Ex-vereador do Urbanismo denuncia política de densificação de Moreira para o Porto
Manuel Correia Fernandes demarca-se do modelo de cidade do autarca independente e assegura que o problema da habitação no Porto não se resolve densificando a cidade pondo mais dois pisos em cada prédio
O arquitecto Manuel Correia Fernandes, que até à ruptura política de Rui Moreira com o PS, em Maio, foi vereador do Urbanismo na Câmara do Porto, alerta para os “perigos” de uma política de habitação baseada na densidade e explica que “o problema da habitação não se resolve aumentando a altura dos prédios”.
Opondo-se a que o Porto se transforme numa “cidade superdensa”, Manuel Correia Fernandes declara que “o problema da habitação não se resolve densificando a cidade, pondo mais dois pisos em cada prédio. O problema da habitação resolve-se com um conjunto de mecanismos que são de carácter fiscal, de carácter arquitectónico, de posse de terrenos e de bons projectos”.
Numa reacção às medidas anunciadas esta semana pela candidatura do movimento independente de Rui Moreira que prevêem a “intensificação do nível dos índices de construção”, o ex-vereador do Urbanismo adverte que “a problemática da majoração dos índices de construção é uma solução errada, perigosa e que coloca na dúvida todo o mercado que fica à espera da revisão do Plano Director Municipal [PDM] prevista para o próximo o ano”.
Em declarações ao PÚBLICO, o arquitecto explica que o “índice de construção não é uma coisa que a câmara dê, ou que o PDM forneça ou dê sem crédito; o índice de construção não é para resolver o problema da habitação ou o problema do turismo (…); é, se calhar, a coisa mais importante de um PDM e daí a minha estupefacção quando li o que a candidatura de Rui Moreira pretende fazer” para resolver a “falha de mercado” que existe, em termos de habitação, em especial, no seio da classe média.
O antigo professor da Faculdade de Arquitectura do Porto recua ao ano de 2001, primeiro mandato de Rui Rio como presidente da Câmara do Porto para dizer que na altura “aquando da revisão do PDM houve uma grande polémica” por causa dos índices de construção. Porquê? “Porque uns defendiam o aumento da densidade na cidade e outros entendiam que a densidade devia manter-se a níveis que apontavam para os índices que existem hoje” [0.8].
Numa resposta indirecta à candidatura de Moreira, Correia Fernandes evidencia que “o que a prática demonstrou até hoje é que o índice 0.8 previsto no PDM nunca foi constrangimento fosse para o que fosse” e aproveita para se demarcar de Pedro Baganha, seu adjunto no Urbanismo e que nestas eleições integra a lista de Rui Moreira.
“Majorar índices em zonas do metro”
Esta semana, o arquitecto Pedro Baganha revelou que “a ideia [da candidatura independente] é intervir ao nível os índices de construção nas zonas de expansão da cidade de forma generalizada”. Mas há mais medidas que passam, segundo declarou Baganha, por “majorar estes índices nas zonas que estão sob influência do metro, rentabilizando o investimento público que já foi realizado e estamos a também a ver majoração para as promoções de habitação com rendas condicionadas”.
Nada de mais errado, nas palavras do ex-vereador do Urbanismo. “Aumentar a densidade onde exista uma estação do metro, isto é, colocar a reboque da linha do metro e das suas estações aquilo que é passível de ser construído na cidade. Quer dizer que, no fundo, é quase por a máquina ao contrário e por isso é que eu acho temerário”, diz o vereador da bancada do PS.
“Estando até há pouco tempo como responsável pelo PDM nunca esta questão se colocou nestes termos. Nunca foi considerado limitador, castrador ou o que quer que seja da correcta construção da cidade o índice previsto”, sustenta Correia Fernandes, revelando que “a maior parte das zonas do centro da cidade nem sequer têm índices de construção”.
Sem rodeios, sustenta que ao anunciar um aumento de construção nas zonas que têm índices agarrados a factores como o metro onde existem infra-estruturas caras, a candidatura de Rui Moreira colocou “pressão” relativamente ao plano director que está em fase de revisão. “Parece-me uma política perfeitamente contrária àquilo que deve ser feito porque a própria lei, suponho eu, propõe o agravamento de impostos a quem pretenda construir em zonas servidas por fortes investimentos públicos em infra-estruturas”, afirma, observando que os investidores não só vão ter uma mais capacidade construtiva como vão beneficiar de investimento público. “Isto tem de ser explicado tecnicamente e de uma forma muito detalhada porque com estas coisas da cidade não se pode brincar desta maneira”, defende o vereador.
Negando que “alguma vez” esta problemática tenha estado em cima da mesa, Correia Fernandes deixa uma provocação: “Podem ter inventado a roda, mas o que sempre esteve em cima da mesa foi que o índice de construção previsto no PDM era sistematicamente um índice adequando”. A propósito, refere que o próprio PDM prevê majorações para quem faça recuperação no centro da cidade e, nesse sentido, refere, aqueles que apostem na reabilitação no centro podem adquirir créditos de construção em zonas exteriores da cidade que têm um índice de 0.8, “mas que pode ir atá ao índice 1”. “É uma espécie de bolsa construtiva, mas nunca ninguém utilizou este mecanismo”, assegura Correia Fernandes.