Decisão sobre reactivação do Instituto da Droga adiada para 2018
Grupo de trabalho nomeado pelo Governo reconheceu que o actual modelo não funciona mas os seus membros não chegaram a acordo sobre o caminho a seguir. O secretário de Estado diz que vai avaliar custo-benefício das diferentes propostas.
O Governo parece querer continuar a marcar passo na decisão sobre o novo modelo organizacional para a intervenção no campo dos comportamentos aditivos. “Numa área em que somos um exemplo em termos internacionais, as medidas que este Governo venha a tomar devem ser o mais fundamentadas possível para termos a certeza que vão melhorar a realidade actual”, justificou o secretário de Estado Adjunto da Saúde, Fernando Araújo, anteontem, no Parlamento.
Na resposta às interpelações das deputadas Elza Pais (PS) e Carla Cruz (PCP), ambas sustentadas nos ecos que lhes chegaram sobre a degradação dos serviços, o secretário de Estado disse que conta ter, até ao final do ano, as propostas em cima da sua secretária. “A partir daí espero que possamos tomar decisões bem fundamentadas”, acrescentou, adiantando que o Governo já pediu a avaliação do custo-benefício das várias alternativas postas em cima da mesa, além de ter pedido à Comissão Parlamentar de Saúde que promova, entre outras, a audição de autarquias, sindicatos, ordens profissionais e organizações não-governamentais.
No final de Novembro, recorde-se, expira o novo prazo dado pelo Governo ao grupo de trabalho que, em Fevereiro, foi criado para avaliar o problema. E cujo primeiro relatório, apresentado em Junho, foi inconclusivo, basicamente porque os diferentes sectores com assento no grupo (do coordenador nacional para os problemas da droga, João Goulão, ao director do Programa Nacional para a Saúde Mental, Álvaro de Carvalho, e aos representantes das cinco administrações regionais de saúde, entre outros) divergem na interpretação do melhor caminho a seguir: a reactivação do ex-Instituto da Droga e da Toxicodependência - ou criação de um novo organismo dotado de igual autonomia, para o que poderia bastar o reforço das competências do actual Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências (SICAD) - ou o aprofundamento da integração nas ARS dos serviços de resposta ao problema das drogas.
"Entropias na comunicação"
Quanto à situação actual, todos concordam: é má. “A intenção de reforma que presidiu à mudança de 2012 não foi, até à data, plenamente alcançada, persistindo diferentes tipos de dificuldades”, diagnosticam, apontando entropias na comunicação entre os diversos interlocutores.
E, ressalvando que é impossível medir a que ponto o recrudescimento dos consumos aditivos dos últimos anos resultou directamente da extinção do IDT ou das dificuldades orçamentais decorrentes da crise económica e social, a cujos efeitos os consumidores de substâncias “são particularmente sensíveis”, o grupo de trabalho aponta ainda a ausência de autonomia das estruturas regionais e processos de decisão “morosos, com risco para a eficácia das intervenções”.
A carência de recursos humanos e materiais, a ineficiência no processo de licenciamento de unidades privadas (que saltou para as ARS) e as dificuldades na integração das respostas aos comportamentos aditivos nos serviços nacionais de saúde são outros dos “pontos fracos” identificados, embrulhados numa ameaça de crescente “indefinição organizacional” e pela “insatisfação e desmotivação” generalizadas face a uma mudança que “apesar de planeada, acabou por se constituir como uma imposição”.
A necessidade de reforçar a intervenção terapêutica junto dos consumidores e de garantir a equidade de tratamento no território nacional é algo com que todos concordam também. No que os membros do Grupo de Trabalho não concordam é no fundamental da tarefa que lhes foi pedida: há ou não vantagem na reconstituição de um organismo com as funções e estrutura do extinto IDT?
Para os representantes do Conselho Nacional de Saúde Mental a resposta é não. Estes defendem a manutenção das actuais competências do SICAD e das diferentes estruturas regionais e propõem que as unidades de desintoxicação sejam integradas em estrutura hospitalar. E, ao mesmo tempo, propõem-se “absorver” na rede nacional de cuidados integrados em saúde mental as comunidades terapêuticas.
Já a proposta do SICAD, que vai ao encontro das reivindicações dos profissionais que trabalham na área, é radicalmente diferente e igualmente clara: “Urge recuperar a unicidade demonstrada pelo anterior dispositivo de respostas” que contribuiu para o sucesso nacional e internacional do modelo português.
Equivale isto a dizer que o SICAD deverá recuperar competências no tratamento das toxicodependências, no licenciamento das unidades de prestação de cuidados nesta área e no estabelecimento de contratos de convenção com privados. Nesse sentido, defende o serviço tutelado por João Goulão, todas as unidades de intervenção local e os profissionais que nelas trabalham devem voltar para a alçada do SICAD. Este serviço reforçado absorveria igualmente as instalações, os equipamentos e os orçamentos atribuídos às ARS para o tratamento dos utentes.