“A Segurança Social anda ou não a dizer às pessoas para inabilitarem os seus filhos?”

BE agendou para esta sexta-feira um debate urgente sobre os apoios às pessoas com deficiência. O deputado Jorge Falcato diz que a confusão gerada à volta da nova prestação social está a levar, desnecessariamente, pessoas a tribunal para pedirem a inabilitação de quem não precisa.

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O deputado Jorge Falcato quer garantias de que "as pessoas não têm que inabilitar os seus filhos” Nuno Ferreira Santos

Depois de ouvir “queixas de várias famílias” e ver que há “tribunais inundados de processos de inabilitação”, o Bloco de Esquerda vai nesta sexta-feira ao Parlamento perguntar ao Governo “o que devem afinal fazer as pessoas para receber” a nova prestação social de inclusão (PSI), num debate urgente marcado pelo grupo parlamentar. A pergunta parte do deputado Jorge Falcato, que quer que o executivo e a Segurança Social “garantam às pessoas que não têm de inabilitar os seus filhos”.

O deputado diz que a confusão gerada à volta da nova prestação — que substituiu o subsídio mensal vitalício, a pensão social de invalidez e a pensão de invalidez dos regimes transitórios dos trabalhadores agrícolas — está a levar, desnecessariamente, pessoas a iniciar nos tribunais processos de inabilitação dos seus familiares (declarando-os incapazes de gerir os seus bens). “Os serviços da Segurança Social andam ou não a dizer às pessoas para inabilitarem os seus filhos?”, questiona Jorge Falcato. Já em Fevereiro, os bloquistas tinham colocado uma pergunta ao Governo sobre o tema.

“Houve uma carta da Segurança Social que dizia às pessoas que ou eram um tutor legal, ou tinham de apresentar um comprovativo de como tinham iniciado o processo de inabilitação legal. Ora isso não só é desnecessário na grande maioria dos casos, como vai contra as orientações do Comité da Nações Unidas dos Direitos das Pessoas com Deficiência”, sustenta. Para além de, sublinha, contrariar a postura da secretária de Estado da Inclusão, que considerou que esta acção legal deve ser uma opção de “última instância”. É, de resto, isso mesmo que a resposta enviada há poucos dias pelo Ministério da Segurança Social ao Parlamento, na sequência da pergunta do BE, sublinha: assumir a representação legal por via de uma decisão judicial só deve ser considerado “em última instância”; há outras maneiras de um cuidador registado receber a prestação da pessoa de que cuida.

A PSI é recebida por transferência bancária ou carta-cheque, uma alteração relativamente à forma (vale postal) como chegavam os subsídios que veio substituir. Esta mudança levou a que, até Fevereiro, pelo menos 1800 cuidadores não tivessem conseguido aceder à PSI em nome dos beneficiários. E tudo por não estarem registados na Segurança Social como tendo essa responsabilidade.

No mês passado, garantiu a secretária de Estado Ana Sofia Antunes, 800 situações estavam já resolvidas. Para as restantes, foi criado um período transitório. Num primeiro momento, para que não fiquem privadas da prestação, pessoas e instituições cuidadoras podem assinar “uma declaração sob compromisso de honra em como prestam cuidados”, passando a conseguir, em nome do beneficiário, receber o rendimento.

Num segundo momento, e até ao final de Setembro, beneficiários ou cuidadores têm de escolher uma das opções para regularizar o recebimento da PSI: indicar uma conta bancária em nome da pessoa com incapacidade ou uma conta co-titulada com o cuidador; pedir uma procuração que confira poderes ao recebedor; ou iniciar uma acção de representação legal. Para Ana Sofia Antunes esta última opção deve ser usada apenas em casos em que seja “absolutamente inevitável”, pois o objectivo da tutela é que, sempre que possível, a prestação seja recebida pelo próprio beneficiário.

No entanto, Jorge Falcato diz que esta mensagem não chegou às famílias. “Oiço pais a dizer: ‘Então, já inabilitaste o filho?’ Esta foi a informação que receberam dos serviços”, afirma. Isso leva a situações como a do Tribunal de Cinfães onde, diz, “há mais de 50 processos a decorrer”. Para o deputado, “tudo isto faz ainda menos sentido quando o Parlamento já aprovou [no início do mês] outro regime” — “o regime do maior acompanhado” — mais flexível e que irá substituir os dois agora em vigor (o da inabilitação e o da interdição — quando as pessoas são declaradas incapazes de gerir as suas vidas).

Falcato diz ainda não compreender o porquê dos atrasos no processamento desta prestação, “uma vez que o Governo teve dois anos para a preparar”. A PSI, criada em Outubro, beneficiava em Fevereiro 67.396 pessoas.

Atribuição de fraldas

O deputado bloquista vai ainda questionar o Ministério da Saúde sobre as alterações nas atribuições de fraldas a utentes incontinentes. Depois de emitida uma circular normativa em Dezembro, os reembolsos destes produtos foram limitados apenas às pessoas com deficiência que além de uma incapacidade igual ou superior a 60% estejam, também, isentos do pagamento de taxas moderadoras por insuficiência económica. “Isto contradiz a lei de 2009 que diz que o Sistema de Atribuição de Produtos de Apoio contempla a sua atribuição gratuita e universal”, reiterou Jorge Falcato.

A tutela da Saúde será ainda chamada a esclarecer por que razão, pelo menos, dois produtos — cateteres externos e produtos para ostomias pediátricas — deixaram de ser comparticipados, diz o deputado. Que depois conclui: “Há um desencanto generalizado das famílias com as políticas para as pessoas com deficiência deste Governo.”

Questionados pelo PÚBLICO, o ministério e o Instituto da Segurança Social remeteram esclarecimentos para o debate desta sexta-feira.

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