Marcelo recusa ideia de que tenha havido interferência na esfera judicial
Francisco Louçã, conselheiro de Estado, manifestou estranheza em relação aos comentários do Presidente e do primeiro-ministro no caso Manuel Vicente. "Ninguém se imiscui numa decisão tomada", defende Marcelo.
O Presidente da República rejeitou nesta sexta-feira que os seus comentários sobre a transferência para Angola do processo que envolve Manuel Vicente possam ser interpretados como intromissão na esfera da justiça, argumentando que "ninguém se imiscui numa decisão tomada".
Por outro lado, Marcelo Rebelo de Sousa salientou a importância das relações luso-angolanas, declarando: "Estão em causa centenas de milhares de pessoas, portugueses e angolanos. E, portanto, quando estão em causa centenas de milhares de pessoas, isso é tão forte, tão forte, tão forte, que é mais forte do que tudo."
O chefe de Estado falava durante uma iniciativa na Baixa de Lisboa, em resposta à comunicação social, que o confrontou com a estranheza manifestada pelo conselheiro de Estado e antigo deputado e dirigente do Bloco de Esquerda Francisco Louçã face aos seus comentários e do primeiro-ministro sobre este processo.
"Não é só o Presidente angolano, o primeiro-ministro português e o Presidente português ficaram muito satisfeitos. Até acho um pouco estranho que façam tantos comentários sobre uma decisão judicial. Não é muito comum", afirmou Francisco Louçã, hoje, à rádio TSF.
Questionado se os seus comentários não podem ser interpretados como uma forma de se imiscuir na justiça, Marcelo Rebelo de Sousa respondeu: "Que eu saiba, quando a decisão está tomada, ninguém se imiscui numa decisão tomada. A decisão está tomada, está tomada. Imiscuir é antes."
Interrogado, em seguida, se já tem data para uma visita a Angola, o chefe de Estado nada adiantou, considerando que "não vale a pena estar agora a especular sobre essa matéria".
Sobre a conversa que teve de manhã com o Presidente de Angola, Marcelo Rebelo de Sousa disse que foi João Lourenço a telefonar-lhe e que os dois expressaram a vontade de "continuação da colaboração entre povos e Estados", reiterando "os laços de amizade e de fraternidade existentes".
"Sempre tive a ideia de que estávamos vocacionados para estarmos juntos, sempre, independentemente dos pormenores", reafirmou.
Os dois juízes do Tribunal da Relação de Lisboa que decidiram nesta quinta-feira o envio do processo judicial do ex-vice-presidente angolano Manuel Vicente para Luanda alegam que Angola é, tal como sucede com Portugal, “um Estado baseado na dignidade da pessoa humana”. E criticam, ainda que de forma implícita, os juízes e procuradores que em fases anteriores do caso entenderam manter todo o caso sob a alçada das autoridades portuguesas, sob pretexto de que Angola se mostrava incapaz, do ponto de vista legal, de tratar o assunto da forma mais correcta.
A decisão proferida pelos desembargadores Cláudio Ximenes e Almeida Cabral não tem implicações directas no julgamento dos restantes três arguidos da chamada Operação Fizz, que decorre no Campus da Justiça, em Lisboa.
Para o Ministério Público, Manuel Vicente conseguiu o arquivamento de uma investigação em que era visado por branqueamento de capitais.
As suspeitas que recaem sobre Manuel Vicente indicam que Em 2011 terá pago dinheiro e arranjado um emprego no sector privado a Orlando Figueira, procurador do Departamento Central de Investigação e Acção Penal, para que este arquivasse um processo que tinha em mãos, no qual o então presidente da Sonangol e futuro vice-presidente de Angola era suspeito de ter usado dinheiro proveniente de crimes na compra de um apartamento de luxo no Estoril.