Novo Banco oferece depósito com juros de 6% a obrigacionistas

A proposta que prevê a troca de títulos de dívida do banco por depósitos já está a chegar aos clientes particulares. Tabela prevê juros crescentes consoante o prazo das obrigações, a começar num mínimo de 6%.

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Rui Gaudencio

É um passo essencial para concretizar a venda do Novo Banco ao Lone Star. Trocar obrigações de 36 emissões, num valor global de 8300 milhões de euros, por depósitos, uma operação feita a preços de mercado que nalguns casos representam perdas imediatas de 90%. No entanto, o banco disponibiliza depósitos com juros que permitem recuperar a quase totalidade do investimento, uma remuneração que começa nos 6% para títulos de mais curto prazo e cresce gradualmente ao ritmo das maturidades.

O PÚBLICO teve acesso à proposta que está a ser feita nos balcões do Novo Banco aos particulares que detêm obrigações abrangidas por esta troca. Nos casos de obrigações com maturidade até Abril de 2019 - que valem no mercado pouco mais de 80% do seu valor nominal - é proposto um depósito a três anos com uma taxa de juro bruta de 6,84% por ano, a contar a partir do próximo mês de Outubro.

Esta proposta prevê a recuperação integral do capital investido em obrigações do Novo Banco no final dos três anos de vida do depósito. Isto porque, decompondo a estrutura de pagamentos, o detentor destas obrigações com maturidade de Abril de 2019 irá receber 15% líquidos (juros de 6,84% brutos, três vezes por ano, em Outubro), que acrescem aos 82% que valem actualmente os seus títulos. O restante capital que falta será coberto por uma capitalização de curto prazo a entregar logo no arranque da subscrição, a 2 de Outubro deste ano (entre 2% e 3%).

Este é o caso das obrigações com as maturidades mais curtas e, por conseguinte, com juros mais baixos na proposta que está a ser feita pelo Novo Banco. A tabela que está a ser apresentada aos clientes particulares do banco prevê um crescimento proporcional dos juros face aos prazos e à respectiva perda implícita no valor que apresentam os títulos actualmente. Assim, há casos de investidores que estão a receber propostas de depósitos mais longos - cinco anos, por exemplo - com mais de 8% de juros, para maturidades que chegam a 2022 e com perdas na casa dos 20%.

Esta operação é feita a dois tempos. Primeiro, os obrigacionistas devem aceitar a oferta em curso para devolver ao Novo Banco os títulos de dívida que possuem a preço de mercado, que termina a 2 de Outubro, depois de convocadas e realizadas as assembleias de obrigacionistas que votarão a proposta. A liquidação da oferta está marcada para 4 de Outubro. E no dia seguinte, ficarão disponíveis os depósitos para subscrição durante um período de duas semanas.

Com esta proposta, o Novo Banco pretende assegurar que os clientes particulares não sofrem perdas no capital investido em dívida do banco, ainda que prescindam dos juros previstos no momento em que compraram as obrigações aos balcões da instituição. Segundo noticiou o Jornal de Negócios, as obrigações colocadas junto dos clientes de retalho chegam aos 1000 milhões de euros e o banco deu prioridade a este segmento na apresentação das condições da troca decisiva para fechar a venda aos americanos da Lone Star. O próximo passo é negociar com os institucionais. O PÚBLICO apurou que o Novo Banco enviou cartas a estes clientes nos últimos dias solicitando a sua presença junto dos respectivos gestores de conta, onde foram confrontados com a proposta e onde está a ser solicitada a assinatura dos documentos, com alguma brevidade.

Estes juros mínimos acima de 6% comparam com os juros médios que estão a ser oferecidos aos clientes comuns pela generalidade dos bancos, que se situaram em Junho nos 0,28% nos depósitos até um ano, ligeiramente acima dos 0,24% de Maio, segundo os dados mais recentes do Banco de Portugal. No entanto, os clientes com obrigações do Novo Banco estão enquadrados por uma situação específica de potencial perda do investimento realizado em dívida do banco, num contexto definido não só pela resolução do BES, mas sobretudo pela urgência de venda da instituição.

