Ministro pede aos juízes mão pesada para crimes ambientais
Matos Fernandes diz que magistrados ainda revelam pouca sensibilidade para crimes ambientais. Ainda assim, valor das multas disparou desde 2015. Transferência de água entre barragens deve mesmo avançar.
O número de inspecções e fiscalizações tem vindo a subir de forma muito significativa nos últimos dois anos, mas isso não está a ter reflexo nas decisões judiciais tomadas sobre crimes ambientais. O ministro do Ambiente pede ao poder judicial “mais sensibilidade” para este tipo de crimes. Multas de 30 mil euros não devem ser trocadas, após recurso, “por donativos de 500 euros para os bombeiros voluntários locais”.
Nesta quarta-feira, dia em que foram revelados os números de fiscalizações e inspecções ambientais e respectivas coimas aplicadas, com aumentos muito significativos, João Pedro Matos Fernandes disse ao PÚBLICO que a questão que se coloca agora é “no domínio do cumprimento destas medidas”.
O ministério do Ambiente tem já em curso uma campanha de sensibilização junto da Procuradoria-Geral da República, que tem como objectivo alertar para as consequências da violação dos valores ambientais, mas Matos Fernandes diz que “essas consequências não são devidamente percepcionadas pelo poder judicial”.
“No que diz respeito às sentenças judiciais, estamos ainda muito longe daquilo que sentimos ser a necessidade de proteger os bens ambientais. São muitas as multas de 40 mil euros que são confirmadas — temos um grau de confirmação de sentença judicial de cerca de 80% das nossas propostas — só que os 40 mil, 45 mil euros de multa são transformados pelos tribunais, após recurso, em 1500 euros, ou os 30 mil euros são transformados em dar 500 euros para os bombeiros voluntários locais”, afirma o ministro do Ambiente, que será ouvido nesta quinta-feira na Comissão Parlamentar de Ambiente, Ordenamento do Território, Descentralização, Poder Local e Habitação.
O governante descarta a possibilidade de aumentar as multas aos poluidores, colocando mais a questão “do lado de cumprir os valores das coimas aplicadas”. Segundo Matos Fernandes, esta situação acaba por “beneficiar os grandes poluidores, porque são os que têm maior capacidade financeira para poderem recorrer das sanções inicialmente aplicadas”.
Valor das multas triplica
Os números nesta quarta-feira divulgados pelo inspector-geral do Ambiente revelam valores muito significativos, com as multas aplicadas aos poluidores em Portugal a aumentarem 185% — passando de pouco mais de 4,5 milhões de euros em 2015 para mais de 12,8 milhões este ano.
Segundo números ainda provisórios relativamente a este ano, o montante das multas tem vindo sempre a subir. Este facto fica, em boa parte, a dever-se ao também significativo aumento das acções de fiscalização e inspecção levadas a cabo pela Inspecção-Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território (IGAMAOT), órgão de polícia criminal ambiental.
Em 2015, realizaram-se 638 acções de fiscalização, esse número subiu para 705 em 2016 e este ano realizaram-se já 1351. Entre 2015 e 2017 o aumento foi de 112%.
Cerca de metade destas acções de fiscalização e inspecção ambiental foram realizadas na bacia hidrográfica do Tejo – 228 em 2016 e 688 este ano.
Igualmente importante foi o aumento do número de processos de contra-ordenação, que subiram de 935, em 2015, para 1634, este ano.
Matos Fernandes justifica estes números com mais e novos meios ao dispor dos inspectores, nomeadamente o uso de drones, o que alarga de forma significativa a área inspeccionada, e com "um conjunto de medidas preventivas das fiscalizações que são feitas”. “Não me gabo do que vou dizer, mas pela primeira, em 2017, foi detido um empresário por poluir. Nunca tinha acontecido e é muito interessante saber que, uma semana depois da detenção, aquela empresa estava ligada à rede de esgoto que conduz os esgotos para uma ETAR industrial”, afirma.
O governante diz compreender “que se fale essencialmente na poluição industrial”, revela, porém, que “85% da carga orgânica que existe no Tejo vem das águas residuais urbanas e só 6% vem das grandes indústrias”.
“Nas grandes indústrias é mais localizado, mais evidente e chama mais à atenção, mas é preciso fazer um esforço enorme no domínio do tratamento das águas residuais urbanas.
Matos Fernandes lembra que no que respeita à qualidade da água no Tejo houve, nos últimos dois anos, “um aumento muito expressivo” das análises à água, “passando-se de quatro postos de amostragem para 14”. Estas análises são feitas com uma periocidade mensal, mas, desde Setembro, nas duas maiores barragens do rio (Belver e Fratel), essa análise à qualidade da água é feita de dois em dois dias.
Barragens: transferência de água deve avançar
O plano para 2018 do ministério do Ambiente “será muito focado na poluição hídrica e dos resíduos", mas há uma matéria com a qual o Governo parece cada vez mais determinado em avançar: a transferência de água entre as albufeiras das barragens.
“Faz mesmo sentido reforçar as ligações entre sistemas. Se nós tivéssemos uma ligação Entre [a barragem] Balsemão, que está a cerca de mil metros de altitude, em Lemego, e Viseu, não tínhamos tido este problema [do transporte de água em autotanques] porque não faltou água na albufeira de Balsemão, que encheu num instante assim que começou a chover. Essas interligações estão mesmo a ser avaliadas”, assegura o governante.
Matos Fernandes enumera vários locais entre os quais pode haver transvases de água e, pelas suas palavras, a intenção de avançar nesta matéria, parece mais adiantada do que uma mera fase avaliação. “Não existem projectos, estamos de facto a começar a desenhar o que podem ser esses projectos que robustecem bastante a capacidade que temos garantir viabilidade do abastecimento de água às populações. Até Junho conto ter esse desenho feito”, garante.
No que respeita a novas barragens, o ministro diz que nos planos do ministério do Ambiente está apenas prevista “a avaliação da construção de novas barragens de dimensão criteriosa e moderada”.