A Eurovisão mais barata desde 2008 obrigou a RTP a fazer contas
Alocação de quatro milhões de euros à operação é "grande pressão" no orçamento da estação pública para 2018. Gonçalo Reis admite que pode haver "ajustes" na grelha.
O aparato da Eurovisão são milhares de turistas e fãs de t-shirt com o coração do evento ao peito e bandeiras às costas por Lisboa, mas são também cerca de 20 milhões de euros de investimento para ter a capital portuguesa e a RTP como anfitriãs do festival – é “a operação mais complexa, de maior envergadura e de maior impacto na cena internacional que a RTP já fez e representa um marco histórico”, descreve o presidente do conselho de administração da estação pública, Gonçalo Reis, ao PÚBLICO, nas vésperas da final. O orçamento, apesar de contido em relação a anos anteriores, “coloca de facto uma grande pressão no desempenho financeiro da RTP em 2018” e pode obrigar a “ajustes” na grelha da RTP1 – nas séries, no entretenimento, no futebol.
Dias depois de ter liderado no horário nobre com a primeira meia-final, ultrapassando, com 985 mil espectadores e 22,6% de share de audiência, as habituais líderes TVI e SIC, Gonçalo Reis responde às questões sobre a dimensão da operação e os eventuais impactos desta nas grelhas, actuais e futuras, após a alocação de quatro milhões de euros da RTP ao Festival da Eurovisão. Não detalhando títulos, Gonçalo Reis admite, numa resposta por email, que “este acontecimento obriga a uma gestão muito cautelosa do ano de 2018” com objectivo máximo de manter o “equilíbrio nas contas da RTP”, “que não será colocado em causa”.
A produção de ficção nacional, explica, pode “ser alvo de algum ajuste em termos de calendarização trimestral ou semestral das estreias ao longo de 2018”. E pode haver “outros ajustes em áreas como o entretenimento na RTP1”, avança, dando um exemplo de “gestão prudente” neste ano Eurovisão: prescindir da corrida pelos direitos de transmissão dos jogos da Liga dos Campeões de futebol, uma “abordagem mais ponderada” que diz estar “ainda em processo de consulta”.
A RTP1 aguarda ainda a nomeação de uma nova direcção de programas, após a saída de Daniel Deusdado, e a tomada de posse de Hugo Figueiredo, novo administrador para os conteúdos, na sequência da não recondução de Nuno Artur Silva. Este disse ao semanário Sol há duas semanas que a série Teorias da Conspiração é um exemplo da “reorganização das estreias previstas” por “questões orçamentais".
É à European Broadcasting Union (EBU), detentora do formato do festival, que cabe metade da despesa, com o Fundo de Desenvolvimento Turístico da Câmara Municipal de Lisboa (CML) a contribuir com cinco milhões (dos quais 2,8 milhões foram transferidos para a RTP no âmbito de um protocolo com a CML e a Associação de Turismo de Lisboa) e a bilheteira e a venda de serviços a operadores internacionais a completarem as contas. A vitória de Salvador Sobral em 2017 criou “uma responsabilidade” e “uma oportunidade única numa geração para a RTP demonstrar as suas capacidades técnicas, criativas e de produção executiva” perante requisitos “extremamente exigentes”, que vão da segurança à dimensão criativa que recaiu sobre o canal, nota o presidente da RTP.
“O valor gasto este ano é o mais baixo desde 2008, ano em que começou a haver duas meias-finais", disse na quarta-feira o supervisor executivo do festival, Jon Ola Sand, à imprensa, situando o orçamento total da operação entre os 19,7 e os 20,1 milhões de euros. Gonçalo Reis garante que a administração está focada no objectivo de que os gastos com a Eurovisão não se reflictam na rádio pública ou nos outros canais (RTP2, RTP3, RTP Memória e os internacionais) e insiste que é “o orçamento mais contido dos últimos dez anos” e simultaneamente “uma Eurovisão de nível muito alto”. Mas o presidente da RTP aproveita para alertar que se mantêm as necessidades de actualização tecnológica da RTP e que a empresa está “preparada para avançar com um plano de investimento e apetrechamento tecnológico uma vez reunidas as condições financeiras previstas”.