Venda aumenta pressão

A proposta elaborada no âmbito do processo de venda do Novo Banco prevê que o reembolso seja feito a preços de mercado, o que significa que o desconto varia entre um mínimo de 11% e um máximo de 90,25%, dependendo das maturidades dos títulos, que oscilam entre 2019 e 2052.

Os investidores alvo desta proposta são sobretudo institucionais, entre fundos, grandes bancos e gestoras de carteiras mas existe um número importante de clientes particulares, com títulos no valor de 1.000 milhões de euros.

O Novo Banco vai gastar aproximadamente três mil milhões de euros (o valor actual deste passivo nas contas do banco), uma vez que a grande parte das responsabilidades de 8300 milhões de euros das obrigações em causa são juros. E é nesta transformação dos encargos com juros futuros em liquidez (depósitos) que o Novo Banco consegue criar a “almofada” de 500 milhões de euros nos rácios de solidez, implícita nesta operação que tem o patrocínio do Banco de Portugal (BdP). E que faz parte do pacote de soluções encontradas para vender a instituição ao fundo norte-americano Lone Star, que já mereceu a aprovação de Bruxelas à luz dos regulamentos sobre concentrações, mas que ainda aguarda pela autorização ao abrigo das regras sobre ajudas públicas.

O Novo Banco sublinhou, na comunicação que fez há duas semanas ao mercado, que é condição de sucesso desta oferta que um número mínimo de obrigacionistas representativos de 6276 milhões de euros desta dívida aceite a proposta. Por outro lado, se não aceitarem, a venda ao Lone Star não se concretizará, alertando o banco que as consequências para estes obrigacionistas podem ter “um resultado final mais adverso” do que a proposta em causa, numa referência a uma eventual resolução da instituição.

“O insucesso na venda do Novo Banco à Lone Star de acordo com os compromissos assumidos pela República Portuguesa perante a Comissão Europeia poderia reintroduzir o tema da liquidação do Novo Banco”, sublinha o banco no comunicado sobre a proposta.

Institucionais decisivos

Entre os investidores visados por esta proposta estão alguns dos maiores fundos de investimento do mundo, incluindo a Blackrock e a Pimco, que têm sido os principais críticos da solução decidida pelo BdP sobre outras cinco emissões, transferidas para o BES, banco de resolução, num valor de cerca de dois mil milhões de euros.

Sem o acordo destes grandes investidores - que já recorrem mesmo a tribunal contra a decisão do BdP - a operação de troca em curso dificilmente será bem sucedida, dado o mínimo de obrigacionistas exigido. 

A lista das 36 emissões abrangidas pela oferta de aquisição em curso é diversificada e inclui mesmo uma linha em que o Novo Banco prevê até uma contrapartida acima do valor de mercado. Trata-se de uma linha com um valor nominal de 20 milhões de euros, que o banco liquida por 37,2 milhões de euros. No resto, as contrapartidas oferecidas representam entre 89% do valor nominal e 9,75%, sendo que este caso mais extremo destina-se à emissão de 400 milhões de euros com uma maturidade até 2052, emitida no Luxemburgo.

A Lone Star acordou comprar 75% do Novo Banco, ficando os restantes 25% na posse do Fundo de Resolução, e aceitou injectar um total de 1000 milhões de euros no banco, 750 milhões no momento da compra e os restantes 250 milhões no prazo de três anos. Adicionalmente, o Fundo de Resolução comprometeu-se a injectar capital no Novo Banco até um máximo de 3890 milhões de euros no caso de se verificar a degradação de activos do banco - em especial na carteira de crédito - com impacto no seu nível de solidez de tal forma que ponha em causa o cumprimento das metas estabelecidas pelas autoridades europeias. com Rosa Soares

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