Redes sociais “não podem ser usadas impunemente”

A experiência de vários casos laborais já julgados em tribunais portugueses mostra que “as redes sociais não são um espaço sem lei ou castigo”.

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Nélson Garrido (arquivo)

“Não podemos usar impunemente as redes sociais em contexto de trabalho. Tem de ter consequências”, defende o advogado Duarte Abrunhosa e Sousa, investigador do Centro de Investigação Jurídico-Económica da Faculdade de Direito da Universidade do Porto. Não se pode colocar nas redes sociais o que se quer sem haver responsabilização porque, alerta, “não há diferença entre falar publicamente num espaço com meia centena de pessoas ou escrever um post no Facebook para todos os amigos”.

Estas foram algumas das conclusões a que Duarte Abrunhosa e Sousa chegou na sua investigação, feita a partir de acórdãos judiciais, sobre o impacto das redes sociais no mundo do trabalho em Portugal. O também consultor de uma grande empresa nacional apoiou-se em quatro acórdãos relacionados com acções de impugnação judicial de despedimentos julgadas nos tribunais da Relação do Porto, Lisboa, Évora e Guimarães. No caso da decisão da Relação do Porto, de 2014, por exemplo, é referido que “o recurso ao Facebook para insultar o empregador não tem associada uma expectativa de privacidade”. O patrão alegava que o despedimento era lícito, porque o trabalhador tinha publicado posts num grupo do Facebook comentando a organização e vida interna da empresa onde trabalhava.

Também um acórdão da Relação de Lisboa, do mesmo ano, concluiu que a comunicação do funcionário em questão “saiu da esfera privada e entrou na pública” quando apelou à partilha da sua publicação com conteúdo ofensivo e difamatório no Facebook.

Duarte Abrunhosa e Sousa analisou ainda a decisão do Tribunal da Relação de Évora, de 30 de Janeiro de 2014, que considerou ser uma violação grave a divulgação difamatória, por parte de um trabalhador, de mensagens no Facebook que “feriam a honra e o bom-nome do legal representante da entidade patronal e demais membros da mesa administrativa”, dando por isso razão ao seu despedimento por justa causa.

Já o acórdão da Relação de Guimarães relativo a um trabalhador que foi despedido apenas por usar o Facebook durante o seu horário normal de trabalho considerou essa sanção desproporcional. “O uso abusivo da rede social durante o horário de trabalho pode ser motivo de sanção. Mas só se o trabalhador reincidir é que lhe será aplicado outro procedimento disciplinar”, resume o advogado Pedro Sousa Lobo.

Também a investigadora Maria Regina Rendinha se apoia em vários acórdãos que reconhecem que “as redes sociais não são um espaço sem lei ou castigo”. E refere que “a sensibilização para as implicações jurídico-laborais das redes sociais começa a evidenciar-se também na jurisprudência”.

Há ainda situações em que uma empresa pode ter graves prejuízos. Foi o caso de uma empresa municipal, que viu conteúdos que colocava na página de Facebook serem retirados por um colaborador que tinha dispensado mas que continuava a ter privilégios de administrador na conta da empresa na rede social. “Apresentámos queixa-crime pelos crimes de sabotagem e dano informático, e acesso ilegítimo”, contou o advogado Miguel Marques Oliveira, que acompanhou este processo.

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