  

A população continua a sofrer com a laboração da fábrica “e já existem pessoas doentes, como consequência da poluição produzida na fábrica”, prossegue a porta-voz dos moradores.

Rosa Dimas necessita de recorrer a uma máscara para respirar. Há meses que se queixa de problemas na garganta por respirar o fumo e pó que o vento arrasta na direcção da sua casa. O médico de família medicou-a, mas o problema de saúde persistiu. “Então perguntei-lhe: o senhor doutor não será dos fumos da fábrica do bagaço de azeitona?” O clínico disse-lhe que não.

No documento enviado pelo IAPMEI a Marcela Candeias, a Administração Regional de Saúde do Alentejo diz que “desconhece a existência de situações de doenças/afecções respiratórias/alérgicas cuja causa possa estar associada à actividade desenvolvida neste estabelecimento industrial”.

Cabe agora ao IAPMEI, entidade responsável pelos licenciamentos industriais, apreciar o pedido de suspensão de laboração apresentado pela CCDR Alentejo e tomar uma decisão final sobre esta matéria que é solicitada “com a maior brevidade possível e que não se esteja a pactuar com a ilegalidade já evidente”, refere em comunicado, divulgado esta manhã, a Plataforma “Problema Ambiental das Fortes”.<_o3a_p>

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