Rui Rio mantém tabu sobre recondução da procuradora-geral
A vice-presidente do PSD Elina Fraga elogiou Joana Marques Vidal e criticou o Governo por ter sugerido em Janeiro que a procuradora não será reconduzida. Na bancada do PSD há deputados que defendem que o partido se batam já pela renovação, em Outubro, do mandato da magistrada.
Ao contrário da sua vice-presidente Elina Fraga, que na edição de sábado do Expresso afirmava ter “absoluta confiança na procuradora-geral” da República, e da vontade expressa por vários deputados do partido, o líder do PSD recusou ontem comentar o mandato e eventual recondução de Joana Marques Vidal. Contactado pelo PÚBLICO, o líder social-democrata fez saber que considera a questão extemporânea, lembrando que o mandato da actual procuradora-geral da República só termina em Outubro e que se referirá ao assunto “a seu tempo”.
A questão da recondução de Joana Marques Vidal volta a ganhar um interesse especial numa altura em que o caso Sócrates, a que o seu mandato fica já indelevelmente ligado, regressou com estrondo à ordem do dia e num momento em que o próprio Rui Rio se prepara para dedicar um mês ao sector da Justiça, que diz precisar de uma reforma “séria e integrada, e que abranja os vários sectores da sociedade”.
Este fim-de-semana, quando questionada sobre o tema, a vice-presidente do PSD Elina Fraga manifestou ao Expresso a sua “confiança total na procuradora-geral da República, na sua independência, assim como na independência nos magistrados judiciais e do Ministério Público em geral”. A ex-bastonária da Ordem dos Advogados, convidada por Rio para uma vice-presidência do partido numa escolha muito contestada no último congresso, criticou a intervenção da ministra da Justiça, Francisca Van Dunem, que em Janeiro - também numa entrevista, mas à TSF - sugeriu que o mandato da procuradora-geral da República não seria renovável. “Discussão inusitada”, “antecipações inusitadas de cenários futuros” que fragilizam os magistrados do Ministério Público e a procuradora-geral da República, censura Elina Fraga, para quem ainda não era chegada a hora de abrir esse debate.
Opinião diferente têm vários deputados do PSD que se mostram favoráveis a que o partido defenda já a recondução da actual procuradora-geral da República para mais um mandato. Entre eles está a ex-ministra da Justiça Paula Teixeira da Cruz que sustentou esta posição na reunião da bancada parlamentar de quinta-feira, um dia depois de o líder parlamentar Fernando Negrão ter trazido a lume, no debate quinzenal, a questão da responsabilidade política de José Sócrates.
Outro dos deputados que defenderam a recondução de Joana Marques Vidal foi Miguel Morgado, ex-assessor político do antigo primeiro-ministro Pedro Passos Coelho. “Qualquer coisa que não seja a recondução da procuradora ou alguém com o seu perfil deve ser condenada”, afirmou ao PÚBLICO. O deputado considera que o “bloqueio” que acusa o antecessor de Joana Marques Vidal - Fernando Pinto Monteiro - de ter introduzido no funcionamento normal do sistema deve ser evitado. “É demasiado grave para que possa voltar a acontecer”, defende.
Para o também deputado do PSD Duarte Marques, a decisão de reconduzir Joana Marques Vidal ou de nomear alguém com um perfil semelhante será um “sinal” dos socialistas. É como se fosse um “teste” ao “arrependimento socialista”, sustenta, lembrando também que os anos que antecederam o mandato de Joana Marques Vidal ficaram marcados por uma “conivência absurda entre os interesses do poder político e as opções de quem à época liderava o Ministério Público”.
Estes deputados e outros apoiaram Negrão na sua decisão de confrontar o primeiro-ministro António Costa com a demarcação do PS ao ex-chefe de Governo. Fora do Parlamento outras vozes sociais-democratas também defendem que deve ser discutida a dimensão política e ética do comportamento de José Sócrates. Miguel Poiares Maduro, ex-ministro adjunto do Primeiro-ministro, é uma dessas vozes. O antigo governante defende a recondução de Joana Marques Vidal no cargo. “A partir do momento em que o mandato é renovável, a não renovação é uma escolha política e uma avaliação negativa do seu mandato”, afirmou ao PÚBLICO.
Mas Rui Rio, por ora, pretende aproveitar o mês que vai dedicar à Justiça para mostrar a sua preocupação, não com o futuro da Procuradoria-Geral da República, mas com o sector em geral e com o combate à corrupção. A partir do dia 21, o líder do PSD reunir-se-á com várias entidades da área, incluindo universidades, ordens profissionais, associações sindicais e tribunais, mas não está previsto nenhum encontro com a procuradora-geral, pelo menos na agenda já divulgada. Mas se Rui Rio entende que este não é o melhor momento para discutir a sucessão de Joana Marques Vidal –, a verdade é que na campanha das eleições para a liderança do PSD não conseguiu fugir ao tema.
Logo no primeiro frente-a-frente televisivo com Santana Lopes, Rio foi questionado sobre o assunto e não conteve as críticas à forma como o Ministério Público (MP) tem permitido que alguns julgamentos sejam feitos na praça pública, antes de chegarem às salas de audiência. Na RTP, o então candidato à liderança do PSD assumiu que o balanço que fazia do mandato da procuradora não era positivo. “O balanço que faço não é um balanço positivo, não vejo no Ministério Público a eficácia que gostava de ver.” Santana discordou. “Se há algo que não pode ser dito, é [que os magistrados do MP] tiveram receio de enfrentar poderosos. Um ex-primeiro-ministro tem sido muito visado e grandes figuras do sistema económico também”.
Em Janeiro, o tema da eventual não recondução de Joana Marques Vidal pelo Governo foi amplamente aproveitado por Santana Lopes. Rui Rio ainda tentou desvalorizá-lo, mas até o Presidente da República se viu obrigado a fazer um comentário. Numa nota oficial, Marcelo Rebelo deSousa esclareceu que só se pronunciará sobre o assunto - que na altura considerou ainda um “não assunto”- em Outubro, quando o mandato de Joana Marques Vidal chegasse ao fim. Rui Rio subscreveu a posição do Presidente a 100% e explicou que no debate da RTP nem entendeu por que razão havia sido confrontado com a questão sobre a procuradora-geral. “Eu não devo alimentar isto, dizendo nem sim nem não, senão estava a colaborar numa coisa que é má para a procuradora”, disse mais tarde, recusando comentar a recondução de Joana Marques Vidal. com Margarida Gomes