Não há nada de excepcional na mediocridade do futebol
Os problemas de criminalidade organizada e de corrupção são infelizmente de todos nós. E se uma empresa, chame-se Sporting ou outra coisa qualquer, é instigadora, autora ou de algum modo favorece e beneficia destas práticas criminosas, tem de ser punida como associação criminosa que é.
Não há já grande paciência para quem venha pedir “reflexões profundas sobre o nosso futebol”, intervenções do Governo, novas entidades públicas e invectivas afins também agora a propósito das recentes agressões a jogadores e equipa técnica do Sporting. Que os clubes de futebol acoitam com alegria uma quantidade imensa de gente desocupada e de comportamento no mínimo duvidoso é coisa sabida há décadas, das autoridades policiais e de todos os demais, a começar pelos dirigentes dos clubes que disso também beneficiam. E isso nunca levou a nenhuma medida concreta, a não ser as determinadas pelos tribunais em processos judiciais, a pessoas concretas.
E os dramas do Sporting? Este clube tornou-se, é verdade, uma experiência sociológica em permanência, na sua oferta mais recente e bastante ritmada de insultos, pancadaria e declarações públicas primando pela elegância. Vive também a circunstância, nunca vista, da relação entre os seus presidente, treinador de futebol e jogadores, ser mais emotiva e descompensada do que a novela das nove, o que se deve, já não há dúvidas, ao facto da personagem principal, Bruno Carvalho, ser a mistura mais perfeita que conseguimos entre Sinhôzinho Malta e Al Capone, o que ele certamente verá como um elogio. E é certo também que uma horda de cidadãos entrou por propriedade privada adentro e espancou e insultou os supostamente seus heróis de infância, no momento em que se noticiava, com bastante concretude, episódios de corrupção por parte de dirigentes deste clube e logo a propósito de uma modalidade inócua como o pobre do andebol. Ufff! Parece ser tudo isto demasiado para tão pouco tempo?
Receita por partes.
Os problemas de relacionamento pessoal num clube de futebol resolvem-se da mesma forma que os demais problemas do foro íntimo noutros contextos, com uma mistura de psicoterapia, direito e bom senso. Se o último faltar, terá de ser compensado provavelmente por doses superiores dos primeiros.
Os problemas das empresas privadas, mesmo que se chamem clubes de futebol, que vêem os seus funcionários e os seus projectos implodir diariamente quase em directo nas televisões, são em primeiro lugar problemas seus, dos seus administradores e dos seus accionistas e não são problemas do País, apesar de muitos nos quererem convencer do contrário, a começar pela imprensa que vive da morbidez do adepto e do exacerbar do futebol para além dos seus limites naturais. Resolvam-nos, se quiserem, mas não nos convençam que os dramas de Jorge Jesus ou de outro qualquer funcionário são dramas nacionais.
Já os problemas de criminalidade organizada e de corrupção, esses, infelizmente são de todos nós. E se uma empresa, chame-se Sporting ou outra coisa qualquer, é instigadora, autora ou de algum modo favorece e beneficia destas práticas criminosas, tem de ser punida como associação criminosa que é. E se alguém, em seu nome ou na defesa de um qualquer ideal a si associado, acha adequado espancar pessoas, destruir património ou pagar a árbitros (1500 euros? Aquilo anda mal pelo andebol...), também há leis e instituições para lidar com isso. Afinal, como dizia um ilustrado, “o crime faz parte do dia a dia”. Pois faz. Mas só se for do seu, com certeza.
Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa