O meu dicionário de moda: Quimono e Retro

Não esperem encontrar por aqui o mais rigoroso dos dicionários de moda

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Toru Hanai/Reuters

Quimono

É uma vestimenta tradicional japonesa, uma espécie de túnica longa normalmente trespassada na frente e amarrada por um cinto ou uma faixa, significando "coisa para vestir" numa tradução literal.

No início do século XX tornou-se parte da indumentária ocidental (em 1903 o estilista francês Paul Poiret criou uma versão de casaco quimono curto, controverso para a época mas que acabou por se popularizar na Europa), tendo a peça conquistado inúmeras interpretações, em materiais vários. Vestidos, casacos curtos ou compridos, estilo roupão, com ou sem cinto e diversos tipos de mangas, os quimonos têm vindo a proliferar e, nos últimos anos, instalou-se uma quimonomania à qual também me rendi: é uma das minhas peças preferidas, principalmente para as estações mais quentes, e entre vestidos e casacos já tenho uma coleção de quatro ou cinco modelitos, com francas perspetivas de expansão.

É curioso como, sendo o termo quimono tão óbvio para mim, tendo a achar que os outros também percebem a que é que me refiro, ou sabem exatamente aquilo que estou a dizer, nunca tendo equacionado a possibilidade de assim não ser. No entanto, apercebi-me há dias que as coisas não são tão lineares assim.

Há bem pouco tempo estive a passar uns dias em casa dos meus pais — um cheirinho a férias, pode dizer-se —, local seguro de reencontro entre manos separados geograficamente mas próximos em união (oh, que bonito). Num dia qualquer estava sentada nas escadas em frente da casa e o meu irmão andava por lá a melgar-me, como é usual. Às tantas disse-lhe cuidado, vais calcar-me o quimono.

Ficamos ali mais um bocado na conversa, a aproveitar o raro momento de descontração conjunta, quando me diz ele de repente, Ui, quase te pisava o Quim Mono. (Gargalhada minha com cerca de 130 decibéis). A sério? Quim Mono???

Não podia o manito dizer quimono como as pessoas normais? Poder podia, mas mesmo esta mesquinha do português sabe que há momentos em que é preciso saber relativizar (as gafes gramaticais) e dosear prioridades. Porque quimono é o correto, sem dúvida, mas Quim Mono é uma lufada de ar fresco.

Retro

Porque também pretendo que este dicionário tenha uma vertente educativa (mas pouco, nada de exageros), parece-me importante falar um pouco sobre a expressão retro e distingui-la de vintage, já que, suspeito, muitas pessoas confundem os conceitos e a maioria acha que significam a mesma coisa. Na na na na na, nada disso.

Retro deriva da palavra francesa rétro (que, por sua vez, provém de rétrospectif) e significa ‘que imita um estilo passado ou anterior’.

vintage deriva do inglês e, além de ter aplicação ao nível da Enologia – é vintage um ano de boa colheita vinícola ou um vinho fino de uma só colheita, produzido em ano de reconhecida qualidade, com características excecionais e paladar a condizer, reconhecido como tal pelo Instituto do Vinho do Porto —, tem ainda o sentido de produto antigo de excelente qualidade.

Ou seja, enquanto o conceito de retro é uma reinterpretação do passado (sendo retro, por isso, os objetos ou peças lançados atualmente mas com uma aparência antiga), o conceito de vintage resgata elementos originais das décadas de 1920 a 1960 (há ainda quem defenda que peças de roupa, acessórios ou objetos dos anos 80 e 90 podem também incluir-se aqui mas, neste caso, integram a categoria de ‘novo vintage’).

Confesso que durante muito tempo confundi os conceitos, utilizando indiscriminadamente ambos os termos para designar a mesma coisa, e se os dominasse há mais tempo não me tinha surgido uma dúvida que me assalta desde que interiorizei as diferenças.

E isto porque, há cerca de dois anos, uma mulher que trabalhava comigo disse-me que eu tinha um ar vintage. Pressupus na altura que o tenha afirmado pelo facto de - sendo eu fã destes universos - usar várias peças de roupa ou acessórios retro (vintage só usei um casaco lindo de morrer, que era da minha avó, já que a minha mãe não teve o bom senso de guardar os seus vestidos mimosos para eu usar). Se soubesse as diferenças teria corrigido a senhora, explicando-lhe educadamente que não era vintage, mas sim retro.

Mas não sabia. E o problema é mesmo esse. É que, conhecendo bem as mulheres e sabendo o quão mazinhas podem ser umas com as outras, pegunto-me: será que ela sabia perfeitamente o que significava o vocábulo e, num rasgo súbito de ironia, decidiu chamar-me de cota, velha ou, pior, acabadita?

Quero acreditar que não, mas sei lá eu... É por estas e por outras que faz tanto sentido aquele chavão vintage segundo o qual o saber não ocupa lugar.

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