Os defensores do Tejo falam cada vez mais alto
Plataforma alberga 40 instituições e actua sem qualquer financiamento. Este ano, com os problemas do rio agravados devido à seca, os activistas ganharam visibilidade e força.
Já existe há sete anos, mas foi em 2017 que ganhou visibilidade. Por más razões. A seca e a consequente descida do caudal do Tejo trouxeram à vista de todos a poluição que é descarregada no rio. Em alguns troços, as águas ficaram pretas, cobertas de espuma e, em Outubro e Novembro, os peixes morreram aos milhares. Os membros do Movimento Pelo Tejo — proTejo tomaram a primeira linha de defesa do rio. Fizeram manifestações, denúncias, alertaram políticos e populações e passaram a ser uma voz frequente nos órgãos de comunicação social.
Estão ainda unidos aos que defendem o rio do lado espanhol, criando uma rede ibérica que “vigia e luta em defesa do Tejo e dos seus caudais” desde que ele nasce na serra de Albarracín, em Aragão, até que desagua no Atlântico logo que passa Lisboa.
Nos últimos dias, o nome da proTejo voltou à ribalta informativa devido ao processo judicial que a Celtejo, empresa de celulose de Vila Velha de Ródão, colocou ao secretário da mesa do conselho deliberativo da plataforma, Arlindo Marques, conhecido como o “guardião do Tejo”.
Este activista faz denúncias frequentes de focos de poluição do rio, alguns apontados à Celtejo. A empresa diz que o seu “bom-nome foi colocado em causa” e pede uma indemnização de 250 mil euros. A proTejo promete todo o apoio a Arlindo Marques e vai avançar com uma recolha de fundos para pagar as custas judiciais da defesa.
A proTejo não é uma associação individual de defesa ambiental, ou cívica. É uma plataforma-chapéu de 40 entidades, que reúne ecologistas, ambientalistas, movimentos sociais, desportivos e culturais, agentes de desenvolvimento regional, empresas e autarquias. O objectivo central é apenas um: o “desenvolvimento de acções de mobilização na defesa e promoção da bacia hidrográfica do Tejo (rio e o seus afluentes)”.
A plataforma tem outra característica que a diferencia de muitas outras: não tem qualquer tipo de financiamento, público ou privado, sendo as despesas assumidas por cada um dos membros ou pelas diversas instituições que a formam. Esta opção foi assumida desde a fundação deste movimento de cidadania sem personalidade jurídica, a 5 de Setembro de 2009. “Os financiamentos criam muitas complicações, até, por vezes, dependências e processos burocráticos complicados. Assim é tudo mais ágil”, diz Paulo Constantino, um dos dois porta-vozes da proTejo e o seu fundador.
“Se somos chamados para uma iniciativa, um colóquio ou uma entrevista, quem vai paga do seu bolso a gasolina, por exemplo. Se organizamos um debate ou uma sessão de esclarecimento, pedimos um espaço a uma das câmaras associadas. Se for uma manifestação, pedimos autocarros às autarquias para transportar as populações e cada associado leva a sua faixa ou cartaz”, explica o porta-voz.
O activista reconhece que 2017 foi o ano da grande projecção da plataforma. “Embora já tenhamos actividade há cerca de sete anos, este ano, infelizmente devido à desgraça em que está o Tejo, fomos mais chamados a intervir e a falar para os órgãos de comunicação social”, afirma. “Dantes as pessoas chamavam mais a associação A ou B, mas agora sabem que há uma plataforma que representa todos, que está activa, unida e faz um trabalho sério de defesa do rio.”
Esta maior visibilidade trouxe, porém, um problema: mais despesa para os seus membros. Um problema que tentam atenuar dividindo mais as tarefas de intervenção por mais elementos. “Como temos membros ao longo de todo o rio, quando somos chamados a algum lugar tentamos que vá o que está mais perto. Sempre dá para poupar um pouco.”
Estrutura ibérica
O interesse deste economista da Inspecção-Geral de Finanças, de 47 anos, natural de Vila Nova da Barquinha, começou no início de 2009. A dificuldade em bombear a água do Tejo para o canal do parque ribeirinho de Vila Nova da Barquinha devido ao escasso caudal do Tejo despertou-o.
Começou a participar em diversas iniciativas, foi conhecendo activistas portugueses e espanhóis, começou a “estudar o rio e os seus problemas”, enquanto ia “crescendo a ideia de criar uma plataforma que os unisse a todos”, como a que já existia em Espanha, em defesa dos rios Tejo e Alberche, cujos dirigentes conheceu numa das iniciativas em que esteve presente.
Depois de vários contactos, a proTejo nasceu em Setembro de 2009, logo com a adesão de 20 entidades, entre as quais oito câmaras municipais e a Comunidade Intermunicipal do Médio Tejo. Hoje são 40 entidades. Logo a seguir, foram contactadas plataformas espanholas de defesa do Tejo e passou a integrar, juntamente com mais 47 instituições espanholas, a rede de Cidadania por uma Nova Cultura da Água do Tejo/Tajo e seus Afluentes.
Nem presidente, nem direcção
A proTejo não tem presidente nem direcção. Tem dois porta-vozes, Paulo Constantino e José Moura, eleitos pelos associados de dois em dois anos, que funcionam como uma espécie de coordenadores e de primeira linha de contacto. As decisões e a estratégia da plataforma são, porém, tomadas pelo colectivo das entidades que a formam, nas reuniões da Assembleia Deliberativa, que acontecem duas vezes por ano. Entre estes encontros realizam-se ainda reuniões de trabalho que podem ser propostas por qualquer um dos associados. “Só este ano, devido à crise que o rio viveu realizaram-se mais de dez reuniões de trabalho”, revela Paulo Constantino.
Para 2018, além de continuar a lutar contra a sobreexploração do Tejo e pela mobilização dos cidadãos para defesa do rio, a proTejo tem dois objectivos principais: a realização de uma conferência ibérica para debater o acordo luso-espanhol de gestão da água do rio (Convenção de Albufeira) e a sua revisão e a realização da 6.ª edição da Vogar Contra a Indiferença, um passeio pelo Tejo aberto a embarcações de “amigos do rio” de Portugal e Espanha.
Tudo tendo como lema uma canção de Jorge Palma que inspira a plataforma desde a sua fundação: “Enquanto houver estrada para andar, a gente vai continuar/Enquanto houver ventos e mar, a gente não vai parar.”