Distinguir boas práticas, não proibir. Como quer o Governo reduzir os plásticos?

Até o final do ano, tutela conta ter projectos de redução de resíduos em marcha na restauração. Que podem dar origem a medidas legislativas. Para já secretário de Estado do Ambiente admite que garrafas de plástico possam ter tara recuperável, como propõem o PAN.

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Tiago Petinga

O secretário de Estado do Ambiente, Carlos Martins, acha que dificilmente a mudança de comportamentos em prol da sustentabilidade ambiental acontece com proibições. O que o leva a justificar a sua oposição ao fim, por decreto, dos utensílios de plásticos na restauração. Quer ir por outra via, que está a trabalhar com duas associações do sector: a distinção e apoio de boas práticas. E vê-se a viabilizar a iniciativa do PAN de implementar a tara recuperável para garrafas de plástico.

O governante admite que o sector da hotelaria e restauração “já funcionou muito melhor do que funciona nos últimos tempos” no que diz respeito à reciclagem e consumo de resíduos não reutilizáveis. Mas vê sinais positivos do sector. “A AHRESP [Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal] está muito empenhada. Estamos a trabalhar com eles para criar uma simbologia que permita aos cidadãos identificar os restaurantes, as pastelarias e hotéis que têm boas práticas ambientais”. Com isto, Carlos Martins refere-se a espaços que usem produtos reutilizáveis, promovam a reciclagem e reutilização a vários níveis (dos plásticos aos óleos), apostem na eficiência energética e tenham, por sistema, práticas de poupança de recursos. O objectivo do Governo é chegar a acordos voluntários com determinados grupos de empresas.

Da parte da distribuição, as reuniões com a Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED) deixaram o secretário de Estado convicto de que há “muita abertura” para promover projectos-piloto na restauração nas grandes superfícies. A tutela conta, até ao final do ano, ter “dois ou três” projectos em marcha e está disponível para “apoiar aqueles que sejam pioneiros através do Fundo Ambiental”.

É a partir destas iniciativas que se podem identificar os modelos mais eficazes, que permitirão no futuro criar legislação nesse sentido, acredita o secretário de Estado.

Isto sem prejuízo do Governo “pensar noutras estratégias e incentivar projectos inovadores na área da recolha mais eficiente de algumas embalagens”. Carlos Martins admite que pode vir a ser “construído, dando tempo aos meios para se adaptarem, um sistema de depósito de garrafas de plástico”, a chamada “tara recuperável”. E mais tarde repetir o processo com o vidro e latas. Esta é aliás a proposta do PAN, apresentada nesta semana, com vista à diminuição “drástica” da quantidade de resíduos incinerados ou encaminhados para aterro, concretização de uma economia circular e redução da poluição ambiental.

Mas nada disto pode ser feito sem fomentar a sensibilidade ambiental junto dos cidadãos. E Carlos Martins reforça que estes têm “poder para exigir mudanças junto das marcas”. “Não vale a pena termos valores se eles não estiverem associados a comportamentos”, afirmou.

Viabilidade das mudanças

Não prejudicar as empresas portuguesas face às concorrentes europeias é uma preocupação. Numa altura em que existe uma estratégia europeia para lidar com plásticos – sendo uma das metas que todas as embalagens no mercado sejam recicláveis em 2030 –, mas ainda não é conhecida a legislação comunitária para a pôr em prática, Carlos Martins diz que vai ser necessária uma calendarização adequada à realidade nacional. Isto para que as empresas de reciclagem e produtos plásticos, “que evoluíram muito nos últimos anos”, se consigam adaptar às exigências tecnológicas e ser competitivas. “Queremos evoluir, estar na linha da frente, mas não queremos criar uma situação que seja mais constrangedora para os empresários portugueses do que para os restantes. Isso temos que acautelar”.

O Governo criou, no início deste ano, um grupo de trabalho que, como previsto no Orçamento de Estado, está a avaliar os incentivos fiscais relacionados com o consumo de sacos plásticos e a possibilidade de alargar medidas a outros produtos plásticos. Os resultados desse trabalho, que decorre até ao final do mês, devem ser conhecidos no início de Junho. E Carlos Martins apoia mais a ideia de uma fiscalidade que premeie bons comportamentos do que uma penalizadora.

Da parte da indústria importa incorporar menos matéria-prima e substituir materiais, quando possível. “Há um conjunto de situações, por questões de saúde pública e/ou higiene alimentar, em que o plástico dificilmente é substituível com sucesso. Mas há plásticos mais recicláveis que outros.” Para além de estimular as empresas a optar por estas opções, quando o recurso ao plástico for inevitável, o secretário de Estado quer continuar a promover a substituição de materiais e o ecodesign – segmento para o qual o Governo abriu um concurso de um milhão de euros do Fundo Ambiental para apoio de projectos – para que se façam produtos com materiais homogéneos e facilmente recicláveis.

A inovação é uma oportunidade. “Uma política consistente nesta área levará as universidades, os politécnicos, os centros tecnológicos a serem mais inovadores e mais criativos ao nível dos materiais alternativos. E a minha esperança é que em áreas onde o plástico nos vá acompanhar mais algum tempo se encontro um plástico mais reciclável, com maior perspectiva de vir a ser incorporado como matéria-prima para outros produtos secundários”. Perspectivando uma vida mais longa, por exemplo, para uma garrafa de plástico que venha ser uma camisola.

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