Morreu Pedro Rolo Duarte, jornalista e cronista pop, mais do que um comunicador

O jornalista, que trabalhou na imprensa, na rádio e na televisão, tinha 53 anos. Era uma "peça vital para se compreender este nosso mundo", "um comunicador", dizem os seus colegas.

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Pedro Rolo Duarte fotografado em 1996 Miguel Silva/Arquivo
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Pedro Rolo Duarte fotografado em 1996 Miguel Silva/Arquivo

Pedro Rolo Duarte, jornalista descrito pelos colegas e admiradores como uma "peça vital para se compreender este nosso mundo", nos seus relatos sobre a cultura popular ou como editor de publicações com espaço para a reportagem e a grande entrevista, era visto como dono de uma "mistura de curiosidade e capacidade de iniciativa" que transmitiu ao jornalismo e seus consumidores. Morreu nesta sexta-feira aos 53 anos. 

O jornalista e radialista estava internado numa unidade de cuidados paliativos, depois de lhe ter sido diagnosticado cancro há mais de um ano. Miguel Esteves Cardoso dedicou-lhe uma crónica na passada terça-feira: "A tua palavra, aquela que aparece quando penso em ti e que, como vês, já não me dou ao trabalho de disfarçar, é muito; a tua palavra é muita, Pedro."

Filho dos jornalistas António Rolo Duarte e Maria João Duarte, nasceu a 16 de Maio de 1964, em Lisboa. Viria a iniciar-se na profissão com 17 anos, num suplemento juvenil do Correio da Manhã.  Era autor dos livros Fumo (2007), Sozinho em Casa (2002), e Noites em Branco (1999).

Rolo Duarte foi jornalista e fundador do jornal O Independente em 1988, onde desempenhou o cargo de editor-adjunto até ao ano seguinte. Esteve entre os fundadores da revista K, em 1990, publicação efémera mas marcante, dirigida por Miguel Esteves Cardoso, e foi também editor do suplemento DNA, publicado no Diário de Notícias entre Novembro de 1996 e Janeiro de 2006. Foi ainda subdirector do mesmo jornal entre 2004 e 2005. Passou pela revista Visão, onde foi editor entre 1992 e 1995, e pelo jornal i. Estreou-se na rádio em 1984, depois de ter aceitado um convite de Rui Pêgo e Henrique Mendes para integrar a equipa da Rádio Renascença. 

O director de programas da RTP, Daniel Deusdado, recorda que no momento do lançamento da RTP3, Pedro Rolo Duarte tinha de fazer parte da grelha. Central Parque era o magazine que co-apresentava com a jornalista e escritora Joana Stichini Vilela, que desde a adolescência tinha Rolo Duarte como “uma figura que fazia parte da vida fazendo o que ele fazia bem — falar de 'comunicador' parece uma palavra oca, mas ele era um comunicador”, recorda ao PÚBLICO.

Stichini Vilela faz parte da audiência que o via no programa Falatório (1996), que lia o suplemento DNA, que admirava a revista (1990). O saber acumulado também no semanário cultural Se7e (1978-1994) perfazia o profissional que a RTP convidou “imediatamente”, diz o director de programas da RTP, “porque há um lado de cultura pop que ele representava melhor do que ninguém. Era fundamental para a antena. Queríamos ter o Pedro sempre do nosso lado porque sentíamos que era uma peça vital para se compreender este nosso mundo, estas últimas décadas no que diz respeito à cultura e à música pop. O seu lugar é insubstituível.”

Em comunicado, o ministro da Cultura, Luís Filipe Castro Mendes, descreve Pedro Rolo Duarte como "um dos mais destacados [jornalistas] da sua geração", destacando que "nunca deixou de manifestar livre e activamente as suas opiniões, acompanhando criticamente as mudanças da sociedade contemporânea e convidando-nos a reflectir e a interrogar o país com apontamentos de ironia, mas também de profunda esperança".

