AR homenageia o “progressista” Passos Manuel dando o nome à biblioteca
Homenagem marcou o início das comemorações dos 200 anos do constitucionalismo. Guilherme d'Oliveira Martins elogiou a obra do ministro que economizava quando apostava na cultura e na educação. "Podia ser hoje. Pode ser hoje", vincou.
A biblioteca da Assembleia da República recebeu esta quarta-feira de manhã o nome do seu fundador, o histórico deputado liberal Passos Manuel, que há 181 anos assinou o decreto ditatorial que criou a Biblioteca das Cortes. Eduardo Ferro Rodrigues considerou que “poucos exemplos do constitucionalismo personificam tão bem os valores progressistas da liberdade, fraternidade e igualdade” como Passos Manuel.
Numa pequena cerimónia, o presidente do Parlamento aproveitou para fazer a ponte para o presente ao salientar que “todos os que não aceitam resignados os bloqueios que ainda travam o nosso desenvolvimento, todos os que revelam espírito reformista têm em Passos Manuel uma fonte de inspiração actual”.
Ferro Rodrigues lembrou a vida do histórico liberal, nomeado ministro do Reino na sequência da revolução setembrista de 1836. Foram apenas nove meses na pasta, mas suficientes para grandes reformas: fundou a biblioteca parlamentar (das Cortes), o Teatro Nacional, a Academia de Belas-Artes, o Conservatório e as escolas politécnicas de Lisboa e Porto, promulgou o código administrativo. “Percebia bem os bloqueios que travavam o desenvolvimento da sociedade portuguesa. Tinha o sentido da urgência reformista e actuou em conformidade. Percebeu de forma pioneira entre nós o papel da educação, da ciência e da cultura na emancipação humana”, disse o presidente do Parlamento.
Este rebaptismo da biblioteca marcou o arranque das comemorações dos dois séculos do constitucionalismo em Portugal, que são presididas por Guilherme d’Oliveira Martins, actual administrador da Fundação Calouste Gulbenkian, sob o lema “Celebrar a liberdade, 200 anos de constitucionalismo”. O programa ainda está a ser delineado, mas Ferro Rodrigues quer fazer uma comemoração “viva e pedagógica”, assinalando a criação do Sinédrio (1818), a revolução liberal (1820), a Constituição (1822), a abolição da escravatura (que começou em 1761 para a metrópole e a Índia e só em 1854 foi completa ao estender-se aos territórios africanos) e da inquisição (1821).
Oliveira Martins recordou o “cidadão Passos”, na verdade, Manuel da Silva Passos, como “um dos mais influentes políticos do nosso liberalismo; alguém que, pela sua coerência e determinação, teve influência decisiva no lançamento das bases do constitucionalismo português” e um político que antecipou um “país livre onde a liberdade, igualdade e fraternidade fossem realidades vivas”. Ainda que, lamentou, a sua “honradez e entrega ao serviço público”, “coragem, hombridade e respeito pelos princípios” não tenham sido unanimemente reconhecidos no seu tempo e foram alvo de “incompreensões, a ponto de ter que viver exilado”.
Quando foi nomeado ministro do Reino e da Fazenda “seguiu as pisadas de Mouzinho da Silveira, adoptando medidas às vezes impopulares mas necessárias”, recordou Oliveira Martins. “O ministro do Reino economiza quando gasta na instrução primária, economiza quando gasta com a Academia de Belas-Artes e com os conservatórios de Artes e Ofícios, economiza quando gasta com as escolas aplicadas às artes, quando facilita o trabalho e dá impulso à riqueza”, descreveu.
“Podia ser hoje. Pode ser hoje. O ministro da Economia e da Fazenda economiza quando investe na cultura, no conforto, na cidadania e nas ideias”, vincou o ex-presidente do Tribunal de Contas.