BE e PCP votam contra proposta do PS sobre direito à desconexão
Tal como está, proposta dos socialistas merece o voto contra do Bloco. PCP também vota contra e apenas viabiliza projecto do PEV que considera contra-ordenação muito grave a violação do descanso dos trabalhadores
O Bloco de Esquerda e o PCP vão votar contra o projecto de lei do PS que regula o uso de ferramentas digitais no período de descanso dos trabalhadores e que admite que, na falta de acordo, as empresa possam adoptar um regulamento unilateral sobre a matéria. No plenário desta sexta-feira, a Assembleia da República discute os projectos de lei do PS, do BE, do PEV e do PAN, e ainda uma proposta de resolução do PCP e do CDS, mas para já a proposta dos socialistas merecerá o voto contra dos partidos que sustentam o Governo.
“Vamos votar contra os projectos todos, com excepção do projecto do PEV, porque todos apontam para a desregulamentação do direito ao descanso”, disse ao PÚBLICO Rita Rato, deputada do PCP. “Os tempos de trabalho, os períodos de descanso, o trabalho suplementar e a isenção do horário de trabalho estão tipificados na legislação laboral. Para nós não há dúvida de que durante os períodos de descanso os trabalhadores não estão obrigados a responder a mails ou a atender o telefone”, justificou.
O PCP apenas vai viabilizar a proposta do PEV que propõe que a violação do direito ao descanso deve constituir uma contra-ordenação muito grave.
Também o BE votará contra o projecto dos socialistas se entretanto os deputados não a reformularem. Para o deputado do BE José Soeiro, a proposta do PS “vem dar cobertura normativa à invasão do tempo de descanso dos trabalhadores”.
A proposta do PS estipula que a utilização de ferramenta digital no âmbito da relação laboral não pode impedir o direito ao descanso do trabalhador, “salvo com fundamento em exigências imperiosas do funcionamento da empresa, estabelecidas nos termos dos números seguintes”. Mas ao mesmo tempo admite que a contratação colectiva possa regular o uso destas ferramentas durante o período de descanso, férias e dias feriados. Quando os instrumentos de regulamentação colectiva não abordam o tema, o empregador deve tentar um acordo com as estruturas representativas dos trabalhadores. Na ausência de acordo - e é aqui que residem as críticas ao projecto socialista - “o empregador define por regulamento as situações que devem constituir exigências imperiosas de funcionamento”.
Para o BE a proposta do PS, tal como está, “não reforça mas fragiliza o direito ao descanso dos trabalhadores, e só pode merecer a oposição do Bloco e o seu inequívoco voto contra”.
“Ao procurar regular o que hoje, sendo prática comum, a lei não aceita, o projecto do PS tem um efeito perverso: o de legitimar a conexão por parte das empresas, legalizando na prática essa incursão patronal pelo tempo de descanso”, argumenta o deputado José Soeiro. “Ou seja, o que hoje pela lei deve ser um tempo de liberdade do trabalhador, passa a ser um tempo de liberdade condicional”, acrescenta.
A votação na Assembleia da República dos quatro projectos de lei e dos dois projectos de resolução está agendada para esta sexta-feira. Mas não se sabe se isso vai mesmo acontecer. Os partidos podem adiar e pedir para que os projectos desçam à comissão parlamentar para se tentar um entendimento.
CGTP critica mudanças
Num comunicado divulgado nesta quinta-feira, a CGTP alerta que “algumas” das propostas apresentadas na Assembleia da República para regulação do direito à desconexão profissional “estão a abrir a porta a uma nova e sofisticada ofensiva” contra os direitos dos trabalhadores.
Embora não se refira em concreto à proposta do PS, subentende-se que esse é o alvo, com a CGTP a criticar “o reforço da unilateralidade das decisões do patronato relativamente à organização do tempo de trabalho e a possibilidade de estas matérias serem reguladas através de regulamento interno da iniciativa dos patrões”.
A CGTP reconhece que há uma utilização cada vez mais intensiva das tecnologias da informação e comunicação e que elas permitem o contacto permanente. Mas isso, defende a central sindical, “não deve fazer esquecer a necessidade de cumprir e fazer cumprir a lei e a contratação colectiva aplicável no que respeita quer à organização do tempo de trabalho, quer ao direito ao descanso dos trabalhadores”.