Museu de L'Orangerie de Paris vai expor Os Contos Cruéis de Paula Rego

Mostra realiza-se de 17 de Outubro a 14 de Janeiro de 2019. A obra de Paula Rego é "um jogo entre o olhar muito franco e sem concessões e, ao mesmo tempo, uma forma de poesia fantástica", diz a directora do museu, Cécile Debray.

Foto
Tríptico The Fisherman (2005), na agenda do museu de Paris DR

O Musée de L'Orangerie, em Paris, vai expor Os Contos Cruéis de Paula Rego, de 17 de Outubro a 14 de Janeiro de 2019, para mostrar uma obra que "não é suficientemente conhecida" em França, de acordo com a directora do museu.

A exposição vai reunir cerca de 70 pinturas, desenhos e até bonecos que a pintora usa no seu atelier, em Londres, num percurso temático e cronológico que insiste no período "entre finais dos anos 90 até hoje", explicou à Lusa a directora do Musée de L'Orangerie e comissária da exposição, Cécile Debray.

"Aqui, ela é muito menos conhecida do que em Londres ou em Portugal. Foi mostrada em Paris numa exposição da Fundação Gulbenkian [2012], mas creio que não é suficientemente conhecida. Penso que tem uma pintura bastante apelativa, que deverá agradar", disse à Lusa a comissária.

Cécile Debray escolheu como título da mostra Les contes cruels de Paula Rego, numa alusão à obra literária de um simbolista francês, Auguste de Villiers de L'Isle-Adam (1838-1889), e ao universo formal e temático da pintora, que é "bastante ilustrativo e muito ligado à literatura e a uma forma de cultura do século XIX".

"É o universo da infância que é, por um lado, encantador e fantástico e, por outro, tem uma forma de crueldade que é também da infância. Paula Rego tem este lado ingénuo e um olhar muito mordaz e cruel. É este o realismo de Paula Rego, um jogo entre o olhar muito franco e sem concessões e, ao mesmo tempo, uma forma de poesia fantástica", descreveu a comissária da exposição.

Cécile Debray conheceu Paula Rego quando comissariou uma exposição de Lucian Freud no Centro Pompidou, em Paris, em 2010, e quis agora dar-lhe o destaque num museu que quer "programar artistas vivos, nomeadamente os que trabalham a figuração, porque são figuras singulares".

A comissária concebeu a mostra "como um percurso pela obra de Paula Rego, sem ser uma retrospectiva", e "como o Musée de l'Orangerie está ligado ao Museu d'Orsay, a ideia foi fazer uma exposição sobre a sua obra com ecos de obras que ela viu".

Na mostra, vai haver telas de grande formato a representar as suas "mulheres-crianças-animais", obras gráficas em diálogo com desenhos e gravuras de Daumier, Goya, Degas, Rabier, e obras em pastel, apresentadas com os bonecos que lhe servem de modelo.

"Como a exposição se chama Os contos cruéis de Paula Rego, escolhi como ângulo a infância. Portanto, avançamos na obra de Paula Rego com alguns contrapontos, como gravuras de Daumier, Goya, Rabier, Manet, ilustrações dos Contos de Grimm, por [David] Hockney, uma escultura de Ron Mueck e pastéis de Degas", precisou Debray, destacando que "o lugar de honra é para a obra de Paula Rego", ainda que haja alguns "diálogos" com trabalhos de outros artistas.

A directora do Musée de l'Orangerie acrescentou que Paula Rego é "uma artista que tem um universo muito particular, político, com uma ligação à literatura e com uma forma de realismo muito rude e muito poderosa", cultivando uma "força e a independência em relação às modas", e mantendo um lado contemporâneo com a criação dos seus modelos a partir de bonecos.

"Este universo de bonecas, de acessórios, de pequenos cenários quase teatrais é um aspecto extremamente contemporâneo e pouco conhecido. É um laço quase demiúrgico em que ela cria as suas criaturas para depois as representar. Ela mistura o vivo com o artifício, e isso é muito interessante", afirmou.

Cécile Debray declarou, também, que vai ser editado um catálogo da exposição com historiadores de arte franceses, porque quis "dar uma cor mais francesa à abordagem".

A exposição deverá, ainda, ser acompanhada por um ciclo de conferências relacionado com a obra da artista portuguesa, uma jornada de estudo sobre a pintura figurativa, "talvez uma programação de dança e música", e "algo sobre o cinema português, porque ela tem pontos comuns com alguns realizadores portugueses, como Manoel de Oliveira".

Em 2012, a delegação francesa da Fundação Calouste Gulbenkian, em Paris, apresentou a primeira exposição "representativa" da obra de Paula Rego em França, com trabalhos desenvolvidos entre 1988 e 2009, de A família à Mulher cão.

Desde 28 de Fevereiro e até 27 de Agosto, cinco obras de Paula Rego figuram na exposição colectiva All Too Human - Bacon, Freud and a Century of Painting Life, no museu Tate Britain, em Londres. A mostra reúne cerca de cem obras de 22 pintores, entre os quais alguns dos mais célebres artistas britânicos modernos, com destaque para Lucian Freud e Francis Bacon, mas também Walter Sickert, Stanley Spencer, Michael Andrews, Frank Auerbach, Francis Newton Souza ou Leon Kossoff.

Paula Rego vive e trabalha em Londres, para onde se mudou com 17 anos, para estudar na Slade School of Fine Art. Em 2004, foi condecorada com a Grã-Cruz da Ordem de Sant'Iago da Espada. E em 2010, foi distinguida pela rainha Isabel II com o grau de Oficial da Ordem do Império Britânico, pela sua contribuição para as artes.