D. Manuel Clemente quer licenças laborais para acompanhar doentes em fase terminal
Cardeal-patriarca de Lisboa lamenta que cuidados paliativos não sejam suficientes "nem em qualidade nem em quantidade". Protestantes e comunidade bahá'í recusaram subscrever documento que rejeita categoricamente a eutanásia.
O cardeal-patriarca de Lisboa, D. Manuel Clemente, defendeu esta quarta-feira a criação de licenças laborais que permitam às pessoas acompanhar os seus familiares doentes em fase terminal. “Como já há licenças para acompanhar a maternidade e a paternidade, também deve haver para acompanhar pessoas que estão doentes e que precisam de ajuda e proximidade”, preconizou.
“Quando a vida dói e é particularmente sofrida, pelos próprios, pelos seus familiares, pelos amigos, por todo o sistema hospitalar e de saúde, tem de ser devidamente acompanhada tecnicamente, pelos cuidados paliativos, e com a possibilidade para que as pessoas realmente o possam fazer, o que tem a ver com a disponibilidade física e até laboral”, lembrou o cardeal-patriarca, citado pela agência Ecclesia.
Lamentando que os cuidados paliativos não sejam suficientes “nem em qualidade nem em quantidade", D. Manuel Clemente apontou a necessidade de uma aposta urgente na sua melhoria, considerando que compete à sociedade “como um todo” valorizar a vida e “acompanhá-la, sobretudo quando ela está em perigo”.
O presidente da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) falava à margem da conferência promovida pelo Grupo de Trabalho Inter-Religioso (GTIR), promovida para a subscrição de uma posição contra a eutanásia cujos projectos de lei vão ser votados no dia 29 no Parlamento. O propósito era conseguir uma posição que fosse congregadora do olhar das diferentes comunidades religiosas representadas no GTIR, da islâmica à judaica, passando pelos budistas, ortodoxos, pela comunidade Bahá’í, pela Aliança Evangélica e pelo Conselho Português de Igrejas Cristãs (Copic), entre outros.
Intitulado “Cuidar até ao fim com compaixão”, o documento rejeita a legalização da morte assistida no país "em qualquer das suas formas, seja o suicídio assistido seja a eutanásia".
"Nós, comunidades religiosas em Portugal, acreditamos que a vida humana é inviolável até à morte natural e perfilhamos um modelo compassivo de sociedade", lê-se no documento, cujos oito signatários se dizem convencidos de que "quem se sente acompanhado não desespera perante a morte e não pede para morrer", predispondo-se a contribuir para participar no "verdadeiro desígnio nacional" que é estender a todos os cuidados paliativos.
Comunidade bahá'í e protestantes de fora
Tal como o PÚBLICO noticiou, a comunidade Bahá'í e o Copic, que agrega metodistas, presbiterianos e lusitanos, todos enquadrados no protestantismo de raíz europeia, puseram-se de fora desta declaração. "De uma maneira ageral, não nos precipitamos em traçar os limites daquilo que é socialmente lícito ou ilícito, preferindo afirmar as nossas convicções em diálogo e no respeito pela laicidade do Estado", justificou o Copic, em comunicado emitido ao final da tarde.
No documento, os protestantes recusam "um pronunciamento oficial sobre a morte assistida ou eutanásia" e dizem-se interpelados pelos que, no campo médico, questionam a admissibilidade da obstinação terapêutica e do sofrimento insuportável de alguns doentes em fase terminal. "Recusamos admitir que, diante da doença, do sofrimento e da morte, exista um quadro rígido que defina o que é a dignidade, a liberdade individual ou a responsabilidade colectiva", reafirmam. E, lembrando que "nenhuma teologia cristã pode advogar o sofrimento intolerável", os protestantes recusam assim colar-se a uma posição categórica sobre a eutanásia.