Pessoa e Saramago são difíceis? Então leve-se a aula para o palco

Alunos da secundária de Águas Santas criaram teatro que torna José Saramago, Fernando Pessoa os seus heterónimos mais simples e apelativos para os estudantes.

Fotogaleria
Paulo Pimenta
Fotogaleria
Paulo Pimenta
Fotogaleria
Paulo Pimenta
Fotogaleria
Paulo Pimenta
Fotogaleria
Paulo Pimenta
Fotogaleria
Paulo Pimenta
Fotogaleria
Paulo Pimenta
Fotogaleria
Paulo Pimenta
Fotogaleria
Paulo Pimenta
Fotogaleria
Paulo Pimenta

Pelo ziguezaguear labiríntico dos corredores da Escola Secundária de Águas Santas, na Maia, chegamos ao auditório da escola, no qual se encontram aproximadamente 40 jovens do clube de teatro QCENA. Vestidos com uma camisa branca, t-shirt preta e um chapéu à moda antiga, vão ultimando, na terça-feira, os preparativos da peça “Fragmentos”, que irão, ao longo do dia seguinte, mostrar aos colegas. As apresentações escolares servirão de treino para o grande espectáculo, que ocorrerá na noite de 19 de Abril, no Auditório Manuel Correia, na freguesia de Águas Santas.

“Vamos ensaiar a peça do princípio ao fim, mesmo que existam enganos!”, exclama da última fila do auditório a professora Amélia Lopes, fazendo-se ouvir por cima das vozes entusiasmadas dos adolescentes. “Alguém que ligue ao Rui!”, diz alguém, com urgência. Elsa Gonçalves, a segunda docente que coordena o ensaio geral, senta-se em silêncio na primeira fila, dando pequenas indicações. Quando todos estão a postos, as luzes descem e o ensaio geral é iniciado.  

José Saramago, Fernando Pessoa e os seus heterónimos, Alberto Caeiro, Ricardo Reis e Álvaro de Campos, são figuras principais da encenação. A história, que tem lugar na freguesia do concelho da Maia, conjuga o livro O ano da morte de Ricardo Reis de Saramago com a escrita de Fernando Pessoa, ortónimo, e os seus múltiplos heterónimos. Ao longo da peça, Fernando Pessoa fala com os seus fragmentos identitários, descreve-os e elogia-os. A cada heterónimo, encena-se um poema.

A escrita de José Saramago e Fernando Pessoa — que constitui o calcanhar de Aquiles de muitos alunos do secundário — foi dissecada e simplificada na fase de construção dramatúrgica da peça. A docente Amélia Lopes resume o trabalho dos jovens, nesta primeira fase: “Dissemos aos alunos para retirar tudo o que era discurso directo. Isso obriga-os a entrar no texto”, diz a docente, admitindo que “é difícil fazer com que miúdos leiam” estes autores que, como faz questão de dizer, “não são de análise simples”.

Uma peça de alunos para alunos

Desde Setembro que o espectáculo está a ser preparado. A construção da peça é feita pelos alunos, como as professoras fazem questão de salientar: “A pesquisa, dramaturgia, interpretação e produção foram feitas por eles. É evidente que damos as pistas orientadoras, mas nada mais”. E não são raras as vezes em que são os próprios alunos a explicarem às docentes a razão do posicionamento de um objecto, ou de determinada alteração a uma fala.

Os estudantes dizem ao PÚBLICO que o objectivo do projecto é fazer algo de que sintam orgulho. “Também entramos pelo dinheiro”, diz um dos jovens, arrancando gargalhadas aos restantes. A boa disposição é uma constante nas reuniões de grupo e, apesar de os alunos estarem separados por quatro turmas diferentes, já nem se dão conta dessa divisão: “O projecto permitiu-nos criar fortes laços de amizade e teve grande impacto nas turmas envolvidas”, garantem.

Para a professora Elsa Gonçalves esta convivência é a melhor forma de construção das personalidades dos jovens: “O teatro transmite-lhes confiança e auto-estima. Nenhuma sala de aula lhes consegue dar esta atitude”. Também os alunos corroboram esta linha de pensamento: “A sala de teatro é um espaço seguro onde podemos tentar coisas novas”.

Economia, ciências e arte juntos no teatro

A entrega dos alunos à peça “Fragmentos” é parte do segredo. Os nove diferentes cenários foram desenhados e pintados pelos estudantes no período de interrupção lectiva da Páscoa: “Abdicamos de grande parte das férias para acabarmos os panos”. Os cerca de 40 alunos vêm de áreas muito diversificadas: ciências, artes e economia. “Foi muito bom ver os alunos de ciências a pintar os cenários”, diz Amélia Rodrigues.

Como se aproxima a época dos exames nacionais, as professoras acham que esta iniciativa pode servir, também, de ajuda à preparação para a prova de Língua Portuguesa, comum aos diferentes cursos: “É uma preparação para exame, de forma lúdica e motivante”.

Depois dos espectáculos escolares, segue-se, a 19 de Abril, a encenação da peça no Auditório Manuel Correia, na freguesia de Águas Santas. O nervosismo “é muito”, admitem os jovens, mas o desejo de mostrar a sua criação é ainda maior.

Texto editado por Ana Fernandes

Sugerir correcção
Comentar