O salmão esquisito, a praia algarvia e o maratonista inesperado

Josh Griffiths era apenas um entre milhares que participaram na maratona de Londres de 2017. Ninguém sabia quem ele era, mas acabou em 13.º como o melhor britânico e vai estar neste domingo na maratona dos Mundiais de atletismo.

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Josh Griffiths Reuters

O salmão com arroz tinha um sabor esquisito, talvez por não ter ido ao frigorífico depois de ter sido comprado numa bomba de gasolina. Este foi o pequeno-almoço de Josh Griffiths, um galês de 23 anos, antes de apanhar o metro para chegar à linha de partida da Maratona de Londres de 2017, como por certo fizeram muitos milhares de participantes, e que seria a sua primeira maratona. Há quem vá lá só para correr (e andar) e chegar ao fim e Josh tinha um tempo e um objectivo na cabeça para cumprir nas estradas da capital britânica. Arrancou integrado no meio da multidão. Quarenta e dois quilómetros, cento e noventa e cinco metros depois, era o 13.º a chegar à meta, o primeiro das Ilhas Britânicas.

A proeza que Josh Griffiths conseguiu numa das mais célebres maratonas mundiais permite-lhe estar neste domingo como um dos britânicos entre 100 atletas (um deles o português Ricardo Ribas) na maratona dos Mundiais de Londres. O galês cumpriu o sonho de todos os que são atletas amadores, enfrentar os profissionais e ganhar a muitos deles. E na essência, é isto que Josh Griffiths é, um amador, embora esteja muito longe de ser um corredor de fim-de-semana e saiba bem o que está a fazer, ele que tem formação académica em treino de alto rendimento. “Adorava ser um profissional, mas sei que, para que tal seja uma realidade, tenho de continuar a fazer bons resultados e a trabalhar no duro”, diz o galês ao PÚBLICO.

A história é toda ela maravilhosa. Depois do pequeno-almoço do salmão duvidoso e do metro, teve de andar mais um bocado até à linha de partida e só partiu alguns segundos depois do grupo de elite, que tem aqueles que são pagos para correr. Depois de se livrar da multidão, as coisas começaram a acontecer. “Mais ou menos a meio da prova, apanhei o grupo dos ingleses de elite e comecei a forçar o andamento porque estava a sentir-me bem. Quando dei por ela já estava sozinho à frente deles. Nem queria acreditar. Foi uma loucura, passar alguns que eram os meus heróis, gente que só tinha visto na televisão.”

Griffiths entrara na maratona com o objectivo de fazer uma marca a rondar os 2h16m para poder representar Gales nos Jogos da Commonwealth, acabou por fazer 2h14m53s e qualificar-se para os Mundiais de atletismo. Nem os comentadores da BBC sabiam quem era o rapaz com o dorsal 1154 que tinha aparecido do nada para aparecer nos 15 primeiros. Uma história “surreal” como o próprio reconhece. Logo à chegada, conta, a organização arrastou-o para um evento VIP com os melhores da prova e o galês, que tinha combinado ir almoçar com a família antes de voltarem para Cardiff de comboio, só tinha uma t-shirt para vestir.

Entre Abril e Agosto, tem dado muitas entrevistas, foi objecto de um documentário e licenciou-se, ao mesmo tempo que ia preparando mais uma maratona em Londres. Parte dessa preparação passou por Portugal e pelo Algarve. A namorada foi de férias, ele foi treinar, às vezes na praia, outras vezes em pista, outras em percursos de corta-mato. Em vez da altitude, o calor algarvio. “Nunca tinha treinado em altitude e escolhi vir para Portugal e aproveitar o calor. As condições eram ideais, foi muito duro, mas correu muito bem”, conta Griffiths, que partilhou alguns desses vídeos no Youtube.

Nos Mundiais, Griffiths não tem expectativas de marca, apenas de resultado. “Só me interessa ter uma classificação alta e portar-me bem perante o maravilhoso público de Londres”, diz o atleta de 24 anos, que começou por ser futebolista. Basicamente, passou a ser conhecido, começou a receber convites para provas e vai entrar no circuito internacional das maratonas, com o sonho de conseguir chegar a uma maratona olímpica. “Seria tudo para mim conseguir estar em Tóquio 2020, mas, para já estou apenas focado em correr bem em Londres e pensar numa corrida de cada vez”, perspectiva Josh Griffiths, que, neste domingo, não irá de metro para a meta, nem irá partir atrás dos atletas de elite, porque ele já faz parte da elite. E nem vai arriscar a comer um prato de salmão com arroz que pode estar estragado. Ou talvez transforme isso num ritual. “De facto, estava um bocado esquisito e muita gente ficou chocada por me ver a comer aquilo. Mas resultou”, disse.

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