Partidos alemães não sabem como lidar com a AfD no Bundestag
Direita radical marca a primeira sessão do Parlamento de Berlim após as eleições de Setembro com desafio.
Quando é que uma derrota pode ser uma vitória? O primeiro desafio do partido de direita radical Alternativa para a Alemanha (AfD) aos restantes partidos alemães vai ser lançado esta terça-feira precisamente nesta forma.
Cada partido alemão propõe um candidato à vice presidência do Bundestag – cada partido com assento parlamentar tem direito a um vice-presidente. Mas cada nome proposto tem de ser aprovado por uma maioria de deputados, ou seja, de outros partidos.
A AfD apresentou um candidato que muitos deputados dos outros partidos consideram impossível de aprovar – trata-se de Albrecht Glaser, antigo político do partido de Angela Merkel, CDU (União Democrata Cristã), e fundador da AfD em 2013, que disse que os muçulmanos vivendo na Alemanha poderiam perder o seu direito à liberdade de religião, defendendo ainda que o islão não é uma religião mas sim uma ideologia política.
Isto deixa os outros partidos num dilema: ou votam a favor de um candidato que considerem inaceitável, ou contribuem para alimentar a narrativa da AfD que se apresenta como uma “vítima” do sistema – mesmo perdendo a votação, os extremistas vencem.
Os outros partidos já contribuiram para esta estratégia antes, quando mudaram regras do Parlamento, ainda na legislatura anterior, para evitar que um momento simbólico fosse protagonizado por um político da extrema-direita: em cada legisaltura a sessão de abertura do Bundestag era feita pelo deputado mais velho. Como a AfD elegeu Wilhelm von Gottber, de 77 anos, as regras foram alteradas para que fosse o deputado mais antigo a fazê-lo – e neste caso a honra caberia a Wolfgang Schäuble, de 75 anos e deputado desde 1972.
Schäuble declinou, no entanto, a honra porque foi nomeado pelo seu partido para ser o presidente do Parlamento e assim caber-lhe-á já um papel importante. A abertura será assim feita por Hermann Otto Solms, do FDP (Partido Liberal Democrata), 76 anos de idade e 33 de deputado.
Wolfgang Schäuble foi escolhido para uma posição em que se espera seja desafiado pelos estreantes no Parlamento (a AfD) devido ao seu perfil de democrata experiente, europeísta convicto e negociador sem cedências.
No Parlamento, todos esperam uma subida de tom de um local sóbrio. Um dos cabeças de lista da AfD, Alexander Gauland, prometeu "ir atrás de Merkel" no Parlamento, abrindo um inquérito à decisão da chanceler em abrir as portas a quase um milhão de refugiados em 2015.
Quanto à sessão desta terça-feira, a imprensa alemã olha para um antecedente de um candidato a vice que não conseguiu votos dos outros partidos e foi rejeitado. Tratou-se de Lothar Bisky, do partido Die Linke (A Esquerda), em 2005. O facto de haver informação sobre Bisky ser colaborador informal da Stasi, a polícia política da então RDA (República Democrática Alemã), fez com que não fosse aprovado (Bisky morreu em 2013, era deputado no Parlamento Europeu). O partido acabou por passados uns meses propor outra candidata, Petra Pau, para a vice-presidência – e esta foi logo aprovada.
A revista Der Spiegel lembrava ainda um caso de um Parlamento do estado-federado da Saxónia-Anhalt, em que a sessão de abertura, liderada por um político da AfD, acabou após sete minutos. O responsável teve de perguntar tantas vezes quais eram os procedimentos parlamentares que acabou por suspender a sessão e, mais tarde, desistir do cargo. Noutro caso, no estado de Mecklemburgo-Pomerânia Ocidental, a deputada da AfD que abriu a sessão parlamentar por ser a mais velha acabou por, pouco depois, sugerir no Facebook que os provocadores que causaram caos em Hamburgo deveriam ser atingidos a tiro no local.
Mas esta abordagem de tratar a AfD como um partido normal não é consensual, e o partido terá mais cuidado com a forma como se apresenta no Bundestag do que nos parlamentos dos estados-federados. O primeiro teste é esta terça-feira.