Um bar com a mão de Vhils é uma galeria de arte

Três amigos — Vhils, o artista plástico, Fred Ferreira, o músico, e Pedro Garcia, ex-sócio do Park — entram num bar e vêem nele uma galeria de arte, cuja exposição vai mudar a todos os anos. O Stupido 1/1 é uma antiga serralharia da Rua de São Paulo.

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Miguel Manso

Alexandre costuma dizer a Pedro que a “arte é efémera”. E sobre esta ideia os dois amigos criaram uma galeria em que a arte está impressa nas paredes e onde o artista convidado muda todos os anos. Quem o escolhe é Alexandre Farto, Vhils, um dos artistas plásticos portugueses mais notável. Ele é o curador de arte do Stupido 1/1, o espaço que há um mês abriu portas para a Praça de São Paulo, em Lisboa.

Perguntamos para ter a certeza: “Este é um bar com uma instalação artística ou uma instalação artística com um bar?. “É uma instalação artística e por acaso também tem um bar”, responde Pedro Garcia, um dos sócios. Em breve, em vez de um menu, ser-lhe-á entregue um “folheto como no Museu” para apresentar “o artista desse ano”.

A ideia, essa, não tem dono. Ter Vhils a escolher o artista que todos os anos vai dar uma nova cara à instalação e ter Fred Ferreira — baterista dos Orelha Negra, Banda do Mar, Buraka Som Sistema, 5-30, entre outros — a fazer uma “rigorosa playlist” para o espaço foi “uma ideia que surgiu em conjunto”. E que ainda não está fechada.

“A ideia é que o espaço seja mutante”, sublinha Pedro. Em parte já o é. Ainda agora abriu e Pedro já quer instalar condições sonoras para tornar o Stupido num espaço de referência de concertos de hip hop. “Quero aqui os grandes momentos da música urbana, do hip hop, do funk.” Primeiro há que dotar o espaço de isolamento sonoro. A antiga serralharia da Rua de São Paulo ainda está a experimentar aquilo é que é ser um “bar mutante de arte urbana”.

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Estar à frente de um bar no Cais do Sodré — “mais um” — desafia a imaginação. “É mesmo uma ideia para estúpidos. Como eu”, diz Pedro, divertido com a ideia de ele ser o “Stupido” que dá nome ao espaço. O “1/1” vêm do facto de cada obra que usar o bar como tela ser única. “Os livros têm uma página de mil, por exemplo. Este bar é uma obra em um.” Daqui a um ano — talvez menos — o Stupido 1/1 terá outra cara.

Viagem a Milão

O tecto curvo e as paredes corridas a rectângulos coloridos formam um túnel que, ajudado pela decoração minimalista, com mesas e cadeiras espaçadas e candeeiros longos, parece maior do que é na realidade.

O primeiro a fazer destas paredes uma tela foi o argentino e espanhol Felipe Pantone, nome grande do graffiti internacional. Imprimiu nas paredes do Stupido 1/1 uma paleta cromática inspirada na empena que pintara num prédio no Lumiar — aquele que é o seu maior trabalho, com 45 metros de altura.

Quando Pedro Garcia saiu do bar onde era sócio, o Park, no último andar de um parque de estacionamento no Bairro Alto, estava longe de imaginar que voltaria a ter este ofício nas mãos. Foi viajar. A cidade de Milão, as galerias de arte, os amigos e a conversa “à moda italiana” abriram-lhe a mente. “Tive uma ideia que ainda não sabia bem o que era. Só sabia que depois do Park queria fazer outra coisa.” A ideia do Stupido 1/1 só surgiu uns meses depois e as portas abriram dois anos após ter deixado o Park, em parceria com a agência Live Content.

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A ideia do Stupido é ser replicado em qualquer cidade. “Pode ser uma galeria mais jazz em Alcântara ou um bar ao espelho de um bairro londrino. O Stupido é um conceito para uma cidade, qualquer cidade. Adapta-se a ela, trazendo algo de novo.”

Pizzas e smoothies

Atrás de um balcão corrido, no primeiro plano de uma bancada recheada de prateleiras de bebidas coloridas, está Liliana Moura Pires a recomendar as pizzas a um grupo de inglesas. “Sim, tem vegan. E smoothies (5 euros) também”, diz, lançando as “cartadas mais surpreendentes” de uma extensa lista de bebidas e pizzas (8 a 9 euros). Estas estão sempre a sair, das 18h até à hora de fecho, de madrugada.

Fácil de se perder numa lista tão extensa, pede-se sugestões ao chefe de bar, José Pinto: o Stupido, um cocktail à base de especiarias, rum e alecrim que não está na carta, e o Desassossego, um cocktail doce com licor Beirão, laranja e manjericão. Para além das bebidas originais,há mojitos, caipirinhas, uma grande variedade de gin, whisky e rum e seis cocktails sem álcool (5 euros). A carta é renovada em breve, para “colecção de Inverno”: haverá um cocktail com cerejas do Fundão e outro com chocolate, pimenta e rum.

A acompanhar as recomendações do chefe, à semana o DJ serve sets de hip hop e funk, de jazz e soul. À sexta e fim-de-semana o ritmo acelera, com as sonoridades mais comerciais do hip hop comercial e aproxima-se do pop.

Em breve, haverá programação própria, com os artistas que Fred Ferreira quiser trazer para o bar do amigo e, quem sabe, outros nomes que “o bar só por si consiga chamar”.

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