A Catalunha precisa “urgentemente de um interlocutor”
Parte da coligação que Carles Puigdemont formou para as eleições de 21 de Dezembro não aceita um governo "que não seja uma afronta a Madrid e permita manter esta situação de tensão com o Estado espanhol".
Joan Subirats é catedrático em Ciência Política, professor da Universidade de Barcelona e especialista em governação, democracia e análise de políticas públicas. "Formar governo é a única forma de sair" do actual bloqueio catalão, defende, numa conversa ao telefone a partir da capital catalã.
O que é que podemos esperar dos próximos plenários do Parlamento autonómico, mais sessões simbólicas ou soluções de futuro?
Há um problema no interior da Juntos pela Catalunha [JxC], uma aliança criada apenas para as eleições, sem uma estrutura orgânica. Só se mantêm unidos em torno do apoio a Carles Puigdemont, só podem subsistir através do restabelecimento da sua legitimidade como líder. Também há tensões entre a Esquerda (ERC, Esquerda Republicana da Catalunha) e os sectores da JxC. A ERC não quer eleições, quer um governo, como parte da JxC, recorrendo a um candidato sem problemas judiciais. Os restantes não admitem formar qualquer executivo que não seja uma afronta a Madrid e permita manter esta situação de tensão com o Estado espanhol.
Mas será possível ultrapassar esse bloqueio ou acabaremos de novo nas urnas, com candidatos detidos e sem garantias de resultados diferentes?
Ir a eleições novamente é uma tragédia. É manter a região bloqueada económica e socialmente mais uma série de meses. Já chega. A mim não me parece que possamos sequer estar mais dois meses sem governo. Já passou demasiado tempo. Não há ninguém que possa falar em nome da Catalunha. A única pessoa que o faz, o presidente do Parlamento, Roger Torrent, não é neutral, não fala em nome de todos os catalães, como se viu da declaração de domingo à noite. A Catalunha não tem um interlocutor e precisa disso urgentemente.
Ao mesmo tempo, regressaram as manifestações e já houve episódios de violência, o que antes não acontecia. Isto apesar dos inúmeros apelos à calma dos líderes independentistas.
É normal. Sem uma direcção política clara, a rua acaba por tomar decisões que não têm qualquer sentido estratégico. A rua mostra que há um profundo mal-estar em parte da população da Catalunha, que há gente zangada, com raiva, dá conta desse furor. Oiço pedidos para uma greve geral, mas não acredito que nenhum dos sindicatos maioritários concorde, não quando a economia está com tantos problemas. E uma tentativa de transferir a tensão política e a discussão para as ruas e para os empregos das pessoas, só vai piorar tudo. Formar governo é a única forma de sair desta situação, tem de haver alguém para debater com Madrid, para negociar.