Grande mancha de estupidez

Há uma nova majestosa criação humana. A Grande Mancha de Lixo do Pacífico tem 80 mil toneladas de lixo e está a flutuar no Pacífico Norte. Equivale a 17 vezes o tamanho de todo o território português. É um monumento à estupidez

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Fundação The Ocean Cleanup

A Torre Eiffel tem 7300 toneladas de ferro. É notável. Estima-se que a pirâmide de Queóps tenha, só em granito, oito mil toneladas. É notável. Mas o ser humano nunca está satisfeito e é capaz de façanhas incríveis, que vão desde mandar pessoas à Lua e sondas a Marte, até pendurar-se num prédio, só com uma mão, para fazer um bonito vídeo para o YouTube.

 

Eu sei, estou a fazer comparações estúpidas: o que é mandar entulho para o espaço comparado com um milhão de visualizações no YouTube? Peço desculpa.

 

Há uma nova majestosa criação humana. É um monumento à estupidez, tem 80 mil toneladas de lixo e está a flutuar no Pacífico Norte. Equivale a 17 vezes o tamanho de todo o território português. O monumento tem o pomposo nome de Grande Mancha de Lixo do Pacífico. Só este nome deveria dar direito a um filme de Steven Spielberg e a um parque temático flutuante. Organizar-se-iam excursões até à mancha e, com isso, dinamizava-se o turismo. Adaptemo-nos ao capitalismo: já que caminhamos para a nossa extinção, ao menos ganhemos dinheiro com isso.

 

A primeira preocupação que tenho, quando a esta obra, é não poder felicitar um autor, mas ter que enviar cartas de amor a todos aqueles que colocaram o seu esforço, a sua determinação e a sua estupidez ao serviço do enriquecimento dos oceanos, à base de plásticos e de outras matérias amigas do ambiente e do extermínio de tartarugas e aves marinhas.

 

Calcula-se que a maior fatia da responsabilidade vá para países do Pacífico que não tratam devidamente dos seus resíduos. Dá para perceber a ideia: para que ninguém diga que estamos a deitar lixo para o oceano, deitamos doses massivas de lixo até podermos dizer “peço desculpa, mas alguém está a deitar um oceano no nosso lixo”. E como ninguém quer lixeiras e aterros, porque cheiram mal, deitamos o lixo para o mar, porque ninguém vive no mar. Com excepção, claro, da Pequena Sereira, do Aquaman e do Nemo.

 

Muitos responsáveis políticos dirão que há aqui má vontade dos seres marinhos, ao não aproveitarem o nosso lixo como deve ser. Com duas garrafas de plástico unidas por fio de pesca fazia-se um pequeno telefone. Mesmo achando que um telefone destes é extremamente útil, sobretudo se tiver 4Gb de RAM e uma câmara de 12 MP, se os seres marinhos decidem morrer em protesto contra a poluição, sou obrigado a ficar do lado deles, senhores políticos.

 

Não tardará muito até que alguém decida investir em franquias deste negócio, criando a Grande Mancha de Lixo do Deserto ou a Grande Mancha de Lixo da Floresta. Como nos livros da Anita.

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