Fluxos para offshores que saíram da “lista negra” continuam no radar do fisco

Bancos continuam a ser obrigados a comunicar à AT as transferências para países retirados da lista das Finanças. Obrigação inclui as três jurisdições excluídas em 2017 mas também outros territórios, como Macau.

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Macau não faz parte da "lista negra" das Finanças, mas está na lista do Banco de Portugal Nelson Garrido

Apesar de o Uruguai, Jersey e Ilha de Man já terem saído da “lista negra” dos paraísos fiscais elaborada pelo Ministério das Finanças, a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) vai continuar a conhecer as transferências realizadas para estes três territórios. O prazo para os bancos enviarem ao fisco as declarações relativas às operações realizadas em 2016 está a chegar ao fim (termina a 31 de Julho) e, este ano, o universo dos países de destino em relação aos quais a máquina fiscal terá informação é, em teoria, mais vasto do que o dos últimos anos.

Na origem desta nuance está um pormenor do texto de uma portaria do Ministério das Finanças, decidida ainda em Junho, quando o Governo estava a ser pressionado pelo PSD e CDS por causa das alterações à “lista negra”.

Para se perceber o que está em causa nesta alteração é preciso ter em conta que há em Portugal duas “lista negras”. Uma é da responsabilidade do Ministério das Finanças, aquela que se considera como a oficial do ponto de vista das relações diplomáticas de Portugal e que os governos estrangeiros por norma utilizam, para aferir se estão, ou não, na “lista negra” portuguesa. Há, depois, uma outra lista, elaborada pelo Banco de Portugal (BdP), maioritariamente coincidente com a do Governo, mas mais extensa do que essa, porque inclui não apenas esses territórios offshore como outros que já não fazem parte desse grupo (ou a que nunca pertenceram).

Nada mudou na “lista negra” do fisco (nem na lista do Banco de Portugal). A única diferença é que, antigamente, a obrigação do reporte em relação à AT referia genericamente os países, territórios ou regiões “com regime de tributação privilegiada mais favorável”. Agora, o Governo passou a determinar que, para este efeito específico, deve ser considerado o universo do BdP.

Com esta nuance, o número dos países abrangidos é maior: a lista do Banco de Portugal tem mais de 100 jurisdições, enquanto os territórios considerados pelas Finanças são 87 (mais algumas ilhas do Pacífico). Se nada fosse feito, Jersey, Ilha de Man e Uruguai ficariam automaticamente de fora. Agora, há uma uniformização apesar das listas continuarem a ter territórios diferentes entre si. E com a harmonização, o fisco também passa a contar com informação relativamente a territórios que já saltaram da sua “lista negra” há mais tempo ou que nunca fizeram parte dela. Neste lote incluem-se, por exemplo, Macau, Indonésia, Cabo Verde ou Egipto.

Dois universos

Os bancos já tinham de comunicar este tipo de operações tanto à autoridade tributária como ao Banco de Portugal. E as duas listas já existiam quando, em 2010, o fisco passou a contar pela primeira vez com informação sobre transferências offshore. A diferença é que, agora, o universo passa a ser exactamente o mesmo, para a obrigação de reporte. As regras ficaram definidas numa portaria assinada ainda pelo anterior secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Fernando Rocha Andrade, a 9 de Junho, na mesma altura em que os partidos da oposição contestavam publicamente a exclusão do Uruguai, Jersey e Ilha de Man da lista das Finanças.

Apesar de este ser o primeiro ano em que esta questão fica clarificada, o fisco já recebia mais informação do que aquela que estava prevista na lei. Quando a Inspecção-geral de Finanças realizou a auditoria ao “apagão” dos 10.000 milhões de euros de transferências para offshores, concluiu que “muitas entidades” continuavam a enviar informação sobre alguns dos territórios que já não pertenciam à “lista negra” (aconteceu com transferências para a Suíça e Luxemburgo, por exemplo). O valor efectivamente conhecido em relação ao período de 2011 a 2014 ronda os 18.220 milhões de euros (mas o montante relativo à “lista negra” da AT é de 16.964 milhões).

Ainda não se sabe se esta mesma regra se vai aplicar à publicação das estatísticas por parte do fisco, cuja regulamentação o Governo tem de concluir até 3 de Agosto. O PÚBLICO pediu um esclarecimento ao Ministério das Finanças sobre a nova lei, mas não obteve resposta em tempo útil.

As declarações Modelo 38 em causa são submetidas no Portal das Finanças através de ficheiros XML e, a partir daí, são registadas internamente no sistema central do fisco. A administração tributária fica a conhecer o NIF da pessoa ou da empresa que ordena a transferência, o número da conta bancária, o paraíso de destino, a conta do beneficiário e o banco para o qual foi feita a transacção, o valor associado e o ano da transferência (neste caso, 2016). Esta obrigação acontece para as transferências superiores a 12.500 euros ou as “as operações fraccionadas que no seu conjunto excedam” esse valor.

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