Autarcas condenados voltam para responder perante o povo
Quem se lança na aventura de voltar a ser presidente da câmara após uma condenação acredita, ou quer acreditar, que a sua credibilidade junto dos eleitores não foi afectada pelas infracções cometidas.
“As pessoas estão a marimbar-se para a espuma dos dias”, reage Francisco Gonçalves, director de campanha do Grupo de Cidadãos Eleitores "Isaltino - Inovar Oeiras de Volta", quando o PÚBLICO o questiona sobre a aceitação da candidatura, tendo em conta a pena de prisão por fraude fiscal e branqueamento de capitais a que Isaltino de Morais foi condenado. “Não observámos, até ao momento, qualquer sinal de animosidade por parte das pessoas, antes pelo contrário, abraçam-no comovidas e gritam pelo seu nome”, assegura.
O grau de afecto da população de Oeiras em relação ao candidato que “foi demonizado, perseguido e escorraçado como um cão depois de ter sido acusado de corrupto, é muito grande” e “nem precisa de andar com a segurança atrás” adjacetiva Francisco Gonçalves.
Foi isso mesmo que se viu este domingo, na Avenida Marginal, onde um "comboio" de camisolas verdes envolvia o candidato, sem quaisquer guarda-costas. Era dia de Marginal sem carros e vários candidatos aproveitaram para ali fazer campanha eleitoral. Atrás dele seguia Ângelo Pereira, do PSD, e logo a seguir Sónia Gonçalves, independente. Paulo Vistas, outro independente, só não se cruzou com Isaltino porque estava numa cerimónia enquanto presidente de câmara fora dali. Cruzaram-se os apoiantes, com barulho, mas sem desacatos.
O grupo do Nós, Cidadãos!, liderado por Isabel Sande e Castro, também aproveitou o domingo para fazer campanha na Marginal. Assim como Heloísa Apolónia, da CDU, e alguns apoiantes do PCTP-MRPP, que concorre com Alda Gameiro. Registe-se que em Oeiras há 13 candidatos nestas autárquicas. Além dos já referidos há ainda Joaquim Raposo (PS), Miguel Pinto (BE), Pedro Torres (PAN), Safaa Dib (Livre), Pedro Perestrello (PNR) e André Madaleno (PTP).
A relação de Isaltino com as pessoas “continua muito próxima e até saiu reforçada”, acrescenta o seu director de campanha e também número dois da lista de independentes “Inovar Oeiras de Volta”.
A vontade popular surge, assim, como o elemento determinante e dinamizador das candidaturas autárquicas que têm, na sua liderança, cidadãos que foram condenados em tribunal por actos praticados à margem da lei quando presidiam ou presidem aos municípios para que foram eleitos.
Ninguém fala na condenação
Este registo está também patente nas declarações de Jaime Ramos ex-presidente da Câmara do Entroncamento entre 2001 e 2013, pelo PSD, e que volta a encabeçar a lista deste partido às próximas eleições autárquicas. Garante que "foram funcionários da autarquia e moradores que se deslocaram" a sua casa, apelando para que se candidatasse, "alegando que queriam a mudança na autarquia”.
Colocado perante este desafio, o ex-autarca disse que “não podia recusar” e anuiu ao apelo assumindo que “estava completamente disponível” para se recandidatar, pese embora a condenação do Tribunal de Santarém a uma “pena de prisão suspensa de dois anos e seis meses por prevaricação no exercício de cargo público”.
A decisão tomada no início do passado mês de Março foi classificada por Jaime Ramos de “inadequada e incompreensível”, garantindo ao PÚBLICO que “sempre fez tudo pela honra e pelo bom nome do município, nunca manchando o nome do Entroncamento”.
O cabeça de lista do PSD à Câmara do Entroncamento diz que “nunca” foi acusado de corrupção e assume-se como “um homem limpo” que é compreendido pela população. “É um gosto ver os cidadãos satisfeitos porque sabem que o meu papel é colocar-me ao serviço das pessoas”, descreve Jaime Ramos, sublinhando que “não é o dinheiro que move" a sua recandidatura, "mas as pessoas”.
Está confiante em relação ao resultado das eleições de Outubro, nas quais defrontará Jorge Faria (PS), Henrique Leal (BE), PEdro Gonçalves (CDS-PP) e Telma Jorge (CDU). E acredita que “ninguém fala” da sua condenação pelo Tribunal de Santarém - falta a decisão final da Relação, para onde já recorreu.
Perda de mandato
Luís Mourinha presidente da Câmara de Estremoz, também acredita na confiança que o eleitorado do seu concelho lhe possa atribuir no próximo dia 1 de Outubro. “Os estremocenses sabem o que se passa e um número crescente de pessoas querem a minha recandidatura” afirma o autarca que viu confirmada pelo Tribunal da Relação de Évora a perda de mandato, numa decisão tomada no final de Março.
A sentença determinou ainda uma pena prisão de dois anos e oito meses com pena suspensa, o pagamento de uma indemnização de 1.882 euros acrescidos de juros de mora por danos patrimoniais e de 4.500 euros por danos não patrimoniais à Liga dos Amigos do Castelo de Evoramonte (LACE). Esta condenação resulta da queixa-crime apresentada por um dirigente da organização, depois do autarca ter ordenado, em 2009, a suspensão de parte do subsídio que havia sido atribuído à LACE.
A condenação, apesar de recente, não parece que esteja a ter reflexos nesta fase de pré-campanha eleitoral. “A análise que faço da sua aceitação é bastante positiva” referiu ao PÚBLICO Luís Mourinha, que se recandidata pela última vez, numa lista do Movimento Independente por Estremoz (MiETZ), e que já soma 24 anos de autarca e 20 a liderar executivos. E aponta um dado que considera relevante: “Realizámos há dias um encontro com 700 pessoas quando, em campanhas anteriores, o seu número oscilou entre as 400 e 500”, admitindo que a condenação em tribunal “não afecta nada, bem pelo contrário aumenta o número de aderentes à minha recandidatura”.
À espera do recurso
O crime de prevaricação no licenciamento de obras, entre 1990 e 2008, pode também custar a perda de mandato a José Amarelinho, presidente da Câmara de Aljezur (PS). Na altura dos factos, José Amarelinho ocupava as funções de vereador na autarquia presidida por Manuel Marreiros (PS), tendo sido eleito para a presidência do município em 2009, altura em Manuel Marreiros foi eleito para a presidência da Assembleia Municipal.
Os autarcas recorreram por duas vezes da sentença para o Tribunal da Relação de Évora, que, em Junho passado, confirmou a condenação da primeira instância, considerando “improcedente” o recurso de José Amarelinho, no processo em que ficou provado que tanto ele como o então presidente da Câmara, Manuel Marreiros "agiram de forma contrária à lei". A decisão desta instância judicial refere: "uma vez transitada, terá como efeito a perda de mandato".
Tanto Manuel Marreiros como José Amarelinho licenciaram obras no empreendimento Vale da Telha, sem observância do Plano Municipal de ordenamento do território "aproveitando os poderes autárquicos, visando favorecer as condições em que exerciam o cargo e apoiar os seus amigos ou apoiantes (…) com violação das várias normas relativas à edificação” conclui o acórdão judicial.
O PÚBLICO fez várias tentativas ao longo de quase duas semanas para contactar José Amarelinho, mas este nunca esteve disponível para prestar declarações. O autarca recandidata-se a mais um mandato à presidência da Câmara de Aljezur. Tem como adversários Rogério Furtado (CDU) e Hélder Cabrita (PSD/CDS).