Morreu John Sulston, um dos autores do projecto do genoma humano
Cientista britânico venceu prémio Nobel da Medicina em 2002 por descobertas sobre a regulação genética do desenvolvimento dos órgãos e da morte celular programada. Morreu esta sexta-feira aos 75 anos.
O cientista britânico John Sulston destacou-se como um dos pioneiros na área da genética, liderando no Reino Unido o projecto internacional do genoma humano. Foi fundador e director do reputado Instituto Wellcome Sanger, em Cambridge, e em 2002 ganhou o Prémio Nobel da Fisiologia ou Medicina com as suas descobertas que permitiram identificar os genes-chave que regulam o desenvolvimento dos órgãos e o chamado “suicídio celular”. Acreditava, acima de tudo, na partilha do conhecimento. Morreu esta sexta-feira aos 75 anos.
O Instituto Wellcome Sanger confirmou oficialmente a morte de John Sulston, dedicando-lhe um destaque na página oficial do site. Um “gigante da genética”, refere-se, homenageando o cientista que “liderou um período histórico de descoberta” e que coordenou no Reino Unido o Projecto do Genoma Humano. “Ao longo da sua carreira, Sir John empurrou fronteiras científicas e acreditou fortemente que a ciência é um bem público. A sua visão de longo alcance na genética significa que deixa um campo global firmemente fundado nos princípios de acesso aberto e uma geração de cientistas influenciada pelas suas acções e valores”, frisa o comunicado do Instituto Wellcome Sanger.
Em 2002, o trabalho de John Sulston com um verme chamado Caenorhabditis elegans, vulgarmente conhecido como C. elegans, valeu-lhe o Prémio Nobel da Medicina, partilhado com o britânico Sydney Brenner e o norte-americano Robert Horvitz que também participaram na descoberta. O estudo pioneiro sobre este minúsculo modelo experimental actualmente muito usado pelos cientistas permitiu identificar os mecanismos genéticos que controlam a divisão celular e, assim, determinam o desenvolvimento dos órgãos no embrião e também a destruição programada das células. Os resultados do trabalho revelaram-se determinantes para compreender várias doenças, sobretudo neurológicas.
Nascido a 27 de Março de 1942, John Sulston revelou numa entrevista ao jornal The Guardian que desde jovem era fascinado por perceber como as coisas funcionavam, desde brinquedos a pequenos animais. Fosse um pequeno aparelho de rádio ou uma ave, que aproveitava para dissecar. “Percebi que os organismos vivos eram mecanismos”, contou na entrevista, em 2002.
As reacções à morte de John Sulston falam do “cientista brilhante” mas também do encantador homem de princípios. “John era um cientista brilhante e um homem maravilhoso, gentil e de princípios. A sua liderança foi fundamental para o estabelecimento do Instituto Wellcome Sanger e do Projecto Genoma Humano, um dos empreendimentos científicos mais importantes do século passado”, disse Jeremy Farrar, director do Wellcome Trust.
Em 2001, depois de algumas guerras, foi publicada a sequência de três mil milhões de pares de bases químicas que compõem o genoma humano. O imenso livro da vida humana. John Sulston escreveu um livro (The Common Thread) com um relato pessoal do projecto internacional onde atacava os cientistas e as empresas que exploram comercialmente as suas descobertas.
“Nunca o conheci pessoalmente mas ele fez coisas extraordinárias. Foi ele o responsável pela sequenciação do ‘C. elegans’ que ainda hoje é extremamente útil, sobretudo no estudo das doenças neurológicas. Também foi ele que descobriu um modo de conservar estes organismos, refrigerados, hibernados, o que se revelou muito importante”, diz ao PÚBLICO o geneticista Jorge Sequeiros, do Institito de Investigação e Inovação em Saúde (I3S), no Porto. Mas, além do seu papel na genética do desenvolvimento, o investigador português sublinha o facto de John Sulston ter sido um dos maiores defensores da partilha de conhecimento. “Ele considerava que a propriedade intelectual era uma ameaça ao avanço da ciência. Acreditava que o conhecimento devia ser património de todos e sempre defendeu a propriedade pública dos dados do genoma humano.”
Mike Stratton, director do Instituto Wellcome Sanger, escreve no site da instituição: “Todos sentimos hoje a perda de um grande visionário científico e líder que fez contribuições históricas, deixa marcos sobre o conhecimento do mundo vivo e estabeleceu uma missão e agenda que define a ciência do século XXI.”