Desta vez Trump não despediu ninguém, mas o seu procurador-geral que se cuide
O Presidente norte-americano deu uma entrevista em que lançou ataques contra Jeff Sessions e outros quatro responsáveis. Por causa da investigação sobre a Rússia, Trump deixou cair o apoio ao primeiro senador que o apoiou na candidatura à Casa Branca.
Donald Trump já apontou o dedo a várias personalidades da política e da justiça dos Estados Unidos desde que chegou à Casa Branca, mas raramente disparou contra mais do que um de cada vez. Esta semana, o Presidente norte-americano aproveitou uma entrevista ao jornal The New York Times para espancar com palavras cinco destacadas figuras ao mesmo tempo, incluindo o primeiro senador a apoiar a sua candidatura – de uma só vez, ficou em causa o futuro do procurador-geral, do procurador-geral adjunto e do investigador especial responsável pelo caso da Rússia, já que os do ex-director do FBI e do director interino do FBI são conhecidos.
A entrevista exclusiva a um dos jornais que o Presidente norte-americano considera ser um criador de notícias falsas surgiu poucos dias após uma pesada derrota do Partido Republicano – e do próprio Donald Trump – no Senado, com a falta de apoio suficiente para votar uma proposta de lei que iria substituir o sistema de saúde conhecido como Obamacare.
Já depois disso, foi também revelado que Donald Trump manteve uma conversa – de uma hora ou de 15 minutos, consoante as versões – com o Presidente russo, Vladimir Putin, durante o jantar de gala dos líderes do G20, na Alemanha. Não foi uma reunião secreta, mas o facto de Trump se ter levantado da sua cadeira para ir ter com Putin e de ter conversado com o Presidente russo sem o apoio de nenhum conselheiro ou tradutor gerou polémica nos corredores de Washington.
Na entrevista ao The New York Times, o Presidente norte-americano falou desses dois casos, mas pouco acrescentou ao que já tinha dito – em relação ao fim do Obamacare, vai continuar a pressionar o Partido Republicano para que cumpra a promessa de sete anos de derrubar a principal herança legislativa de Barack Obama; em relação à conversa com Vladimir Putin, foi apenas "conversa de circunstância", com uma incursão pelo diferendo sobre adopção de crianças entre os dois países.
Não teria nomeado Jeff Sessions
A parte mais importante da entrevista foi mesmo o ataque violento que Donald Trump lançou contra o primeiro nome de relevo a apoiá-lo na sua candidatura à Casa Branca – uma candidatura que, naquela época, no Verão de 2015, parecia ser pouco mais do que uma anedota.
Mas a recompensa pela lealdade do então senador do estado do Alabama, Jeff Sessions, parece ter chegado ao fim. Depois de o ter nomeado attorney general (ou procurador-geral – um cargo que, em Portugal, seria como entregar o Ministério da Justiça e a Procuradoria-Geral da República à mesma pessoa), Trump ficou farto dele a partir do momento em que se começou a falar mais das suspeitas de conluio com a Rússia.
Isto porque Jeff Sessions não foi suficientemente claro (alguns especialistas dizem que mentiu) durante a audição no Senado para a sua nomeação como procurador-geral. Numa dessas sessões, o ex-senador disse que não se tinha reunido com nenhum responsável russo durante a campanha presidencial, mas mais tarde, quando já era procurador-geral, veio a saber-se que teve encontros com o então embaixador da Rússia em Washington, Sergei Kisliak. Depois de ter sido apanhado nessa discrepância, Jeff Sessions anunciou que não iria meter-se na investigação sobre a Rússia, e foi essa decisão que enfureceu Donald Trump.
Na entrevista, o Presidente norte-americano diz mesmo que nunca teria nomeado Jeff Sessions para procurador-geral se soubesse que ele iria afastar-se da investigação – Trump não o disse com todas as letras, mas não é preciso ser-se um especialista para perceber que o lugar de Sessions está em risco. Em reacção, o procurador-geral disse apenas que vai manter-se no cargo "até ser adequado".
Acusações de conflitos de interesses
O mesmo tratamento receberam o procurador-geral adjunto, Rod Rosenstein, e Robert S. Mueller, o homem que Rosenstein escolheu para a liderança de uma investigação mais independente às suspeitas de conluio com a Rússia. Para o Presidente norte-americano, ambos têm graves conflitos de interesses – Rosenstein recomendou o despedimento do director do FBI, James Comey, e depois nomeou um investigador especial para, entre outras coisas, investigar se esse despedimento pode ser considerado uma obstrução à Justiça por parte do Presidente; e Mueller foi entrevistado por Trump para o cargo de director do FBI e acabou por ser nomeado investigador especial pelo procurador-geral adjunto, tendo na sua equipa especialistas ligados ao Partido Democrata.
Por fim, a ira de Trump abateu-se sobre James Comey e sobre o director interino do FBI, Andrew G. McCabe.
A maioria das acusações contra Comey já eram conhecidas, mas desta vez o Presidente norte-americano acrescentou uma, e muito importante – a de que o antigo director do FBI só lhe mostrou o famoso dossier com informações não verificadas sobre supostas orgias na Rússia porque queria ter o Presidente na mão. No seu depoimento no Senado, sob juramento, James Comey disse que todos os directores dos serviços secretos norte-americanos concordaram que o dossier devia ser mostrado ao Presidente, porque a informação já estava na posse de vários jornais e televisões há vários meses.
O último a ser encostado à parede foi o director interino do FBI, que já tem o seu destino marcado: não vai ser nomeado director do FBI. Sobre o homem que tem vindo a substituir James Comey, Donald Trump voltou a sublinhar que a mulher dele, Jill McCabe, recebeu quase 500 mil dólares de um grupo ligado ao governador da Virgínia, Terry McAuliffe – um dos melhores amigos de Bill e Hillary Clinton.
A entrevista de Donald Trump ao The New York Times surge também pouco depois de o seu filho mais velho, Donald Trump Jr., e o seu genro, Jared Kushner, terem sido convidados a prestar esclarecimentos às comissões do Senado que investigam as relações entre a campanha de Donald Trump e a Rússia – Donald Trump Jr. deverá falar à porta fechada na quarta-feira da próxima semana, na Comissão de Assuntos Judiciais, juntamente com um ex-responsável pela campanha de Trump, Paul Manaforte; e Kushner estará na próxima segunda-feira na Comissão de Serviços Secretos, também sem a presença das câmaras de televisão.