Timing não trava avanço da taxa turística nem da criação da empresa municipal de Cultura no Porto

Estudo de viabilidade económica estima que Câmara do Porto tenha que transferir cerca de sete milhões de euros anuais para nova empresa municipal, nos primeiros cinco anos

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Quem dormir nos alojamentos turísticos do Porto poderá pagar mais dois euros por noite Adriano Miranda

O executivo da Câmara do Porto aprovou, por maioria, o início do processo para que venha a ser cobrada uma taxa turística na cidade e também o arranque da criação de uma nova empresa municipal dedicada à Cultura. As decisões foram tomadas em reunião esta terça-feira, com várias críticas por parte da oposição, que questionou o timing para fazer avançar estes dois processos. A proposta para a criação da Porto Cultura foi a que recebeu mais votos contra – cinco, do PS, PSD e CDU. A empresa custará à Câmara do Porto cerca de sete milhões por ano.

É este o tempo para fazer avançar este dois processos ou são temas para serem debatidos no âmbito da campanha eleitoral que se aproxima, deixando aos eleitores, com o seu voto, a decisão a tomar sobre eles? A questão percorreu a discussão em torno da taxa turística e da empresa municipal de Cultura, com mais ou menos intensidade.

No primeiro caso, o PS até concordou com o presidente Rui Moreira que, embora no limite, este ainda é o tempo para fazer avançar a taxa turística. “O timing é adequado. Se o tempo não for este, não será possível que a taxa seja aplicada em 2018”, defendeu o vereador Manuel Pizarro, ficando o comunista Pedro Carvalho a questionar sozinho a oportunidade de se avançar agora com a aplicação de uma taxa que Rui Moreira já admitiu que gostaria de situar nos dois euros por dormida e por noite. O seu uso também já foi definido há meses: “diminuir a pegada turística”, seja com a compra de casas destinada ao arrendamento da classe média, para combater o aumento de resíduos sólidos na cidade ou para construir parques de estacionamento para os autocarros turísticas, precisou o autarca.

O vereador da CDU foi, por isso, o único a votar contra a proposta de abertura de um período de discussão para se criar um regulamento para a implementação da taxa turística – não por ser contra a taxa, disse, mas por discordar do “voluntarismo” de se avançar agora com esta proposta, “que é tema para debate eleitoral”. No caso da criação da empresa municipal de Cultura, Pedro Carvalho teve já a companhia dos três vereadores do PS e do vereador Ricardo Almeida, do PSD, na recusa da proposta que acabaria aprovada com os votos da bancada de Rui Moreira e do vereador Amorim Pereira – eleito pelo PSD, mas a quem o partido retirou, entretanto, a confiança política.

E, aqui, as questões já não se prenderam apenas com o timing – embora ele se mantivesse presente na argumentação. Pelo PS, Carla Miranda concordou com a necessidade de existir “uma gestão mais eficaz e eficiente” dos equipamentos culturais, mas questionou a opção de se criar uma nova empresa municipal, quando a autarquia já tem a Porto Lazer. “Penso que se podia racionalizar se a Cultura fosse integrada na Porto Lazer. Tornaria mais possível um plano estratégico articulado e integrado e a única forma de termos acesso ao ecossistema cultural da cidade, caso contrário, parece-me bastante parcelar”, disse. E, lá está, a vereadora socialista também não deixou de lado a questão do timing, dizendo ter “um certo pudor” em ver avançar a criação de uma nova empresa municipal a três meses das eleições autárquicas.

E uma empresa que terá custos elevados para o município, já que o estudo de viabilidade económica que acompanha a proposta, estima que as receitas próprias da Porto Cultura cobrirá entre “11% a 17% do total dos gastos anuais” da nova empresa municipal, prevendo-se que, nos primeiros cinco anos de funcionamento, seja necessário que a câmara realize transferências anuais na ordem dos sete milhões de euros, para garantir o equilíbrio financeiro exigido às empresas municipais.

Também Ricardo Almeida quis saber por que razão a Cultura não poderia ser integrada na empresa municipal Porto Lazer, mas Rui Moreira garantiu-lhe, e ao PS, que tal não era possível. O autarca argumentou que a criação de uma empresa municipal de Cultura só foi possível graças a uma alteração legislativa, que criou um regime de excepção, e que a Porto Lazer não poderia assumir essas funções por contar, entre os seus objectivos, com a gestão do desporto municipal.

As explicações não satisfizeram quem tinha dúvidas, com o socialista Manuel Pizarro a introduzir ainda mais uma questão no debate, ao defender que “o município tem que fazer uma reflexão sobre o seu universo empresarial”. O vereador, que é também o candidato socialista à Câmara do Porto, disse ao PÚBLICO que o Porto, “com 234 mil habitantes e um orçamento para 2017 de 267 milhões de euros” pode chegar ao fim do ano com seis empresas municipais, “sem contar com a SRU [Sociedade de Reabilitação Urbana]”, enquanto Lisboa, com quase 550 mil habitantes e um orçamento de 924 milhões de euros “tem quatro”. No executivo, Pizarro tentou convencer Moreira que era “preciso aprofundar o debate sobre esta matéria”, mas não convenceu o antigo parceiro de coligação pós-eleitoral. “Estamos no calendário certo. O processo ainda tem que ir à Assembleia Municipal e ao Tribunal de Contas, fica sempre pendente do próximo executivo. Não estamos a tomar nenhum compromisso definitivo, é perfeitamente reversível”, disse o presidente da câmara.

Campanha na reunião

O período de pré-campanha já não larga as reuniões do executivo da Câmara do Porto e, desta vez, chegou logo na abertura do encontro, com Manuel Pizarro a questionar Rui Moreira sobre se o município tinha iniciado algum procedimento relacionado com a queixa que o movimento independente do autarca apresentou na Comissão Nacional de Eleições contra os cartazes de campanha do Bloco de Esquerda, por considerar que estes utilizavam, abusivamente, a marca Porto.. “Qual é a opinião da Câmara do Porto? Quem tem obrigação de defender o símbolo da cidade é a câmara”, perguntou o socialista. “Se pretende que solicite um parecer aos serviços, irei solicitá-lo”, respondeu-lhe Rui Moreira, enquanto o social-democrata Amorim Pereira argumentava, vigoroso, que o assunto tinha sido tratado onde devia – entre partidos e movimentos políticos.

Pizarro sorria e ironizava que Rui Moreira presidente da câmara achava, como ele, que o BE não fizera nada de mal, enquanto Rui Moreira líder do movimento independente, tinha dúvidas. E como não há campanha sem contra-ataque, o presidente da Câmara do Porto perguntou ao vereador e candidato socialista “se achava normal” enviar aos comerciantes distinguidos no âmbito do Porto de Tradição uma carta com o logotipo da câmara num canto e a inscrição “vereação do PS” no outro. E leu a carta, em que Pizarro manifestava a sua “satisfação” pela distinção alcançada, pondo-se ao dispor para o que fosse “útil”. “Pois se foi o papel timbrado que me foi fornecido”, reagiu o socialista. 

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