Temas em debate: do “não ao aborto” ao militante digital
O congresso do próximo fim-de-semana abre o debate de oito moções de estratégia global, entre as quais a de Assunção Cristas que quer afirmar o CDS como a primeira escolha.
Num congresso de dois dias, o CDS vai discutir oito moções globais – entre as quais a de Assunção Cristas – e outras tantas sectoriais. Nas propostas globais – cujos primeiros subscritores podem, em tese, assumir-se como candidatos à liderança do partido – os temas vão desde a vida e família à orientação do partido face ao PSD, passando pela organização interna do CDS ou pelas propostas de políticas para a economia e para o interior. À excepção da moção da líder do partido, que remete a questão da matriz do partido para a proposta levada ao congresso anterior, todas assumem e sublinham os valores democratas-cristãos. Só a moção de Assunção Cristas deverá ir a votos.
Não a aborto e eutanásia
Tanto a moção da Tendência Esperança em Movimento (TEM), corrente interna do partido, como a de Pedro Borges de Lemos assumem ser contra o aborto e defendem a revogação da legislação em vigor. Com uma marca democrata-cristã e conservadora, a moção da TEM defende ainda a revogação da legislação que permite o casamento entre pessoas do mesmo sexo e a co-adopção e da lei que regula a união de facto. A TEM aponta ainda a separação de casais como um problema da sociedade de hoje e gostaria de “restringir” o divórcio por decisão “unilateral de um dos cônjuges”. Borges de Lemos, advogado, assume ser contra a eutanásia (tal como a TEM) e recusa qualquer referendo sobre o assunto, por considerar que a “vida não se referenda, a vida defende-se intransigentemente”.
O que fazer face ao PSD?
É na moção da Juventude Popular (JP) que está plasmada de forma mais dura a posição contra o “centrão” e o momento que se vive de aproximação entre o PSD e o PS. “A equidistância dos pólos, própria dos que apregoam ‘vender a alma ao diabo’ a preço de saldo, mais não é do que do que defender, no domínio das ideologias e do pragmatismo, tudo ao mesmo tempo, o mundo e o seu contrário, no fim de contas, não advogar rigorosamente nada digno de credibilidade”, lê-se no texto da JP liderada por Francisco Rodrigues dos Santos. O líder dos "jotas" defende que “o CDS-PP não nasceu para ser mordomo, satélite, muleta ou subalterno de nenhum outro partido político” e que “tem dignidade autónoma e potencial para aspirar mais, com responsabilidade, capacitando-se dos instrumentos, metodologias e intérpretes certos”. Neste texto, o CDS deve assumir-se de “direita”. Já na moção da líder do CDS o partido é posicionado como de centro-direita. Com uma posição de afirmação interna – quando defende as listas próprias nas europeias e legislativas –, a líder do partido quer retirar os rótulos do CDS para que este não seja visto como o partido “dos ricos, dos patrões ou dos quadros”, mas o partido de “todos”. A independência e autonomia face ao PSD são também valorizadas na moção de Pedro Borges de Lemos. “O CDS-PP tem de ser capaz de liderar todo o espaço do centro-direita em Portugal, tornando a direita num espaço plural, como acontece hoje com a esquerda, e disputando eleitoralmente esse espaço com o PSD. Para isso o CDS-PP tem de ser autónomo e independente do PSD”, lê-se na moção que não esquece que os sociais-democratas se recusaram a apoiar a candidatura liderada por Cristas à Câmara de Lisboa.
Militante digital
A abertura do partido a simpatizantes é referida em pelo menos duas moções, a da distrital de Lisboa e a de José Lino Ramos, membro da comissão política nacional. Depois de um resultado histórico do CDS em Lisboa nas autárquicas, a distrital propõe um modelo de funcionamento interno para fazer crescer a implantação no país. Não só através de um reforço da estrutura dirigente mas também a criação da figura do “militante digital”, o "e-militante", que teria acesso a espaços digitais criados para apresentar, debater e votar propostas ao conselho nacional. A distrital de Lisboa, liderada pelo vereador João Pereira Gonçalves, propõe ainda a possibilidade de voto aos 16 anos para as eleições autárquicas. Outras moções defendem também uma maior participação interna na escolha dos candidatos a órgãos políticos. Lino Ramos entende que chegou o momento de os militantes das estruturas locais “escolherem directamente os seus candidatos às autarquias, ao Parlamento e aos vários níveis de representação política”. O ex-secretário-geral do CDS assume ainda a necessidade de a liderança e a estratégia serem “objecto de um amplo debate que envolva todos, mesmo os simpatizantes”, antes de ser “sufragada pelo voto universal e directo de todos os militantes”.
Círculos uninominais e menos deputados
A TEM defende a criação de um sistema misto com círculos uninominais, complementado com um círculo nacional de compensação, para as eleições legislativas. Esta proposta “valorizaria os votos depositados nos círculos do interior, onde se elegem menos deputados, face àqueles que são eleitos pelos círculos do litoral”, de acordo com o texto. É ainda proposta a realização de primárias directas entre os militantes para a escolha dos candidatos do CDS. A moção da Federação dos Trabalhadores Democratas-Cristãos (FTDC) propõe a redução do número de deputados na Assembleia da República e uma restrição da representação partidária, para permitir a abertura de candidatos da sociedade civil.
Políticas para o interior
O abandono do interior é um dos temas dominantes da moção de José Lino Ramos. O ex-secretário geral propõe estímulos fiscais para fixar populações no interior bem como outras apostas na saúde, no ensino, na justiça e nos serviços públicos, bem como uma política de promoção de natalidade. Miguel Mattos Chaves, vice-presidente da distrital de Coimbra, também identifica como um dos problemas do interior a “retirada de empregos públicos” em instituições como a CGD, os CTT, centros de saúde ou delegações regionais, defendendo o restabelecimento desses serviços.