Macron estende a passadeira vermelha de Paris a Donald Trump

O Presidente francês quer ser o interlocutor privilegiado dos EUA na Europa.

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Stephane Mahe/Reuters

O Presidente de França, Emmanuel Macron, que desde que tomou posse não se tem cansado de repetir que a Europa não é só “fundamental” mas “uma absoluta necessidade” no actual contexto mundial, abriu esta quinta-feira as portas do Eliseu a Donald Trump, estendendo a mão e quebrando o “pacto” de isolamento a que os líderes europeus votaram o Presidente dos Estados Unidos que duvida das Nações Unidas, da NATO e da Organização Mundial de Comércio.

A tensão indisfarçável que marcou o primeiro encontro entre Macron e Trump, e que voltou a manifestar-se nas interacções seguintes, incluindo há apenas uma semana a cimeira do G20 em Hamburgo, pareceu totalmente dissipada. Os sorrisos e cumprimentos de ambos mostraram que se dantes havia desconfiança, agora existe entendimento – e um desejo de cooperar em áreas que vão do combate ao terrorismo à pirataria informática.

A mensagem de Macron, ao receber Trump em Paris, não podia ser mais clara: a relação “especial” do eixo transatlântico passou a ser entre os EUA e a França. O Presidente francês soube aproveitar a oportunidade de se tornar “o interlocutor privilegiado de Trump na Europa”, como disse o professor da Sciences Po, Nicolas Tenzer, ao The New York Times. A chanceler alemã, Angela Merkel, já provou que não há “química” entre ela e Trump. E a primeira-ministra britânica, Theresa May, viu-se obrigada a adiar – sine die – a visita do líder norte-americano a Londres. O Presidente francês pode agradecer-lhes o seu maior protagonismo. “La France c’est moi”, repetiram vários líderes franceses ao longo da História. “L’Europe c’est moi”, pode acrescentar Macron, com Trump do seu lado.

O contraste entre o Presidente francês mais novo desde Napoleão, e o Presidente americano mais velho de sempre não podia ter resultado melhor para Emmanuel Macron. A sua postura jovial e aberta, era não só um sinal de cosmopolitismo, pluralismo e internacionalismo; era também uma rejeição explícita da abordagem nacionalista e do comportamento belicoso de Donald Trump – que nunca escondeu a sua preferência pessoal por Marine Le Pen na corrida presidencial francesa.

Donald Trump aterrou em Paris na véspera dos desfiles de 14 de Julho, o feriado nacional que assinala a tomada da Bastilha e simboliza o nascimento da República, e que este ano celebrará também o centésimo aniversário da entrada dos Estados Unidos na I Guerra Mundial, ao lado das tropas francesas. Uma das primeiras paragens foi no monumento dos Invalides, onde estão os túmulos dos maiores heróis de guerra do país, entre os quais o Supremo Comandante das Forças Aliadas da Grande Guerra. O Presidente norte-americano também prestou homenagem aos soldados dos EUA que participaram no desembarque da Normandia, em Junho de 1944. Ao lado de três veteranos do Dia D, Trump lembrou que a aliança entre os EUA e a França foi “forjada nas brasas da guerra” e agradeceu a todos os “heróis que lutaram pela liberdade quando foi mais necessário”.

O Presidente George Bush, em 1989, foi o último Presidente dos EUA a assistir à parada militar do Dia da Bastilha nos Campos Elíseos. A cerimónia deste ano foi especialmente coreografada para impressionar Trump, que segundo revelou a imprensa norte-americana, só concordou com a viagem depois de saber que no programa constava o grandioso desfile “que era o tipo de espectáculo que gostava de ter tido na sua tomada de posse”: porta-bandeiras, guarda a cavalo, desfiles de infantaria e exibição de armamento, com caças F-16 e F-22 a sobrevoar o Arco do Triunfo.

A segurança em Paris foi triplamente reforçada para o dia feriado, por causa da presença de Donald Trump na parada militar e por causa de uma marcha de protesto contra o Presidente dos EUA, marcada para a mesma hora, com partida da Place de Clichy. O candidato presidencial e líder do movimento França Insubmissa, Jean-Luc Mélenchon, será um dos  participantes. Trump é “um homem violento que não devia estar aqui”, disse. Mas se os manifestantes consideram que “Não se pode baixar a guarda contra Trump” (o mote para a mobilização), a verdade é que os parisienses pareceram muito mais desinteressados do que desagradados com a presença do Presidente dos EUA na capital.

A presença da polícia na rua aconteceu em Paris e por toda a França: as celebrações de 14 de Julho costumam atrair milhares de pessoas a desfiles e espectáculos de fogo-de-artifício – semelhantes áquele que, no ano passado em Nice, foi interrompido por uma célula terrorista fiel ao Daesh que aproveitou as comemorações para levar a cabo um ataque que fez 86 mortos. O Presidente Emmanuel Macron voa esta sexta-feira para a cidade do Sul da França depois de se despedir da comitiva norte-americana.

Donald Trump referiu-se ao atentado de Nice durante a conferência de imprensa conjunta com Macron no final da reunião bilateral do Palácio do Eliseu. “Os EUA estão ao lado da França na sua batalha contra o extremismo”, sublinhou o Presidente que, há apenas um ano, tinha descrito Paris como uma cidade perigosa e repleta de jihadistas. Na agenda dos dois presidentes estavam as questões do combate ao terrorismo e da guerra da Síria – mas do lado dos jornalistas, só se quis saber de temas polémicos, como por exemplo a retirada dos EUA do compromisso internacional para travar o aquecimento global assinado precisamente em Paris.

“Pode ser que aconteça alguma coisa em relação ao acordo de Paris, vamos ver. Vamos falar sobre isso nos próximos tempos, por isso se acontecer alguma coisa será maravilhoso, e se não acontecer também será OK”, respondeu Donald Trump.

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