O futuro do poder de José Eduardo dos Santos passa pelo MPLA
Actual líder angolano vai permanecer como presidente do maior partido deste país africano, e garantiu maior protecção com nova lei.
José Eduardo dos Santos vai deixar de ser o presidente de Angola, mas ficará como presidente do partido que domina o país, o MPLA, pelo menos até 2018. E isso garante-lhe a manutenção de uma boa parte do poder e influência que deteve nos últimos 38 anos, após ter sido escolhido pelo partido para suceder a Agostinho Neto.
A questão está em saber como é que será gerado o equilíbrio entre o actual Presidente angolano, e o sucessor por si escolhido, João Lourenço. "Haverá uma mudança histórica com a saída de José Eduardo dos Santos da presidência, mas este foi um processo de sucessão gerido pelo próprio Presidente, com vontade que parece óbvia de manter algum poder nas sombras através da presidência do partido, que obviamente condicionará muito o papel do Estado" e de João Lourenço, afirmou à Lusa João Paulo Batalha, presidente da associação angolana Transparência e Integridade.
Quanto a João Lourenço, que é também vice-presidente do MPLA, este tem dado indicações de que quer ser o rosto de mudanças, só não se sabe quais e com que profundidade. "Vai mudar um ciclo político dentro da mesma família política. Mas que haverá mudanças, haverá", garantiu o candidato do MPLA na recta final da campanha, colocando-se já no papel de figura histórica do país. "O Presidente Agostinho Neto lutou e conseguir a independência para o nosso país, o Presidente José Eduardo dos Santos trabalhou para a paz e a reconciliação entre os angolanos, entre outras coisas de bem que fez, e a minha missão será melhorar a economia do nosso país”, afirmou, citado pela Lusa.
Com várias figuras próximas de si em cargos de poder no aparelho judicial, policial/militar, e em instituições civis, José Eduardo do Santos passou também dois pilares de Angola para as mãos de dois dos seus filhos: Isabel dos Santos lidera a Sonangol, a maior empresa do país, e José Filomeno dos Santos gere o Fundo Soberano, cuja carteira é composta por cerca de cinco mil milhões de dólares. Além disso, fez questão de criar e promulgar uma lei que lhe dá uma protecção acrescida. Aprovada na Assembleia Nacional a 28 de Junho, a lei orgânica dedicada aos ex-presidentes de Angola (isto é, José Eduardo dos Santos e Agostinho Neto, que morreu em 1979) foi publicada em Diário da República apenas na passada quinta-feira.
Entre o projecto de lei e o que foi publicado caiu o título de “Presidente emérito” que ficaria com José Eduardo dos Santos, bem como uma protecção excepcional ao nível judicial. Conforme noticiou a Lusa em Junho, uma parte da lei estabelecia a existência de "foro próprio para efeitos criminais ou responsabilidade civil, por actos estranhos ao exercício das suas funções, perante o Tribunal Supremo, no termo do disposto na lei".
Na lei agora publicada, e já em vigor, nada disso é referido, mas não deixa de haver uma imunidade: a mesma que é concedida aos deputados. Depois, a lei, que implica também vice-presidentes (ou seja, Manuel Vicente, ex-CEO da Sonangol e visado pela justiça portuguesa, suspeito de ter corrompido Orlando Figueira para que o procurador arquivasse dois inquéritos, um deles o caso Portmill, relacionado com a alegada aquisição de um imóvel de luxo no Estoril). Entre outras regalias, José Eduardo dos Santos garantiu também, para si e para a sua família, acesso a passaportes diplomáticos e um “regime especial de protecção e segurança”. Numa altura em que está prestes a completar 75 anos, pode também dedicar mais atenção à fundação com o seu nome, criada em Angola em 1996.
Neste momento ainda não se sabe quando será a tomada de posse do seu sucessor, que terá lugar na primeira quinzena de Setembro. Portugal deverá estar representado na cerimónia por António Costa, naquela que é a primeira visita oficial do primeiro-ministro português. Feitas as contas, e apesar da longevidade no cargo, José Eduardo dos Santos veio apenas cinco vezes a Portugal, divididas em quatro visitas oficiais e uma de Estado.
A primeira ocorreu em 1987, tendo sido recebido pelo então Primeiro-ministro Mário Soares e participado numa conferência empresarial organizada pela Câmara do Comércio e Indústria Portugal-Angola. Depois, esteve em Lisboa em 1991, para a assinatura dos acordos de Bicesse com Jonas Savimbi (Unita), em 1996 quando foi constituída a Comunidade Portuguesa de Língua Portuguesa (CPLP), em 2007 para participar na Cimeira UE-África, e, por fim, em 2009, na sua única viagem de Estado organizada com o governo de José Sócrates. Este, por sua vez, fez três deslocações a Angola, em 2006, 2008, 2010.