Oposição venezuelana quer vencer regionais sem legitimar o regime
Em causa está a escolha de novos governadores e as sondagens apontam para um reforço da oposição. Governo aposta numa participação baixa para conter perdas.
Depois de meses marcados por violentos protestos que deixaram mais de cem mortos nas ruas de várias cidades venezuelanas, oposição e oficialismo voltam a trazer o seu confronto para a arena eleitoral. Para o regime de Nicolás Maduro trata-se de demonstrar ao mundo que, apesar da contestação, é possível regressar ao funcionamento normal das instituições. Para os seus opositores, as eleições regionais deste domingo representam uma oportunidade para capitalizarem o descontentamento crescente e reforçar a sua posição.
Em causa está a escolha dos governadores dos 23 estados venezuelanos, mas num contexto de crise política e económica, as implicações das eleições deste domingo são mais profundas. Trata-se, desde logo, do primeiro duelo eleitoral entre a oposição e o oficialismo desde as eleições legislativas de 2015, que deram uma vitória retumbante à coligação da Mesa de Unidade Popular (MUD) – que passou a deter a maioria na Assembleia Nacional. A oposição decidiu boicotar as eleições para a Assembleia Nacional Constituinte, em Julho, por encará-las como um artifício do Governo para substituir a Assembleia Nacional.
Nos meses mais recentes, a oposição tem perdido alguma da capacidade para mobilizar as ruas contra o regime e, por isso, aposta agora em infligir uma nova derrota ao oficialismo nas urnas. A grave crise económica que atinge a Venezuela deverá jogar a favor da MUD, cujos candidatos, de acordo com algumas sondagens, podem ser eleitos em 18 dos 23 estados – actualmente, há apenas três governadores oposicionistas.
Porém, há divisões no seio do movimento de oposição quanto à estratégia de participação nas eleições. Alguns sectores consideram que a apresentação de candidatos confere legitimidade ao acto eleitoral, mesmo perante abusos cometidos pelos organismos fiéis ao chavismo, como a Comissão Nacional de Eleições. Em Agosto, a ex-deputada María Corina Machado dizia à CNN que o objectivo das eleições era “travar os protestos, desarticular a pressão internacional e dar tempo à ditadura”.
Para a oposição há ainda um problema adicional. Mesmo que eleja vários governadores, é incerto qual será a margem de manobra que terão para desempenhar dos cargos. Receia-se que a todo-poderosa Assembleia Nacional Constituinte esvazie os seus poderes.
Porém, para os que defendem a participação, uma vitória nas eleições de domingo significa mais um passo no objectivo último da oposição – retirar Maduro do poder nas presidenciais do próximo ano. “Se as pessoas perceberem que com estas eleições estamos a dar mais um passo para derrubar Maduro, então irão votar”, disse ao Washington Post o candidato da oposição no estado de Vargas, José Manuel Olivares.
O objectivo do Governo é dar uma aparência de normalidade institucional, sobretudo para aliviar a pressão internacional. “O que é substancial é que nesta ‘ditadura’ liderada por Maduro, há eleições em cada estado e a oposição apresentou candidatos para todos os cargos”, disse ao Post o ministro das Comunicações, Ernesto Villegas, que considera as acusações da oposição um “déjà-vu”.
O dado crucial para o desfecho das eleições será a participação e a estratégia governamental parece ser de desincentivar os eleitores a sair de casa. A poucos dias do voto, a CNE decidiu, alegando “razões de segurança”, alterar a localização de centenas de mesas de voto sem revelar os novos locais. A MUD diz que há 400 mil eleitores afectados pela mudança.
Outra decisão denunciada pela oposição foi a inclusão dos pré-candidatos da MUD nos boletins em alguns estados, em vez de aparecer apenas o nome do candidato escolhido pela coligação – algo que irá provocar uma fragmentação dos votos. “A ideia é desencorajar as pessoas de participarem”, diz à BBC Margarita Lopez Maya, professora da Universidade Central da Venezuela. “Fazem todas estas coisas porque sabem que não podem vencer e fazem-no para dividir a oposição e confundir os eleitores.”