Entrevista de Costa vista em Belém como mais uma oportunidade perdida

Não houve novidades, não houve medidas concretas nem sentimento, consideram sectores próximos do Presidente. Primeiro-ministro falhou a reconstrução da sua imagem junto dos portugueses.

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Rui Gaudêncio

entrevista de António Costa à TVI foi vista por sectores próximos do Presidente da República como mais uma oportunidade perdida para reconstruir a sua imagem junto dos portugueses.

Se o tom até foi considerado simpático para com Marcelo Rebelo de Sousa, entende-se que continua a faltar a ligação com os portugueses e a demonstração de que o primeiro-ministro realmente percebeu o que aconteceu. Em Belém considera-se que a ausência de novidades, de sentimento nem de medidas concretas, para além do catálogo do que é preciso ser feito, não ajudou a recuperar a confiança pública.

Uma visão que acabou por ser confirmada pelo próprio Presidente da República na segunda-feira de manhã, à margem do XX Seminário Nacional do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida. "Neste momento em que todos já reconhecemos erros e fracassos" na gestão dos incêndios, sublinhou o chefe de Estado, o tempo é de "arregaçar as mangas e trabalhar".

Questionado sobre se concordava com António Costa em relação à necessidade de retomar das relações institucionais com o primeiro-ministro, Marcelo insistiu que o que é preciso não é isso, mas “recolar aos portugueses em termos de facto”. "A solidariedade institucional é mais do que franqueza, lealdade, informação, colaboração, entre níveis diferentes de poder e com responsabilidades diferentes. É até mais do que empatia ou amizade. Tudo isso existe, existiu e vai existir, mas a solidariedade institucional é, sobretudo, um compromisso com os portugueses", defendeu, citado pela Lusa.

“A solidariedade institucional só cumpre a sua missão se não se descolar dos portugueses”, insistiu.

De Belém, o PÚBLICO ouviu ainda outras críticas à entrevista, como o cenário escolhido, não por ser o quartel dos Bombeiros da Pampilhosa da Serra, uma das localidades mais afectadas pelos incêndios de Outubro, mas pelo ambiente kitsh criado com machados, capacetes e mangueiras à volta, que acabaram por distrair o telespectador. Mas sobretudo pelo facto de o primeiro-ministro não ter aproveitado a oportunidade para dirigir uma palavra de compreensão e agradecimento sobre o papel dos bombeiros nestas tragédias.

Ainda para mais, tendo a entrevista acontecido horas depois de uma ameaça do recém-reeleito presidente da Liga dos Bombeiros Portugueses, Jaime Marta Soares, de que os voluntários podiam ir para “a rua” se não forem “respeitados”. Foi no encerramento do 43.º Congresso da LBP, em Fafe, em que o primeiro-ministro interveio depois de Jaime Soares ter afirmado que os bombeiros voluntários poderão partir para manifestações se não forem respondidas as suas exigências de terem verbas do Estado e um comando próprio, ficando fora da alçada da Protecção Civil.

Na sua intervenção, António Costa não deu resposta positiva, pelo contrário, apelou ao envolvimento de todos os agentes de proteção civil na reforma do sector, bombeiros incluídos, frisando que "todos são poucos" para "a indispensável mudança".

Se o discurso de Jaime Soares já tinha sido duro, o tom subiu após ouvir o chefe de Governo: “Queira encontrar-nos na rua apenas por razões do exercício da nossa função. Somos soldados da paz e da vida mas não temos qualquer receio em fazer guerra a quem puser a nossa paz em causa”, afirmou o presidente da Liga ao portal Bombeiros.pt, já depois de ouvir o primeiro-ministro.

Quanto às relações institucionais entre primeiro-ministro e Presidente da República, elas são retomadas publicamente esta segunda-feira, no Conselho de Estado. Na terça-feira, irão juntos para Coimbra, para assistir ao doutoramento honoris causa do presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker. Os sorrisos deverão voltar ao palco e os avisos aos bastidores. Pelo menos para já.

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