Irá Merkel sair vitoriosa ou apenas ganhar as eleições?

A chanceler arrisca-se a quase perder mesmo vencendo, os sociais-democratas podem ter a sua votação mais baixa de sempre e a extrema-direita veio para ficar. É uma eleição que vai mudar o país e que tem “muito mais turbulência do que o que parece”.

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Reuters/FABRIZIO BENSCH

Nas eleições legisaltivas alemãs que têm lugar este domingo tudo depende de uns dois, três pontos percentuais no resultado da CDU/CSU (democratas-cristãos), de Angela Merkel. Se o resultado estiver próximo dos 40%, a chanceler tem uma vitória expressiva. Se estiver nos 34-36%, como prevêem algumas sondagens, pode estar em terreno movediço, diz ao PÚBLICO analista do German Marshall Fund em Berlim Joerg Forbrig.

“Nesse sentido, Merkel pode perder mesmo ganhando”, diz. Isto porque caso tenha um resultado mais baixo, fica apenas com duas hipóteses de coligação, ambas complicadas: uma nova “grande coligação”, com os sociais-democratas, ou uma coligação “Jamaica”, com os verdes e os liberais (que têm políticas muito diferentes em várias questões desde a Europa à mobilidade).

A "grande coligação" pode enfrentar uma barreira porque o SPD tem de a pôr à consideração dos seus membros, que aprovarão ou não um acordo de Governo. A Jamaica é uma coligação nunca tentada a nível federal e seria uma incógnita – ainda que pudesse ser uma combinação a que o estilo de governação quase presidencial da chanceler se adaptasse bem, Merkel afirmou que esta não é altura para experiências.

Mas mesmo uma coligação apenas da CDU/CSU com os liberais, como a de 2009-2013, que as sondagens parecem afastar, poderia não ser fácil, já que estes pediriam provavelmente o ministério das Finanças, privando Merkel do seu ministro mais popular, Wolfgang Schäuble.

Muita turbulência

Conclusão: nesta eleição “há muito mais turbulência do que parece”, como sublinha Forbrig. E se o resultado de Merkel não for convincente, “haverá pessoas no partido a pensar na pessoa que se segue”.

A última sondagem, do instituto Insa, dá 34% das intenções de voto à CDU/CSU (que consegue 37% na sondagem que lhe dá o maior valor, do GMS), e 21% ao SPD (que chega a um máximo de 22% também na sondagem do instituto GMS. A confirmarem-se no domingo qualquer destas percentegans, será o pior resultado do SPD, abaixo até do anterior recorde de baixa votação, que foi 23% em 2009, no final da primeira “grande coligação” CDU-SPD.

Nesta sondagem do Insa o terceiro lugar vai para o partido de extrema-direita Alternativa para a Alemanha (AfD), com 13%, uma subida em relação às últimas sondagens (outros institutos dão uma projecção menor, 10% no GMS). Todos os restantes partidos já disseram que não considerariam a AfD para parceiro em nenhum caso.

A AfD foi intercalando a campanha com argumentos mais ou menos populistas, mais ou menos racistas, e outros claramente chocantes, como uma afirmação de que os alemães poderiam sentir-se orgulhosos dos seus soldados nas duas guerras.

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“É a mesma estratégia que seguiu Trump nos EUA, de provocações calculadas”, diz Joerg Forbrig. Com uma periodicidade certa como um relógio, “todas as semanas, por vezes duas vezes por semana, surge uma gravação, ou um email a que alguém teve acesso, com uma afirmação polémica de um dos candidatos”. Estas são divulgadas pelos media, a questão é discutida, os candidatos dizem que a forma utilizada talvez não fosse a melhor mas que mantém a essência da ideia, e assim conseguem uma presença nos media excepcional. “Porque os outros partidos não podem usar essa estratégia.”

Por outro lado os liberais e o seu novo líder, Christian Lindner, têm vindo a ter um discurso mais duro em relação à União Europeia e ao euro, e também à imigração, no que está a ser visto como uma contaminação da AfD. Nesta última sondagem, estão com 9%, em quinto lugar, atrás do partido de esquerda Die Linke, que com 11% conseguiria o quarto lugar. Na última eleição, os liberais ficaram fora do Parlamento pela primeira vez desde a sua fundação em 1949.

Os Verdes, que se apresentaram na campanha como potenciais parceiros de coligação de Merkel, também não conseguem o suficiente, ficando em último lugar entre os candidatos a terceiro partido, com 8% segundo o Insa, praticamente sem variação nos números dos outros institutos.

Se há quem diga que o que está a acontecer é uma fragmentação à direita como já aconteceu à esquerda com o surgimento do partido Die Linke, o Instituto para a Investigação Eleitoral e Social calculou que estas eleições trarão uma “viragem drástica da esquerda para a direita”, com os partidos de inclinação de esquerda a registar o seu ponto mais baixo desde os anos 1960.

Governo minoritário?

Restaria outra opção, mas quase ninguém a considera: um governo minoritário. Nunca aconteceu na Alemanha e a maioria dos analistas diz que seria impossível num país com tanto desejo de estabilidade.

“Um governo minoritário é o expoente máximo da fraqueza”, diz Forbrig. Embora tenha havido antecedentes nos estados federados, em Magdeburgo (SPD no Governo, com apoio de Die Linke), ou na Renânia do Norte Vestefália (SPD-Verdes, com apoio de Die Linke), é uma solução que amplia incertezas (os analistas alemães falam em Governos minoritários “tolerados” por outros partidos, não “apoiados”).

“Mas quem toleraria quem e em que questões? Haveria tolerância em todas as áreas? Ou seria preciso estar sempre a procurar maiorias conforme os temas?”, questiona o analista.

Abstenção

Outro factor é a abstenção. Nos últimos dias, tanto Merkel como o candidato do SPD, Martin Schulz, insistiram na participação eleitoral e pediram um último esforço aos seus apoiantes. Teme-se que uma participação menor favoreça a AfD.

Em 2013 a participação foi de 71,5%, mas segundo a emissora alemã Deutsche Welle poderá diminuir: ainda havia, a uma semana das eleições, 34% que não sabiam ainda se iam votar e se sim em quem.

A escolha não é, no entanto, limitada aos partidos maiores. Na campanha há vários outros partidos com cartazes nas ruas e anúncios nas televisões.

Há partidos mais estabelecidos como o partido satírico Die Partei. Querem reconstruir o muro de Berlim e este ano estão encorajados com o facto de os muros estarem de novo na moda, sobretudo graças ao Presidente dos Estados Unidos Donald Trump, ou o Partido Pirata. O Die Partei tem um deputado no Parlamento Europeu, os piratas tiveram bons resultados em alguns estados mas foram perdendo popularidade.

Entre os chamados micropartidos há alguns mais originais como o partido dadaísta-anarquista Bergpartei, que tem cartazes pintados à mão em alguns locais de Berlim, o partido Mundo Humano que pretende fortalecer a democracia através da meditação, ou ainda Os Urbanos, que parte do hip-hop para lutar contra a discriminação.

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