Sobre a noite passada: oito anos de sobrevivência em The Walking Dead

Tributos ao passado e sugestões de futuro na popular série da Fox, que chegou ao 100.º episódio na noite de segunda-feira. Sem mortes de monta.

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AMC

O 100.º episódio é mais do que um número redondo, pronto para celebrações e balanços. É a fronteira a partir da qual a rentabilidade de uma série se consolida, pronta para repetições sem fim no universo expandido da “televisão”. É também um marco, um momento que pode ser de viragem e de reorientação de um título tão popular quanto escrutinado como é The Walking Dead. O primeiro episódio da oitava temporada, dos oito anos de sobrevivência no apocalipse zombie, fez o seu tributo ao primeiro episódio, de Outubro de 2010, e provocou com imagens do futuro - a série não tem fim à vista. Também dividiu opiniões.

Os dados da temporada passada indicam que The Walking Dead é a série mais vista em Portugal. Parte significativa da base de fãs, ou pelo menos aquela que compareceu a celebrações como a passagem por alguns actores por Lisboa e que tanto se manifesta nas redes sociais, é a mais jovem. E em português de Portugal ou do Brasil, lá está ela a festejar cada momento, a recuperar de maratonas das sete temporadas anteriores, a identificar e a partilhar comparações entre a cena do piloto em que Rick Grimes procura gasolina e encontra uma menina zombie e aquela em que, em 2017, o seu filho Carl faz o mesmo. “Era para se sentir o passado da série a ressoar através do seu presente e do seu potencial futuro”, disse o showrunner de The Walking Dead, Scott M. Gimple, à Entertainment Weekly. Para quase “fechar um círculo.”

A conversa das personagens, como Maggie e Rick, sobre o futuro girou em torno do aspecto que terá o “amanhã”, após o fecho do ciclo All Out War dos comics de Robert Kirkman que inspiram a série televisiva - duas facções enfrentam-se, a da coligação do herói Rick e a do vilão Negan. Imagens difusas de dois futuros ou sonhos de futuro (uma família feliz ao som de Weird Al Yankovic ou lágrimas iluminadas pelo reflexo de um vitral) foram as migalhas deitadas no bosque para os espectadores seguirem ao longo dos próximos 15 episódios, numa série que perdeu parte do seu público na última temporada, mais dispersa e por vezes frustrante, e talvez parte da conversa que sempre gerou à sua volta.

A ideia de Mercy, sempre centrado no protagonista Rick Grimes apesar de a personagem querer que não seja tudo sobre ele, foi pôr o grupo central final e novamente ao ataque, “uma carga de positividade, de excitação, ou estranhamente de alegria só por poderem pegar em armas contra Negan”, diz Gimple sobre o vilão interpretado por Jeffrey Dean Morgan. “Era muito importante para a história e dar isso ao público”, disse o responsável, que dedicou o episódio ao duplo que morreu nas filmagens, John Bernecker, e ao mestre do horror George Romero, que morreu no Verão. “A série deve-lhe muito e a cultura popular tem uma grande dívida para com ele.”

A cultura que acolhe da mesma forma uma série sobre famílias multifacetadas, outras sobre crimes em série e uma sobre o que resta de humano após o colapso zombie mudou tanto e foi apoiando ou criticando este seu porta-estandarte televisivo. Há críticos que, perante o episódio estratégico de ofensivas e retiradas, só queriam escrever que “o 100.º episódio de The Walking Dead não é muito bom, tal como a série”, e outros que reconheceram o entusiasmo que ele lhes trouxe, admitindo que “deu espectáculo, mesmo que não lógica. E foi divertido” - ou até "incendiário". Neste episódio, ninguém digno de nota morreu, o que difere com o sucedido há um ano - e houve zombies, guerrilha e uma nova personagem à espreita para redimir ou trair os mais cínicos.

Mas a ideia de Mike Hale, do New York Times, de que a série anda em círculos não se aplica só à intriga, que passou dos zombies para os humanos como ameaças e que saltitou entre o nómada e o sedentário. “The Walking Dead, com as suas temporadas de duas partes para um total de 16 episódios, está numa terra de ninguém entre as séries mais curtas do cabo e do streaming e as séries mais longas, mas episódicas, dos generalistas, e é um exemplo de primeira apanha das dificuldades de contar uma história fortemente serializada ao longo de muitos anos sem um fim natural à vista.” Os anos desgastam ou não o investimento emocional nas personagens num cenário desolador, além da dedicação aos altos e baixos da narrativa?

Os dados das audiências nos EUA, divulgados esta terça-feira, mostram que o desinteresse do público é real - a estreia de temporada foi a menos vista dos últimos cinco anos, com 11,4 milhões de espectadores, mas ainda assim líder no importante grupo dos 18 aos 49 anos.

Para esse futuro sem fim, as promessas da equipa são as do costume: os três próximos episódios serão de grande acção e de que a temporada como um todo terá, como é habitual, “coisas duras”. Gimple, que disse ter ouvido as críticas quanto à última temporada, prometeu juntar mais os seus heróis, mas diz que, uma vez mais, o tema desta nova leva de episódios é sobre “agarrar-nos a quem somos, aos nossos valores, à nossa humanidade”.

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