Júlio Pereira: “O passado, para mim, é sobretudo um estímulo para fazer coisas novas”

Novo disco de Júlio Pereira, Praça do Comércio, vai ser apresentado ao vivo na próxima sexta-feira no Olga Cadaval, em Sintra, às 22h.

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Júlio Pereira com um dos seus cavaquinhos Raquel Von Kaminaru
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Capa de Praça do Comércio, criação de Carlos Zíngaro DR

Está finalmente pronto o novo disco de Júlio Pereira, o 22.º da sua carreira. Chama-se Praça do Comércio e ele vai apresentá-lo ao vivo esta sexta-feira, 15 de Setembro, no Auditório Olga Cadaval, em Sintra (às 22h). Com ele estarão Miguel Veras (viola), Sandra Martins (violoncelo) e Pedro Dias (guitarra portuguesa), que habitualmente o acompanham ao vivo. Os dois primeiros participaram no disco, ao lado de músicos como Luciano Vasconcelos (baixo), Daniel Pereira (Tin whistle e gaita de foles), Luís Peixoto (bouzouki), Pedro Jóia (viola), Quiné (percussões), Norberto Cruz (bandolim), José Manuel Neto (guitarra portuguesa), Quico Serrano (sintetizador), Diogo Duque (trompete) e James Hill (canadiano, exímio tocador de ukulele). Quanto a Júlio Pereira, tocou cavaquinho, braguinha, viola, viola braguesa, bandolim, bouzouki e sintetizador.

Os temas, como habitualmente, foram “baptizados” em encontros de amigos. E assim nasceram, de várias audições, os nomes Voa cavaquinho, Galope do deserto, Comboio azul, Noitada extravagante, Ponte da barca, Palácio das necessidades (nada a ver com o dito), Dança da Lua cheia, Praça do comércio, Lagoa das sereias ou The common raven (com James Hill). Há ainda uma versão de Índios da meia-praia, de Zeca Afonso.

Na praça, outros mundos

“Quando alguém diz qualquer palavra que, vinda daquilo que sente, vai ao encontro do que eu também sinto, aí faz sentido agarrá-la”, diz Júlio. Por exemplo: foi o João Gil que deu a ideia de chamar a uma tema Praça do Comércio, e para mim faz todo o sentido. E o nome é tão forte que acabei por dá-lo ao disco.” Júlio, através de um post, quis saber o que pensavam as pessoas daquela que é “uma das praças mais bonitas do mundo”. “E há depoimentos interessantíssimos, que vêm muito do afecto, é como se aquela praça tivesse uma força qualquer, muito grande, para nós lisboetas.” À ideia da praça como centro do poder político (e tantos se lhe referiram como o poder do Terreiro do Paço), sobrepõe-se aqui a imagem de sala de visitas da cidade, de antigo lugar de trocas e comércios vários. “Foi uma sorte o Cheny Wa Gune [dos moçambicanos Timbila Muzimba] poder participar. Ele estava de passagem por Lisboa, quando eu estava a gravar este disco, e foi fantástico.” Ele canta, ali, num dialecto moçambicano. “Eu até lhe disse: inventa palavras. Porque eu queria um som que se percebesse claramente que era de um outro sítio do mundo.”

Há aqui outros vocalizos, como é habitual nos trabalhos de Júlio Pereira, essencialmente instrumentais, e neles intervêm várias vozes: a dele próprio, mas também as de António Zambujo, Olga Cerpa, Luanda Cozzeti, Mariana Abrunheiro, Teresa Melo Campos e Inês Melo Campos (ambas do grupo vocal Sopa de Pedra, que em Outubro lançará o seu primeiro disco) e Andreia João Lopes. Mas há também palavras cantadas, em Noitada extravagante, onde as vozes de Zambujo e da cantora Olga Cerpa (das Canárias) contracenam com a viola de Pedro Jóia. “Dediquei esse tema, em palco, ao Festival Músicas do Mundo, de Sines, que merece todo o nosso apoio. Foi uma noite muito bonita e ficou-me na cabeça. E como sempre achei muita graça a essa quadra tradicional alentejana [“Chamaste-me extravagante por eu ter uma noitada/ Eu sou um rapaz brilhante, recolho de madrugada”], lembrei-me de a pôr na música que eu fiz.”

Conversas de cordas

A capa do disco, que chegará às lojas em CD e LP na próxima semana, foi desenhada por Carlos Zíngaro, retomando aqui uma ligação antiga (foi ele que ilustrou os seus dois primeiros disco a solo, Fernando Vai ao Vinho, 1976, e Lisboémia, 1978). Não só a capa: fez desenhos para cada um dos onze temas, todos eles reproduzidos no disco.

Em Praça do Comércio, o cavaquinho “conversa” com a guitarra portuguesa, mas também com o seu parente ukulele, cedendo nalguns temas o protagonismo ao braguinha, o seu par madeirense. Mas a conversa de cordas não acaba aqui. Althay Páez, um timplista da Canárias [o timple é o “cavaquinho” local], vai gravar um disco com músicas de Júlio Pereira e isso abre caminho a novas viagens sonoras. “Mas todas elas necessariamente urbanas. O passado, para mim, é sobretudo um estímulo para fazer coisas novas.”

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