O carro a gasóleo e gasolina tem morte anunciada para 2040
Reino Unido e França prometem acabar com os automóveis que sempre conhecemos em pouco menos de duas décadas. A indústria já está bastante avançada. As cidades e as políticas é que ainda estão a preparar-se.
A data da morte do carro de motor a gasóleo e a gasolina está anunciada para 2040: o Governo britânico anunciou que nesse ano deixam de poder ser vendidos automóveis que usem estes combustíveis, com o objectivo de os fazer desaparecer completamente das estradas britânicas nos dez anos seguintes.
Londres segue as pisadas de Paris, que no início de Julho anunciou um plano para acabar com os automóveis a gasóleo e gasolina até essa data. Mas, enquanto o ministro francês da Transição Energética, Nicolas Hulot, prevê oferecer um bónus aos contribuintes com menos meios económicos para que possam desfazer-se do seu automóvel mais poluente e adquirir um carro eléctrico, híbrido ou qualquer outra variante com menores consequências tanto para o efeito de estufa como para a saúde das pessoas que vivem nas cidades – para substituir carros a gasolina anteriores a 1997 ou a diesel anteriores a 2001 – no Reino Unido nada disso está previsto.
O anúncio feito por Michael Gove, o ministro do Ambiente britânico, peca pela sua insuficiência, dizem associações de defesa do ambiente.
O Governo de Theresa May viu-se obrigado a avançar com medidas para reduzir a poluição automóvel, porque foi condenado pelo Supremo Tribunal britânico a reduzir os níveis de dióxido de azoto, um poluente que faz parte dos fumos emitidos sobretudo pelos carros a gasóleo. Em dezenas de cidades britânicas, o dióxido de azoto, que está relacionado com uma série de doenças respiratórias, ultrapassa frequentemente os níveis considerados seguros. O processo foi avançado por um grupo de advogados preocupados com questões ambientais, denominado ClientEarth, e o Executivo tinha de publicar nova legislação sobre poluição do ar até ao fim deste mês para cumprir a decisão do tribunal.
40 mil mortes por ano
Calcula-se que a má qualidade do ar esteja relacionada com cerca de 40 mil mortes prematuras anuais no Reino Unido – isto são números avançados pelo próprio Governo britânico. O mesmo acontece, de resto, em França, que se viu obrigada a fazer da capital, Paris, uma zona de circulação restrita, onde viaturas com matrícula anteriores a 1 de Janeiro de 1997 são impedidas de circular. Estima-se que o número de mortes prematuras em França devido à poluição automóvel seja de 48 mil por ano.
França avançou com uma série de iniciativas para promover o investimento dos fabricantes de automóveis em combustíveis alternativos e, do lado do consumidor, formas para facilitar a compra de veículos eléctricos – o principal obstáculo continua a ser o preço, muito mais elevado, que faz com que nos EUA, por exemplo, representem apenas cerca de 1% do mercado, e incentivos à utilização dos transportes públicos e bicicleta. Mas o Reino Unido não.
É verdade que o Governo diz ter 40 milhões de libras para distribuir pelos 81 municípios britânicos mais afectados pela poluição automóvel – que podem incluir soluções como “modificações do traçado das estradas, alterar o combustível usado pelos transportes públicos ou esquemas para encorajar as pessoas a deixar o carro em casa”. Mas não avança propostas. Diz que terá mais pormenores daqui a uns meses, e que o dinheiro para isso virá das alterações à fiscalidade sobre os veículos a gasóleo.
Mas o Executivo de Theresa May recua perante a possibilidade de estabelecer zonas de circulação restrita, como fez Paris. Desaconselha mesmo os municípios a tomar essa decisão – embora reconheça que essa seria a forma mais eficaz de lidar com o problema de saúde pública que se coloca actualmente.
“Este projecto do Governo enche o olho, mas não estamos convencidos de que vá resolver, no imediato, os problemas de falta de qualidade do ar”, disse Anna Heslop, advogada do ClientEarth, citada pelo jornal Financial Times.
O director-geral da Aston Martin mostrou-se igualmente crítico: queria apoios públicos aos fabricantes automóveis para fazerem a transição para veículos mais limpos. “Se o Governo vai legislar, também tem de apoiar, se não vai destruir parte da indústria. Para competirmos, precisamos de produzir baterias. Mas estamos dez anos atrasados em relação a qualquer fábrica de baterias da China”, queixou-se, citado ainda pelo Financial Times.
Reviravolta em 2025
Mas a verdade é que os grandes fabricantes não estão a perder tempo. Dois dias antes de o ministro francês Nicolas Hulot ter revelado os seus planos para tirar os carros a diesel e gasolina das estradas, a Volvo tinha feito tinir todas as campainhas, ao anunciar que a partir de 2019 todos os novos modelos automóveis que lançaria seriam eléctricos ou híbridos. Até 2021, todos os seus veículos serão eléctricos. “É o fim do carro apenas com motor de combustão”, afirmou então o director do construtor sueco, Hakan Samuelsson.
O escândalos das emissões da Volkswagen deu novo impulso às empresas fabricantes de automóveis para se concentrarem no desenvolvimento de novas tecnologias menos poluentes, enquanto os políticos se viram cada vez mais pressionados por activistas ambientais para banir a entrada nas cidades de carros a gasóleo, cujas emissões contêm partículas poluentes relacionadas com problemas respiratórios, cardíacos e outros.
“Por volta de 2025, prevejo que se dê a reviravolta: os carros eléctricos devem começar a ultrapassar os veículos com motor de combustão interna. É a essa tendência”, disse ao Guardian David Bailey, um especialista em indústria automóvel da Universidade de Aston (Birmingham).
Um relatório de Junho da Agência Internacional de Energia aponta nesse sentido: em 2025, pode haver entre 40 e 70 milhões de veículos eléctricos a circular. Mas há grandes diferenças entre países. O maior mercado para veículos eléctricos é a China, onde há mais de 200 milhões de automóveis e 300 mil autocarros eléctricos. Mas é na Noruega que têm uma maior fatia do mercado: 29% dos veículos vendidos naquele país em 2016 eram eléctricos.
No entanto, para que a substituição dos carros normais por carros eléctricos tenha alguma contribuição real para limitar as alterações climáticas, será preciso que até 2040 haja 600 milhões a circular, retirando os velhos automóveis de gasóleo e gasolina das estradas.