Tribunal de Contas rejeita recurso da câmara de Lisboa sobre ajustes directos para limpeza de graffitis
O mesmo tribunal já tinha recusado o visto aos três contratos, por considerar que não se está na presença de "circunstâncias imprevisíveis", que sustentam o procedimento de ajuste directo.
O Tribunal de Contas rejeitou o recurso apresentado pela Câmara Municipal de Lisboa sobre a adjudicação de três contratos, através de ajuste directo, para a prestação de serviços de remoção de graffitis na cidade.
Em Julho do ano passado, a autarquia, por despacho do vice-presidente, Duarte Cordeiro, autorizou a celebração de três contratos para a “aquisição de serviços de remoção de graffiti e cartazes, protecção das superfícies tratadas e manutenção das mesmas”, em diferentes áreas da cidade de Lisboa, num total de cerca de 425 mil euros.
Os contratos, com um prazo máximo de seis meses, foram celebrados entre o município e a CleanGraf, Ldª, pelo preço contratual de 91.357,90 euros, à Tecnograffiti – Tecnologias de Remoção de Graffitis, Ldª, por 221.201,82 euros, e à Fraterna – Engenharia, Consultoria e Construção, Ldª, por 112.636,38 euros.
A 31 de Outubro, o mesmo tribunal recusou o visto aos três contratos, por considerar que não estavam reunidos os fundamentos que sustentam o procedimento de ajuste directo. A câmara de Lisboa decidiu depois recorrer da decisão, argumentando que “este fenómeno dos graffitis tem subjacente dinâmicas sociais complexas, actualmente objecto de sancionamento penal, por revestir o crime de dano qualificado previsto e punido” e por se revelar “gravemente lesivo para o património edificado da cidade onde é executado, impondo uma intervenção efectiva e imediata por parte dos serviços [do município]”.
“Um hiato ou maior demora na limpeza e remoção, propicia e estimula o aumento da produção de graffitis, conduzindo inevitavelmente a maiores danos no património edificado, nomeadamente nas superfícies afectadas, resultando na necessidade de intervenções de fundo, aumentando os seus custos, que obviamente serão minimizados com intervenções atempadas”, advogou a câmara.
Ora o tribunal tem outro entendimento, ao salvaguardar que o pressuposto da “urgência imperiosa”, invocado pelo município para justificar o recurso ao ajuste directo, não se aplica neste caso.
No acórdão, datado de 29 de Janeiro e que ainda não transitou em julgado, os juízes conselheiros Fernando Oliveira Silva (relator), Paulo Dá Mesquita e Mário Serrano, que o assinam, admitem que “a densificação do conceito de 'urgência imperiosa', previsto no referido normativo legal, não deve ser feita no plano da mera subjectividade própria da entidade que o aplica, pois dessa forma a invocação da urgência – que assume carácter excepcional – poderia tornar-se fundamento para qualquer aquisição que não fosse atempadamente planeada, ainda que a sua necessidade fosse há muito conhecida”.
Os juízes observam ainda que “tem sido abundante a jurisprudência do Tribunal de Contas sobre este mesmo tema, precisamente porque existe uma tendência natural das entidades adjudicantes para se socorrerem deste fundamento excepcional da 'urgência imperiosa', com o fito de adoptar o ajuste directo, em vez de procedimentos de natureza concursal, sem que os factos em presença o justifiquem”. Assim, concluem, o recurso ao ajuste directo, pelo município de Lisboa, invocando a urgência imperiosa, “foi feito sem que estejamos em presença de circunstâncias imprevisíveis, mas tão só perante um problema sistémico ou recorrente”.
Críticas antigas
Em Abril de 2016, o executivo municipal autorizou o início de um concurso público com publicidade internacional para a “aquisição de serviços de remoção de graffiti e cartazes”. Na altura, a autarquia previa gastar 4,2 milhões de euros nesse serviço, por um período de três anos, e outros 719 mil euros na aquisição de “serviços de fiscalização aos serviços prestados pelas empresas contratadas para a remoção”. Na Assembleia Municipal de Lisboa foram várias as vozes contra estas contratações, assim como a entrega da fiscalização da limpeza de graffitis a um privado.
No entanto, o concurso acabou por ter sido objecto de impugnação judicial, estando o município privado da possibilidade de contratar ao abrigo deste procedimento e “logo sujeito ao perigo dos acontecimentos imprevisíveis desta natureza”. Este é, aliás, outros dos argumentos apontados pela câmara de Lisboa para justificar o recurso ao ajuste directo.