"O boom da construção no imobiliário ainda não acabou"

Depois de terem vendido alguns anéis, a Mota Engil está a repensar a sua estratégia de diversificação. Jorge Coelho vai ajudar a recomeçar em alguns sectores. Energia e agricultura serão uma prioridade.

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Adriano Miranda

A administração da Mota-Engil foi alargada até ao limite estatutário e voltou a receber Jorge Coelho. O que é que ele vai fazer e por que é tão importante que lá esteja?
Jorge Coelho foi presidente-executivo desta casa durante muitos anos, fez um trabalho notável na reestruturação estratégica do grupo e na verdade nunca se foi embora. Manteve-se num órgão não estatutário, que é o conselho estratégico que serve para apoiar algumas tomadas de decisão. O Doutor Jorge Coelho é sempre uma mais-valia em qualquer empresa, mas numa altura em que vamos renovar a nossa estratégia de diversificação é mais importante ainda.

Paulo Portas ainda está nesse tal órgão não estatutário onde sempre esteve Jorge Coelho, o conselho estratégico?
Está e está a dar um contributo muito importante na abordagem em alguns mercados de África onde a Mota-Engil não estava e está a pensar em entrar. Em Marrocos, por exemplo.

O Embaixador Seixas da Costa também estava nesse conselho e passou para a administração. Porquê?
O que se passou é que este ano deixávamos de cumprir a quota dos independentes no Conselho de Administração da empresa, porque nomes como Luís Valente Oliveira, António Lobo Xavier e António Vila Cova estão já há 12 anos na administração da empresa. Não deixam de ser menos independentes por isso. Mas o que fizemos foi alargar o conselho de administração a quatro novos administradores, que cumprem essas regras de independência. Para além de Jorge Coelho, que fica com uma vice-presidência do órgão, entram três novos administradores: Francisco Seixas da Costa, Sofia Cerveira Pinto e Ana Paula Sá Ribeiro, os três como vogais.

Que alterações devemos esperar para esse novo plano estratégico que Jorge Coelho vai ajudar a repensar?
O actual, que arrancou em 2007, foi desenhado por Jorge Coelho. Acredito que não vai ter muitas alterações. O que vamos fazer, sobretudo, é recomeçar em algumas áreas que, entretanto, tivemos de alienar. Está na altura de olhar para tudo, de novo. Estamos num processo de análise e a pensar em tudo. A diversificação é uma obrigatoriedade.

Vão estar atentos a que oportunidades? Em Portugal ficaram com a Takargo algo desgarrada, depois de venderem a Tertir. Vão voltar à logística?
O transporte ferroviário vai ter que crescer. Acredito que é aqui que vão surgir investimentos. A ligação Poceirão-Caia não será igual ao que estava pensado, mas alguma coisa há-de ser. E Lisboa e Porto também precisa de uma linha dedicada para tirar a carga de linha do Norte. A nossa presença na carga ferroviária é para ficar.

E aos portos, poderão voltar?
Eu acredito que vão avançar os investimentos no Porto de Leixões e em Sines e poderemos participar na construção. Mas nós não temos intenções de ser investidor na área dos portos. Mantemos os portos no Malawi, mas em Portugal estamos limitados, por causa dos compromissos que assumimos aquando da venda da Tertir. Depois de passarem os prazos, logo se vê.

O sector do imobiliário contará para essa diversificação?
Na verdade é um área que nunca teve grande peso no nosso negócio. Sendo muito mais construtor do que promotor, nunca gostei muito de obras do imobiliário, mas admito que a Mota-Engil deveria ter olhado melhor para este segmento nos últimos tempos. As nossas preocupações eram outras, queríamos reduzir a dívida. Se houver oportunidades, vamos pensar nisso.

Não receia chegar já tarde de mais?
boom da construção no imobiliário ainda não acabou. O crescimento vai continuar, apesar de mais moderado. Temos um conjunto de terrenos próprios, em Lisboa e no Porto, vamos olhar para eles. Mas são áreas onde é preciso sempre muito dinheiro.

No sector da energia, tem no México o projecto Fénix, em parceria com um sindicato. Como está a correr?
Está a correr muito bem. Na hídrica também está a andar e com rentabilidade. Estamos na fase final das negociações nos investimentos de ciclo combinado, mas vai haver eleições no México, nada se decide nos próximos três meses. A energia é uma área em que vamos olhar também noutros países. Nuns casos, vamos olhar para a produção de energia, noutros sítios estaremos mais atentos às oportunidades na distribuição. Aqui em Portugal fala-se muito nas concessões em baixa, ninguém sabe o que é. Vamos ver.

Referiu a agricultura como uma das indústrias mais promissoras e competitivas, não só em Portugal, como em Angola. A Mota-Engil está a pensar investir na agricultura?
A questão da rega, do abastecimento de água, das salinas, são tudo oportunidades a que estaremos atentos. Se houver uma privatização do sector da rega e distribuição, estaremos atentos, claro. Há poucas condições neste país para que a água tenha um crescimento grande. É entendido aqui por todas as áreas que a água é um bem público e que não devem ser privados a fazer [a sua gestão]. Mas a sua distribuição e a questão da gestão de projectos de rega, porque não?

A questão do bem público não ser privatizado é para evitar que venha a parar em mãos de empresas estrangeiras.
E isso só não acontece se houver vontade de criar um sector empresarial forte neste país. Essa é uma vontade que poucas vezes se vê.

Acha que há má vontade com as empresas portuguesas?
Há diferenças. Um americano quando está parado numa esquina e vê alguém a passar de Mercedes pensa "quando é que eu terei um"’; um português olha para o fulano e diz "quando é que tu andas a pé como eu?”.

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