Montenegro guarda-se para mais tarde e abre caminho a Rangel

Santana Lopes assume que também está a “ponderar, obviamente”, uma candidatura à liderança do PSD. Data das eleições e do congresso deve ser marcada já na segunda-feira.

Foto
Luís Montenegro na sala onde Passos anunciou a saída Nuno Ferreira Santos

Já não era costume nos últimos tempos a sala encher-se como um ovo para ouvir Passos Coelho num conselho nacional. Foi um líder humilde e até magnânimo o que se apresentou esta terça-feira à noite aos sociais-democratas, para justificar a decisão de não se recandidatar à liderança. Não era a sua vontade, mas não quis dar a ideia de ficar “agarrado ao lugar” e assume que não tem condições para tornar o PSD uma alternativa de oposição.

Diz que sai sem se envolver na próxima disputa eleitoral, mas fala em Paulo Rangel e Hugo Soares como os rostos que “podem aproveitar bem o tempo” para o PSD se afirmar. O eurodeputado pode mesmo ter a via aberta para avançar, já que Luís Montenegro está inclinado para o “não”. Sem o ex-líder parlamentar na corrida, Rangel é quem angaria mais apoios entre os que não morrem de amores por Rui Rio.

Em tom de lamento e desabafo, Passos Coelho justificou a decisão de não se recandidatar — anunciada à tarde na comissão política — com um resultado das autárquicas “pesado” e que o surpreendeu. “É o que sinto”, chegou a dizer, e lançou outro argumento: “Na avaliação que faço (...), a afirmação de uma nova liderança do PSD e da estratégia associada terá melhores possibilidades de progressão e de progresso do que uma que eu pudesse encabeçar”. Mais à frente, afastou a ideia de ter uma “obstinação com os lugares”. Só com as ideias. “Ficar seria oferecer com facilidade a caricatura de que estamos agarrados ao poder interno, e como já foi sugerido à gratidão com as lutas e resultados passados”, afirmou. Sem se demitir — sugerindo que fica até ao fim do mandato — Passos Coelho também disse que não andará por aí a “rondar” nem a “assombrar” mas também que não se vai “calar para sempre”. E após esta aparente alusão ao “vou andar por aí de Santana” arrancou a primeira salva de palmas.

Com o argumento da crítica que costuma fazer à “geringonça” — que só “pensa no presente” — Passos quis dar uma dimensão de futuro à sua decisão. “A nossa acção política precisa de ser ambiciosa (...) e eu não estou em condições de oferecer essa perspectiva ao PSD”, afirmou, assumindo que não era esta a sua vontade nem que é por falta de apoios que sai do cargo: “Sinto esta decisão como lúcida, mas não como um desejo”. Apelando à mobilização dos militantes para a nova fase do partido, o líder mostrou-se disponível para, se o conselho nacional quiser, antecipar as directas para Dezembro. Foi entretanto apresentada uma proposta para um novo conselho nacional, já dia 9, segunda-feira, para marcar as eleições e o congresso.

Assegurando que não se envolverá na disputa, Passos deu liberdade aos membros dos órgãos nacionais para apoiarem quem entenderem. Mas falou nos nomes de Rangel e do líder parlamentar, Hugo Soares, os únicos que referiu. “De um lado com o Hugo, do outro com Rangel aproveitaremos bem o tempo para dizer que o PSD é um pilar de estabilidade e de construção do futuro”, rematou. O eurodeputado, na primeira fila, viria a intervir (já à porta fechada) e ouviu um forte aplauso, relataram fontes ao PÚBLICO.

A saída de Passos Coelho abriu a corrida eleitoral interna, mas a prudência impera. Os putativos candidatos — à excepção de Rui Rio, que dá todos os sinais de que avança — estão à espreita uns dos outros. Luís Montenegro, que liderou a bancada “laranja” nos últimos seis anos, tem estado a ser pressionado para avançar por companheiros deputados, autarcas e dirigentes, mas está inclinado a resguardar-se. Os seus apoiantes consideram que ainda é cedo, tendo em conta o bom momento do Governo, o mau momento do PSD e as legislativas já em 2019. O “kingmaker” de Montenegro, Miguel Relvas, pode avançar com outro nome que lançou numa recente entrevista ao Expresso: Miguel Pinto Luz, que liderou a distrital de Lisboa durante os seis anos de passismo, até Julho.

Sem Luís Montenegro na corrida, há espaço para Paulo Rangel se apresentar contra Rui Rio. O PÚBLICO sabe que o eurodeputado não desdenha fazer uma liderança de transição, para proceder a uma reforma profunda, programática e geracional, a preparar um novo ciclo de poder. O sinal dado por Passos no discurso reforça a ideia de que Rangel pode herdar os apoios de passistas e dos que rejeitam o ex-autarca do Porto.

Outro candidato que se pode afirmar-se é o ex-primeiro-ministro Pedro Santana Lopes que também não defrontaria Passos. O provedor da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa assumiu à noite, na SIC, que está a “ponderar, obviamente”, uma candidatura.

A questão geracional é mesmo um ponto essencial nesta disputa. Os sociais-democratas que não gostam da solução de Rui Rio apontam as figuras que rodeiam o ex-autarca — Ferreira Leite, Ângelo Correia — como sendo do PSD “do antigamente”. Para outros conselheiros, até críticos de Passos Coelho — como Luís Rodrigues — a questão está na regionalização. “Rio tem de clarificar se é a favor da regionalização. Se for a favor, não tem o meu apoio”, diz o ex-deputado.

A Visão avança os planos do ex-autarca, faz a lista de “quem o apoia e com quem negoceia”, diz que Rio vai lançar um site no dia do anúncio da sua candidatura (na próxima semana) e acrescenta que o pré-candidato já garantiu 60% dos apoios. com L.B. e S.S.

Sugerir correcção
Ler 1 comentários