Investigadores criam “ilhas flutuantes” de cortiça e plantas para despoluir zonas portuárias

Projecto do CIIMAR, da Universidade do Porto, recorre a um sistema constituído por cortiça e plantas para remover poluentes das zonas portuárias. Resultados são "bastante promissores"

José Teixeira/CIIMAR
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Um grupo de investigação do Centro Interdisciplinar de Investigação Marinha e Ambiental (CIIMAR) está a testar um sistema constituído por cortiça e plantas que visa remover poluentes da água salgada, mais especificamente em zonas portuárias.

Com este projecto pioneiro, cujo protótipo está instalado na marina do Terminal de Cruzeiros do Porto de Leixões (APDL), em Matosinhos, além de melhorar a qualidade da água, pretende-se reabilitar os ecossistemas e promover a biodiversidade local, explicou à Lusa a investigadora do CIIMAR Cristina Calheiros, uma das responsáveis pelo projecto.

Para tal, o grupo de investigação desenvolveu um sistema de tratamento biológico — designado "ilha flutuante" —, composto por três plataformas flutuantes de cortiça, interligadas entre si, com orifícios onde foram colocadas quatro espécies distintas de plantas. Essas quatro espécies — Sarcocornia spp., Juncus spp., 'Phragmites spp. e Halimione spp. — foram seleccionadas por se desenvolverem em zonas húmidas, frequentemente inundadas por água salgada ou salobra de origem marinha, estando por isso adaptadas a salinidade variável, referiu a investigadora.

As ilhas flutuantes, continuou a responsável, são normalmente aplicadas em lagoas que recebam águas residuais domésticas ou industriais, fazendo parte da estratégia de reabilitação de rios e outras massas de água contaminadas. Esta é a primeira vez que um sistema deste género é aplicado numa marina, local geralmente caracterizado por uma elevada salinidade e pela presença de diversos contaminantes derivados do tráfego marítimo, como hidrocarbonetos e metais pesados, bem como por outras condições, como as tempestades e as oscilações.

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Resultados "promissores"

A plataforma, em fase de testes há cerca de quatro meses, foi desenvolvida pelas empresas Bluemater e Amorim Cork Composites, tratando-se de uma solução de engenharia inspirada na natureza, que imita os processos físico-químicos e biológicos que ocorrem naturalmente para depuração da água, através da acção das raízes das plantas e dos processos microbiológicos associados, indicou Cristina Calheiros. De acordo com a investigadora, os resultados obtidos até à data são "bastante promissores" e mostram "uma boa adaptação das plantas", estando estas a sobreviver e a desenvolverem-se.

"Já estamos a verificar toda uma fauna associada [às plantas], como moluscos, bivalves e algas, que fazem parte do ecossistema e promovem a depuração da água", indicou, notando que, até à data, não existiam registos de sobrevivência das plantas nestas condições de salinidade. Prevê-se que, "com o tempo, toda a plataforma de cortiça fique coberta de vegetação, promovendo a biodiversidade e potenciando vários benefícios que esse ecossistema providencia", bem como o alargamento do projecto para outras marinas.

Cristina Calheiros acredita que, dessa forma, o sistema desenvolvido pode ajudar a criar margens e "uma dinâmica completamente diferente" em zonas como as marinas portuárias, normalmente sem vegetação e "aparentemente desprovidas de vida". As etapas seguintes do projecto, desenvolvido por uma equipa multidisciplinar, passam pela análise microbiológica, associada a técnicas de biologia molecular e química. "Vamos analisar as plantas, o que estas conseguem remover, bem como a acção das bactérias associadas às raízes, através de estudos de campo e no laboratório", identificando as "superplantas para estas condições", frisou.

A investigadora acrescentou que o desenvolvimento destas soluções está alinhado com os objectivos para o desenvolvimento sustentável da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas. No projecto participam ainda as investigadoras do CIIMAR Ana Paula Mucha e Marisa Almeida, esta última também da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto.