Presidente veta lei sobre assinatura de projectos, dizendo que volta a antes do 25 de Abril
Marcelo considera que o Parlamento transformou em definitivo o regime provisório que permite aos engenheiros assinar projectos de arquitectura , “deturpando o largo consenso então obtido e constituindo um retrocesso em relação à negociação” com todas as partes envolvidas
Menos de 24 horas depois de a ter recebido para promulgação, o Presidente da República vetou neste sábado a lei que permitia a alguns engenheiros assinarem projectos de arquitectura, por considerar que o Parlamento transformou em definitivo um regime transitório. Com isso “deturpou o largo consenso” obtido com as partes interessadas anteriormente, o que considera “um retrocesso em relação àquela negociação”, transforma “uma permanência da excepção” e faz regressar “de alguma forma ao regime jurídico anterior ao 25 de Abril”.
Em declarações aos jornalistas na Maia, já na tarde deste sábado, o Presidente da República afirmou não ver "nenhuma razão" para agora se prolongar a possibilidade de os engenheiros civis assinarem projectos de arquitectura, face ao número e à qualidade de arquitectos que o país tem.
"Era um regime antigo, esse regime antigo foi sendo prolongado no tempo, primeiro até 2009, depois até 2015 e até 2018. Eu não vejo nenhuma razão, hoje, pelo número e pela qualidade dos arquitectos que temos, em estar a prolongar uma solução que foi sendo prolongada e devia terminar agora em 2018", justificou Marcelo Rebelo de Sousa.
O diploma em causa alterava a Lei 31/2009 que estabelecia um regime transitório que permitia aos engenheiros e engenheiros técnicos aprovarem projectos de arquitectura durante cinco anos, revogando uma lei de 1973. Em 2015, este regime transitório tinha sido estendido por mais três anos e agora, passado esse prazo, esta excepção iria tornar-se definitiva.
Foi isso que o Presidente da República quis travar: “O diploma ora aprovado pela Assembleia da República, sem que se conheça facto novo que o justifique, vem transformar em definitivo o referido regime transitório, aprovado em 2009 depois de uma negociação entre todas as partes envolvidas, e estendido em 2015, assim deturpando o largo consenso então obtido e constituindo um retrocesso em relação àquela negociação, alterando fundamentalmente uma transição no tempo para uma permanência da excepção, voltando de alguma forma ao regime jurídico anterior ao 25 de Abril”.
O diploma, que repõe a possibilidade dos engenheiros matriculados em quatro estabelecimentos de ensino superior até 1987/88 poderem assinar projectos de arquitectura, foi aprovado a 16 de Março por proposta do PSD, que sustentou a iniciativa para ir ao encontro de uma directiva comunitária que reconhece competências para o exercício da arquitectura, a cursos de engenheiro civil até 1988, e de uma recomendação do Provedor de Justiça enviada ao Parlamento. Os engenheiros em questão são os que se matricularam até àquela data nos cursos do Instituto Superior Técnico da Universidade de Lisboa, da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto, da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra e da Universidade do Minho.
O diploma foi aprovado com os votos do PSD, PCP, PEV, PAN e dois deputados do PS, partido que se dividiu e teve 42 parlamentares a votar contra, ao lado do BE e sete deputados do CDS-PP, enquanto outros 32 socialistas se abstiveram, ao lado de dez deputados centristas.
No momento da votação, a deputada do PS Helena Roseta, ela própria arquitecta, defendeu o adiamento para que a lei fosse votada em conjunto uma petição, com 11 mil assinaturas, que se insurge contra a permissão dos engenheiros civis assinarem projectos de arquitectura.
Para esta alteração legislativa, que teve origem na petição “Em defesa do exercício da profissão de engenheiro” foram ouvidas em audições diversas entidades ligadas ao processo, nomeadamente a Ordem dos Arquitectos, a Ordem dos Engenheiros Técnicos, a Ordem dos Engenheiros e a Associação dos Agentes Técnicos de Arquitectura e Engenharia.
A Ordem dos Arquitectos tem vindo a contestar desde sempre a alteração desta lei, sustentando que seria um “retrocesso civilizacional” e uma “vergonha” para a profissão, nas palavras do vice-presidente da Ordem dos Arquitectos, Daniel Fortuna do Couto, a propósito da manifestação em frente ao parlamento realizada na semana da aprovação deste diploma.