Estudo indica que carros a gasóleo são piores para o ambiente

Associação Transport&Environment analisou o ciclo de vida dos automóveis e argumenta que o impacto ambiental do diesel é maior do que o geralmente assumido.

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Joana Freitas / PUBLICO

Dois anos após o escândalo da fraude das emissões que abalou o grupo Volkswagen e lançou uma sombra de suspeição sobre a indústria automóvel, uma coligação de várias organizações ambientalistas europeias divulga um estudo em que conclui que, ao longo de todo o ciclo de vida, um carro a gasóleo significa mais 9% de dióxido de carbono a ser emitido para a atmosfera do que acontece com um carro a gasolina.

A conclusão, defende o estudo divulgado nesta segunda-feira, contraria a ideia de que o gasóleo emite menos dióxido de carbono, um gás que provoca o efeito de estufa e contribui assim para o aquecimento global (e que é diferente do óxido de azoto, cujas emissões foram falseadas pela Volkwagen e que têm consequências para a saúde respiratória). O menor impacto climático por parte dos carros a gasóleo tem sido defendido pela indústria automóvel e por legisladores, e assenta no facto de um carro deste género consumir menos combustível para fazer o mesmo número de quilómetros.  

A análise agora publicada foi feita pela associação Transport&Environment, que tem 44 organizações-membro, entre as quais as portuguesas Zero e Quercus. Mas não é a primeira vez que é contestada a ideia que os carros a gasóleo emitem menos dióxido de carbono. Em 2016, por exemplo, um investigador da Universidade de Trier, na Alemanha, tinha já apresentado no Parlamento Europeu uma análise em que argumentava que os motores diesel tinham emissões mais próximas dos motores a gasolina do que era geralmente assumido.

O estudo da Transport&Environment, porém, não se foca apenas nas emissões dos automóveis em circulação, mas tem em conta outros factores, que incluem também os gastos energéticos associados à refinação de cada um daqueles tipos de combustível, e ainda o facto de os motores a gasóleo, segundo o relatório, serem mais complexos, mais pesados e consumirem mais energia no processo de fabrico. Para além disso, a Transport&Environment argumenta que o facto de o gasóleo ser mais barato, e de o consumo de combustível ser menor nestes carros, incentiva as pessoas a fazerem mais quilómetros – os cálculos foram, por isso, apresentados tendo como exemplos um carro a gasolina que percorre 177 mil quilómetros ao longo do período de vida e de um carro a gasóleo que perfaz 182 mil quilómetros. O resultado são 42,65 toneladas de dióxido de carbono emitidas no caso do automóvel a gasóleo, e 39 toneladas para o modelo a gasolina.

“O dieselgate já expôs que os carros a gasóleo são a principal causa do dióxido de azoto tóxico nas cidades europeias, que mata anualmente 68 mil europeus”, afirmou, em comunicado, Julia Poliscanova, da Transport&Environment, referindo-se ao escândalo da Volkswagen. “Contrariamente às reivindicações da indústria, aprendemos que os carros a gasóleo também são piores para o clima do que versões de gasolina e não são necessários para atingir os objectivos de dióxido de carbono dos carros. A Europa agora deve olhar para a frente e acelerar a transição para veículos limpos e electrizados e consignar o gasóleo poluente para os museus.”

Esta transição, considera por seu lado o presidente da associação Zero, é inevitável: “Não tenhamos dúvidas de que vai ser uma transição para uma mobilidade mais amiga do ambiente, quer em termos de ruído, quer em termos de qualidade do ar. Precisamos de preparar as infra-estruturas para os veículos eléctricos”, observou ao PÚBLICO Francisco Ferreira.

O ambientalista argumentou ainda que “as pessoas não tem a noção de quanto a Europa tem facilitado o gasóleo nos veículos ligeiros”. Ferreira referia-se a questões como a fiscalidade, que é menos pesada no caso do gasóleo. Em Portugal, a carga fiscal (excluindo o IVA) representava no final de Agosto cerca de 44% do chamado preço de referência do gasóleo (um valor que exclui a margem de lucro dos vendedores). No caso da gasolina, o peso dos impostos subia para 51%, de acordo com informação da Entidade Nacional para o Mercado dos Combustíveis.

Na Europa, os motores diesel são há muito alvo das organizações ambientalistas, que estão a fazer pressão para acelerar a adopção de veículos eléctricos, que ainda é residual. O continente é um mercado onde o gasóleo tem um grande peso e, segundo a Transport&Environment, sete em cada dez carros a gasóleo são vendidos a consumidores em mercados europeus.

Dados da Associação Europeia de Fabricantes Automóveis mostram que os carros a gasóleo representam cerca de metade das vendas de automóveis ligeiros de passageiros na Europa ocidental, mas têm vindo a perder terreno face aos carros a gasolina. Também a procura por automóveis híbridos e eléctricos tem vindo a crescer. No ano passado, os carros com motores diesel representaram cerca de 50% de todas as vendas na Europa ocidental, abaixo dos 52% observados em 2015. Já os carros a gasolina tiveram em 2016 uma fatia de 46% do mercado, uma subida face aos 44% do ano anterior.

Em Portugal, contudo – onde os consumidores tendem a manter os carros mais tempo do que a média europeia – continua a existir uma clara preferência pelo gasóleo. No ano passado, estes carros representaram praticamente dois terços das vendas.

Pressionados por consumidores e eleitores que parecem ter uma consciência ambiental cada vez mais presente, muitos fabricantes e governos têm feito promessas de um futuro mais ecológico. A França, cujo sector automóvel inclui marcas como a Renault, Peugeot e Citroen, anunciou intenções de acabar com carros a combustível até 2040, uma meta também traçada pelo Reino Unido. Já a Alemanha – país de marcas como a Volkswagen, Skoda, Audi, BMW e Mercedes – tem criado incentivos para a compra de carros eléctricos e disse pretender acabar com a venda de modelos a gasolina e gasóleo até 2030.

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