Cinco filmes para descobrir Jeanne Moreau

A actriz francesa morreu esta segunda-feira aos 89 anos em Paris.

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Cinco filmes para descobrir Jeanne Moreau

La Notte / A Noite (1961), de Michelangelo Antonioni

No auge da popularidade (sobretudo depois do par de filmes com Louis Malle em finais de anos 50, Fim-de-Semana no Ascensor e Os Amantes), Jeanne Moreau “internacionalizava-se” pela primeira vez, indo a Itália filmar com Michelangelo Antonioni, também ele no auge (apesar da grande incompreensão com que L’Avventura, no ano interior, fora recebido). A Noite, espécie de equivalente antonioniano e milanês para a Dolce Vita de Fellini, trata da amargura existencial da burguesia italiana, entre intelectuais e homens de negócios, com foco narrativo num casal em crise (Mastroianni e Moreau). É a angústia do desamor, e a lânguida desolação de Moreau, como um espectro a atravessar festas e piscinas, praticamente absorve todo o clima espiritual do filme.

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Jules et Jim / Jules e Jim (1962), de François Truffaut

A fama dos filmes que Moreau fez com Truffaut (mais o A Grande Pecadora de Demy) pode criar uma ilusão de óptica: a de que ela foi uma actriz nouvelle vague, quando em boa verdade a nouvelle vague lhe passou ao lado (Godard deu-lhe uma “participação especial” nalguns momentos de Uma Mulher é Uma Mulher e isso, mais os Truffauts e o Demy, resume toda a história de Moreau com a nouvelle vague, sobretudo se pensarmos que Malle era outra coisa). Não obstante, a exuberância deste hino ferido ao “amor a três”, onde Moreau é o vértice feminino dum triângulo encenado (e cantado) como um turbilhão, traz a actriz para o meio do frenesi, tanto o frenesi da nouvelle vague como o frenesi do romanesco tendência-Truffaut. E evidentemente, é um dos seus papéis mais memoráveis.

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Le Journal d’une Femme de Chambre / Diário de uma Criada de Quarto (1964), de Luís Buñuel

Vinte anos depois de Renoir (que o filmou em Hollywood com Paulette Goddard), o Diário de uma Criada de Quarto de Mirbeau serviu a Buñuel para o seu regresso à Europa e para o seu primeiro filme francês desde os “clássicos” surrealistas dos anos 20. Moreau é uma Céléstine perfeita, amparando com um pragmatismo paciente e conivente os delírios puritano-lúbricos da família em cuja casa trabalha. Subversivo como todo o Buñuel, mais subversivo ainda pela forma como Moreau se presta à exploração da sua imagem de sensualidade erótica para a desarmadilhar: a perversidade está ailleurs. De certa forma, Moreau é aqui o negativo da Séverine (Catherine Deneuve) do A Bela de Dia que Buñuel filmou dois anos depois.

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Une Histoire Immortelle / História Imortal (1967), de Orson Welles

Jeanne Moreau e Orson Welles, também foi uma história de amor, com a actriz a participar em vários dos filmes do exílio europeu do autor de O Mundo a Seus Pés. História Imortal, feito com poucos meios e de destino tão acidentado como tantos outros Welles, talvez nem se tivesse feito sem Moreau, única vedeta no elenco de um filme pago pela televisão francesa. História de vinganças (baseada em Karen Blixen), muito artificiosa (Macau “reconstituída” num estúdio em Madrid), também serve para ilustrar a disponibilidade de Moreau para projectos completamente à margem, em sentido estético como em sentido económico.

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Nathalie Granger (1972), de Marguerite Duras

E este é outro exemplo da coragem artística de Jeanne Moreau, entregando-se de corpo e alma ao duríssimo e belíssimo primeiro filme de Marguerite Duras. Duas mulheres numa casa no campo (a outra é Lúcia Bosé, também ela, no seu tempo, grande vedeta popular do cinema europeu), uma garota pré-adolescente, um rádio que periodicamente avisa da presença de um suspeito de assassínio nas redondezas, a visita de um vendedor de máquinas de lavar (que é um muito jovem Gérard Depardieu). Afásico e com quase nenhum “acontecimento”, Nathalie Granger é bem a expressão do “cinema sem cinema” (e “sem literatura”) que Duras se propôs fazer – e Moreau, como todos os outros, habita esse território (então, princípios de 70, muito menos reconhecível do que hoje) de forma exemplar: gestos, gestos do movimento e gestos da inacção, tarefas quotidianas sem história, uma aura reprimida ao ponto de transformar a sua portadora, como se se pedisse a Moreau que se limitasse a “ser Moreau” e essa fosse a maneira de ela deixar de “ser Moreau”.

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