Pedro Rolo Duarte, diz Joana Stichini Vilela, autora de livros sobre Lisboa nas décadas de 1960, 70 e 80 e que se cruzou com Rolo Duarte também no jornal i, onde o jornalista editou a revista semanal Nós, “marcou o que foi o jornalismo dos anos 1990 de forma indissociável”. Recorda-o como “o melhor contador de histórias”. O programa que apresentavam em conjunto foi para o ar entre Outubro de 2015 e o fim de 2016 e, devido à sua doença, não foi retomado. 

Também o jornalista e escritor Carlos Vaz Marques deixou uma palavra em memória de Rolo Duarte, a quem agradece. "Regressei por intermédio dele à imprensa escrita, onde tinha começado. Após anos e anos de dedicação exclusiva à rádio, senti aquele acolhimento como uma espécie de janela que se me abria. Afinal não era só uma janela, era uma porta que, depois dos jornais e revistas, me conduziu também aos livros", lê-se na mensagem partilhada no Facebook.

Ao PÚBLICO, recordando essa importância no seu percurso, quando Rolo Duarte o acolheu no DNA, destaca a relevância do suplemento publicado no Diário de Notícias. "Foi um suplemento que arejou muito em termos culturais a imprensa portuguesa. O DNA marcou uma época e tem lugar na memória colectiva", destaca. "Há muita gente que ainda hoje tem colecções das revistas, e isso é o elogio mais extraordinário que se pode fazer a alguém que trabalhou na imprensa escrita. São páginas impressas que não foram embrulhar peixe no dia seguinte. Ultrapassaram o estatuto de efemeridade".

O jornalista João Gobern confirma o orgulho particular que Pedro Rolo Duarte tinha no DNA, mas ressalva que seria "injusto" sobrevalorizar em demasia o suplemento no contexto de um percurso profissional iniciado aos 17 anos e que, entre imprensa escrita, rádio e televisão, manteve ininterrupto. 

Amigo desde a juventude, mais recentemente parceiro na condução do programa da Antena 1 Hotel Babilónia, recorda como via as ideias fervilharem em Pedro Rolo Duarte. "Não havia mês, não havia semana em que não tivesse um projecto profissional para desenvolver. Tinha tantos que eu, mesmo estando em contacto com ele pelo menos três vezes por semana, só conhecia uma ínfima parte". Lembra também a enorme desilusão que via no amigo quando, instalada a crise na imprensa, se via impossibilitado de concretizar as suas ideias para novas publicações por não encontrar financiamento para tal. "É penoso e é um prejuízo para todos nós que não tenha tido possibilidade de o fazer", lamenta. 

No momento da sua morte, porém, recorda o amigo que conheceu no Verão de 1982, num restaurante da Avenida da Igreja, em Lisboa, onde Pedro Rolo Duarte jantava com os pais. Colegas no Se7e pouco tempo depois, continuariam a encontrar-se profissionalmente ao longo dos 35 anos seguintes.

"A marca que fica dele é a mistura de curiosidade e capacidade de iniciativa. A certa altura nós brincávamos e chamávamos-lhe 'especialista de generalidades'", conta, forma de reforçar o gosto de Pedro Rolo Duarte pela descoberta e aprofundamento das áreas mais diversas. Para o ilustrar, recorda que levava ao programa Mais Novos Do Que Nunca, que mantinha na Antena 3, "pessoas não necessariamente do campo artístico, mas também ligadas às ciências, às viagens, à espiritualidade". 

"Apesar de gostar de entrevistar e conversar com consagrados", diz João Gobern, "acho que aquilo que o motivava mesmo era a descoberta de novos nomes". Tanto os "mais novos que nunca" que até tão recentemente levava à rádio, como os muitos em cujo talento confiou e a que deu destaque nas publicações a que o seu nome ficou ligado ao longo dos anos. 

“O Pedro Rolo Duarte era um dos melhores e, sina destes tristes dias, estamos a perder os melhores”, escreveu o ex-director de informação da RTP Nuno Santos, na sua página de Facebook. 

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